A noite das crianças: os bois-mirins de Parintins

As crianças parintinenses têm um espaço e um campeonato só para elas realizarem o sonho de brincar de boi de arena

A noite das crianças: os bois-mirins de Parintins

Dassuem Nogueira, da Redação do BNC Amazonas em Parintins

Publicado em: 16/06/2025 às 12:51 | Atualizado em: 16/06/2025 às 12:53

O 58º Festival Folclórico de Quadrilhas, Danças e Bois-Mirins de Parintins se encerrou na noite deste dia 15 de junho, o domingo, com a competição entre os bois-mirins Estrelinha (verde e branco), Tupi (laranja e branco) e Mineirinho (azul e branco). Eles dão mais cores à ilha para além do azul e vermelho. 

As crianças parintinenses têm um espaço e um campeonato só para elas realizarem o sonho de brincar de boi de arena. E não é de hoje. Neste ano, por exemplo, o Mineirinho completou 40 anos. 

Os itens de competição dos bois “adultos” se repetem quase todos nos mirins e as apresentações se dão em temas.

O boi Estrelinha levou o tema “O verde: do amor à paixão”; o boi Tupi, “Folclore, vida e tradição”; e o Mineirinho, “Fé, crenças e saberes”.

Poucas crianças no mundo têm sua brincadeira levada tão a sério pelos adultos. Há uma premiação em dinheiro para os três, que são julgados por um corpo de jurado especializado.

A apresentação dos bois mirins é esperada pelos moradores da cidade, que lotaram o anfiteatro Sila Marçal para assistir as suas crianças.

Leia mais

Ser curumim e cunhatã em Parintins

O universo infantil no espetáculo

O universo infantil é ressaltado, tornando-se espetáculo. 

O boi mirim Estrelinha foi o primeiro a se apresentar. Destacou-se na apresentação o auto do boi com uma personagem a mais, a filha nascida de Pai Franciso e Mãe Catirina. 

No auto do boi “adulto”, Mãe Catirina grávida deseja comer a língua do boi preferido do patrão. Na versão apresentada pelo Estrelinha, a filha do casal, batizada de Maria Francisco, tal qual sua mãe, colocou o pai em situação difícil: ela queria brincar com a estrelinha que o boi preferido do patrão tem em sua testa. 

Maria Francisco, uma criança ainda menor que aquelas que representavam o casal, encenou graciosamente a menina que exigia do pai o brinquedo. 

Para satisfazer a vontades de sua filha amada, Pai Francisco matou o Estrelinha, deixando triste a filha do patrão, a sinhazinha. 

No fim, o pajé trouxe o boi novamente à vida.

No auto do boi Tupi, a corte de meninas que encenam amigas da sinhazinha se jogaram no chão, simultaneamente, solidarizando-se à amiga que perdera seu brinquedo preferido, dando um inesperado efeito de que toda a arena se desolava. 

O boi Mineirinho trouxe a romaria das águas apostando no lúdico das crianças carregando os barquinhos que homenageiam São Pedro.

Leia mais

Os boizinhos da ilha

Cuidado com os pequenos

Nota-se o cuidado com as crianças em diferentes esferas. Todas carregam a autorização emitida pelo juizado especializado no pescoço. 

Além disso, aparecem sempre vestidas, mesmo quando performando indígenas com indumentárias curtas. 

Vê-se ainda que as meninas que são itens que, quando representadas por adultas performam sensualidade, não o fazem dessa forma nos bois-mirins. 

Elas também não são colocadas em alegorias altas, para o que os bois-mirins encontram soluções criativas. O boi Tupi trouxe um boneco representando o boi e o tripa surgindo nas alturas.

No auto do boi das crianças, não há o doutor Cachaça, personagem que performa um médico embriagado que é chamado para ressuscitar o boi. A personagem é chamada de Doutor das Crianças, um pediatra. 

Leia mais

Criadas para o estrelato

Como a pavulagem é um traço da personalidade municipal, as crianças aprendem desde cedo, por meio dos espaços destinados a elas, a se exibirem com naturalidade. 

Na dispersão das apresentações, espaço entre a saída do anfiteatro e o bumbódromo, as crianças são celebradas tal como os itens adultos, com pessoas que os cercam para tirar fotos e tietá-las, os veículos de comunicação também lhes cercam.

As crianças posam para fotos, atendem seu público e dão entrevistas sem timidez.

BNC Amazonas perguntou aos itens mirins como nasceu neles o sonho de serem itens dos seus bois e se sonhavam em sê-lo na arena. 

O pajé do boi Tupi, José Romano, 8 anos, em sua a sinceridade infantil, respondeu “eu não queria ser pajé do Tupi, eu comecei no Mineirinho, me convidaram pra dançar no Mineirinho. Aí depois do Mineirinho, a presidente do boi Tupi me chamou para participar no boi Tupi e eu falei sim, eu quero”. 

Sobre um dia se apresentar nos bois adultos, ele respondeu: “Eu tenho sonho de ser pajé do Caprichoso”.

O levantador Alax Joaquim, do boi Tupi, do alto de seus atuais 15 anos, é levantador desde 2016:

“Eu tinha apenas 6 anos quando eu fui levantador a primeira vez lá na minha escola. Eu sou do interior, do Mocambo do Arari, e foi quando eu estreei lá como levantador do boi da escola. E, em 2022, viram um vídeo meu e foram atrás de mim lá. E eu tô aqui pra me apresentar com garra e a gente vai ser campeão, se Deus quiser”.

Na comunidade Mocambo do Arari há um festival de boi-bumbá de grande importância regional no baixo rio Amazonas.

Sobre ser levantador quando crescer, Alax respondeu:

“Meu sonho é entrar nessa arena aqui um dia ou na arena da minha própria cidade, é um sonho sim”.

Fotos: Dassuem Nogueira/especial para o BNC Amazonas