O cemitério mais colorido do Brasil

Praticamente todos os cemitérios do Brasil são pintados de branco, exceto o de Parintins: cidade pávula

Juliana Oliveira, da Redação do BNC Amazonas em Parintins

Publicado em: 21/06/2025 às 13:47 | Atualizado em: 21/06/2025 às 13:47

Parintins, no Amazonas, é uma grande tela a céu aberto, fruto do trabalho criativo de muitas pessoas. Berço e celeiro de artistas, a cidade exibe suas cores como um pavão e suas penas iridescentes – não sem razão, o termo “pavulagem” é próprio dessa região.

Parintins não apenas é o locus de um dos maiores festivais folclóricos do mundo, mas também mostra aos visitantes diferentes painéis pintados em seus muros. Orgulhosamente, muitos desses painéis tematizam povos indígenas da Amazônia e o boi-bumbá.

O bumbódromo, pintado pelo magnânimo Pito Silva, tem também painéis em seu muro externo, pintados pelos artistas da Associação de Artistas Plásticos de Parintins.

Mas, o que chama a atenção do visitante é sua morada dos mortos.

Praticamente todos os cemitérios do Brasil são pintados de branco, exceto o de Parintins: cidade pávula.

O parintinense não quer ‘passar em branco’. Por isso, a passagem entre fé e festa é permeada por muitas cores.

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Não passar em branco

O cemitério de Parintins se localiza à avenida Clarindo Chaves, exatamente entre as avenidas Nações Unidas (bumbódromo) e Amazonas (catedral de Nossa Senhora do Carmo).

A catedral em tons amarelos crus e o bumbódromo dividido entre azul e vermelho contrastam com o cemitério multicor.

De fundo azul celeste, o muro do cemitério parintinense é multicor e ilustra temas do boi-bumbá, fé, “festa de interior”, proteção divina e espiritual, mulheres indígenas tomando tacacá, canoas e ribeirinhos.

Nossa Senhora Aparecida aparece pintada ao lado de “quem me protege, não dorme!”, com exclamação.

Entre a catedral e o bumbódromo, o cemitério parintinense ocupa justamente o local do interstício, entre o sagrado e o profano, entre a fé e a festa.

Pessoas vão ao bumbódromo festejar ou à catedral rezar por proteção. Os mortos, por sua vez, fazem sua passagem para outra dimensão entre fé e festa.

Contudo, essa passagem entre fé e festa não pode ser abrupta. Das cores do bumbódromo às cores da catedral, o parintinense quer fazer sua passagem ao mundo dos mortos mantendo o mundo multicor.

Que abrupto seria sair da cidade pávula e ir direto para um local todo branco!

Não, o parintinense não quer isso, pois vive a multiplicidade das cores em toda a sua intensidade.

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Ter fé para festejar

Fé e festa começam com a mesma sílaba (–fe) e, embora sejam palavras distintas, designam coisas não tão opostas assim.

Em Parintins, a festa comemorativa da vitória de um dos dois bois-bumbás no festival folclórico só pode acontecer se houver fé.

Todos os anos os bois-bumbás vão aos pés de Nossa Senhora do Carmo pedir a bênção da vitória.

Os ensaios técnicos podem se iniciar com rezas ao Pai Nosso e Ave Maria, ou ainda, ser acompanhados por defumações, sobretudo, quando os bois trazem elementos de religiões de matriz africana ou xamanismo indígena.

Para fazer festa é preciso ter fé de que o dia de amanhã será melhor que o de hoje.

Para festejar é preciso a fé e a esperança de vencer o festival folclórico.

Quem tem fé pode ter festa, mas quem faz festa é porque teve fé.

Fotos: Juliana Oliveira/especial para o BNC Amazonas