Um parlamento contra a vida

Conforme o articulista, projeto de lei no Congresso quer punir mulheres, inclusive adolescentes, que foram abusadas e estupradas

Um Parlamento contra a vida

Ednilson Maciel,

Por Aldenor Ferreira*

 

Publicado em: 29/06/2024 às 01:06 | Atualizado em: 29/06/2024 às 10:35

A atual legislatura do Congresso Nacional é, sem dúvida, a pior da história. A maioria dos parlamentares se comporta de maneira deplorável e, para completar, há vários projetos em tramitação que são, literalmente, contra a vida.

O mais polêmico é o projeto de lei 1.904, conhecido como “PL do estuprador”.

Esse projeto representa um claro retrocesso ao tentar modificar o decreto-lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940, que trata de crimes contra a vida, o aborto e o estupro, entre outros. 

Alegando a defesa do feto, o “PL do estuprador” propõe penas severas para mulheres, inclusive adolescentes, que foram abusadas e estupradas, o que equivale a uma forma de pena de morte para estas pessoas.

Outros ataques

Além desse, há outros projetos em tramitação ou já aprovados que também atacam a vida.

O Congresso Nacional tem agido de maneira cruel e covarde contra o povo, em um movimento reacionário sem precedentes. Por exemplo, o Congresso modificou o decreto presidencial 11.615/2023, que restringia o uso de armas de fogo no Brasil. 

Agora, com a alteração, os clubes de tiro podem estar próximos a escolas. Antes, era necessário manter uma distância superior a um quilômetro de estabelecimentos de ensino, públicos ou privados.

A flexibilização desse decreto beneficiará também o crime organizado que, por meio de “laranjas”, poderá adquirir indiscriminadamente armas legais.

Também foi anulada a decisão do presidente Lula de vetar trechos da lei 14.785/2023, conhecida como “Pacote do veneno”, que traz sérios riscos à biodiversidade e para a saúde da população. 

Ademais, há projetos que tentam impedir a vacinação contra a covid-19 em crianças e permitir que adolescentes, entre 14 e 16 anos de idade, trabalhem até 32 horas por semana em condições iguais às dos adultos, sem falar da proposta de redução da maioridade penal que vota a ser discutida. 

Certamente, esses são retrocessos hediondos, que promovem a violência, o negacionismo, o charlatanismo, o obscurantismo, a exploração desavergonhada da mão de obra de crianças. Enfim, promovem a injustiça e a infelicidade, em vez de uma vida plena e feliz para o nosso povo.

Uma bolha reacionária

O parlamento brasileiro se isola cada vez mais da sociedade.

Deputados e senadores vivem em bolhas, com a bancada BBB, que se refere à bancada armamentista (“da bala”), bancada ruralista (“do boi”) e à bancada evangélica (“da bíblia”) se retroalimentando de reacionarismo.

Com efeito, dentro dessas bolhas é impossível ter uma visão abrangente da sociedade. Embora a sociedade seja formada por partes, o que deve prevalecer é o todo.

Portanto, o parlamento deveria atender aos interesses da coletividade, e não apenas de segmentos específicos.

Em uma democracia representativa, o parlamento deve materializar os anseios da sociedade como um todo. Contudo, isto não tem ocorrido na atual legislatura.

Decisões em benefício do povo são raras, como exemplifica o projeto de lei 1.904, que, claramente, atende a um único segmento, além de ser antimulher e antipovo.

Conclusão

O Congresso Nacional, hoje, é uma nova casa-grande. A representatividade do povo trabalhador é mínima, feita por alguns poucos bravos deputados e senadores.

A verdadeira representação, tanto na Câmara quanto no Senado, é da burguesia urbana e rural, uma representação, portanto, da casa-grande.

Nesse âmbito, não é de se surpreender que a maioria dos projetos de lei seja contra a vida do povo trabalhador pobre, preto, indígena e periférico.

Portanto, é preciso lutar por um equilíbrio na representatividade no Congresso Nacional a partir de 2026.

Caso contrário, o parlamento continuará sendo uma casa antipovo, um parlamento contra a vida.

*O autor é sociólogo. 

Ilustração: Gilmal