‘Para que fique perene…’
Publicado em: 26/08/2009 às 00:00 | Atualizado em: 26/08/2009 às 00:00
A motivação, no início do dia, era falar da volta às ruas do movimento popular. Saudar a turma que foi ontem ao centrão de Manaus – na Praça da Matriz – para uma primeira mostra pública do déficit da cidadania local. Era também discutir e tentar compreender, nesse manifesto, a batalha para vencer um longo período de indignação dispersa e traduzir o sinal dos ativistas em direção à construção da rearticulação e do re-conhecimento de seus pares em meio a multidão. Mas, uma notícia na TV interrompe o almoço apressado e mais uma vez faz a gente sentir um aperto danado no peito: o poeta Aníbal Beça morreu.
A TV fez desfilar algumas cenas desse sujeito de cara boa, do tipo que faz da conversa improvisada um grande encontro. Um homem menino nos comovendo com seus antídotos em forma de poesias despretensiosamente disponíveis em nossos endereços eletrônicos.
Em tantos dias difíceis, foram esses presentes a porção mágica para abrir o sorriso e seguir em frente. Quem fará isso agora? Imagino Aníbal num outro encontro, com uma turma que, certamente, fará festa graúda. Afinal, assim costumava acontecer, por aqui, quando se encontravam. Juntos, eles nem sentirão falta do pato no tucupi, do peixe frito ou assado… Nós sim sentiremos uma falta danada desses encontros e da possibilidade de fazê-lo real. Já não é mais possível agendar.
Quem sabe no percurso dessa outra viagem, Aníbal Beça já esteja compondo a utopia da resistência numa praça central dessa cidade imensamente amada por ele.
Então, diante do poder da criação, peço licença para recortar o “Anúncio” de Aníbal e repetir, para todos nós, sem ele, que:
“É preciso, finalmente, se apaixonar todos os dias.
Experimentar o gesto no corpo da amada (do amado).
Imprimir no toque a tatuagem serena para que fique
perene quando for saudade:A vida se amplia num flash de coisas pequeninas, e o
que ficar são ecos de melodia transitória”.
*Jornalista, professora do Curso de Comunicação Social da Ufam.