De cada 10 que morrem nas prisões brasileiras, 6 são por doenças

Relatório aborda os desafios do sistema carcerário brasileiro e como eles afetam a saúde dos detentos. Destaca-se a superlotação, as condições insalubres e a falta de acesso à saúde.

Diamantino Junior

Publicado em: 14/06/2023 às 15:29 | Atualizado em: 14/06/2023 às 15:31

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revela que o sistema carcerário brasileiro já contava com cerca de 900 mil presos até o terceiro trimestre de 2022. Dentre eles, 44,5% são presos provisórios, ou seja, ainda aguardam julgamento. Esses números evidenciam um cenário marcante do sistema prisional nacional: a superlotação, já que o país dispõe apenas de 460 mil vagas até junho de 2019.

As informações são do portal Segundo a Segundo.

A falta de adequações para a convivência e a manutenção sanitária dos detentos são aspectos alarmantes apontados pelos dados. Um estudo recente do CNJ revelou que aproximadamente 62% das mortes ocorridas nas prisões são causadas por doenças como insuficiência cardíaca, pneumonia e tuberculose.

Além disso, o relatório indica que muitas mortes são notificadas sem os procedimentos descritivos adequados, sendo classificadas erroneamente como “naturais”, quando na verdade são consequências diretas da negligência com relação à saúde básica no sistema. Embora a legislação brasileira garanta o acesso à saúde aos detentos, essa garantia muitas vezes não é observada na prática.

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Mariana Scaff Haddad Bartos, pesquisadora do Departamento de Política, Gestão e Saúde da Faculdade de Saúde Pública da USP, destaca que a condição de vida dos presos no Brasil está diretamente ligada a um sistema que exclui, perpetua vulnerabilidades e viola o exercício de direitos, inclusive o direito à saúde.

Diante disso, a arquitetura carcerária parece não respeitar os aspectos essenciais para a qualidade de vida dentro das prisões. Um dos problemas significativos é a saúde dos detentos.

Dados do CNJ mostram que a chance de contrair tuberculose é 30 vezes maior entre os presidiários em comparação com o restante da população, e o risco de morte por enfraquecimento extremo é 1.350% maior para esses indivíduos.

Condições insalubres e superlotação das celas influenciam diretamente a transmissão de doenças.

Fatores como a baixa entrada de luz, espaços com pouca ventilação, alta umidade e a presença constante de mofo nas celas contribuem para a inadequação desses ambientes.

A má alimentação dos presos também é um problema relevante. A falta de acesso à água potável é outro aspecto que afeta diretamente a saúde dos detentos, levando a problemas de insegurança alimentar.

A higiene é uma questão crítica que afeta a saúde dos detentos. A ausência de condições básicas para a manutenção da integridade física é evidente, com a falta de produtos como sabonete, papel higiênico e absorventes. Frequentemente, essas demandas são supridas pelos familiares dos presos por meio dos chamados “jumbos”, que também incluem cobertores, remédios e alimentos.

Durante a pandemia de COVID-19, as falhas históricas e os problemas relacionados à saúde nas prisões brasileiras se agravaram.

O ambiente prisional se tornou um ambiente propício para a propagação do vírus, contrariando as recomendações para controlar a disseminação da doença.

Os problemas no sistema carcerário brasileiro refletem as desigualdades sociais presentes no país. Muitas vezes, esse sistema atua como instrumento de segregação entre os indivíduos.

A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP) prevê que a saúde dentro das prisões seja organizada por Equipes de Atenção Básica Prisional (EABPs), responsáveis por qualificar os serviços nessa área.

A estruturação dessas equipes é multifuncional e varia de acordo com critérios como o número de presos, o tamanho do sistema prisional e o perfil epidemiológico da unidade.

Segundo o professor David Teixeira de Azevedo, advogado criminalista e professor da Faculdade de Direito da USP, os problemas nas prisões brasileiras não são recentes.

Alguns deles são crônicos, como a falta de vagas, a ausência de assistência aos presos após o cumprimento de suas penas e a questão relacionada à dignidade humana.

Apesar da existência de leis que garantem diversos direitos aos presos, esses direitos muitas vezes não são efetivados na prática. A assistência à saúde nas prisões brasileiras é extremamente precária, dificultando a oferta de cuidados preventivos, curativos, farmacêuticos e odontológicos de forma adequada. É evidente que não podemos manter a terceira maior população carcerária do mundo sem garantir os direitos básicos dessas pessoas.

Para melhorar o cenário atual, é necessário reduzir o número de prisões. A alta proporção de presos provisórios, que chega a 41%, é inaceitável. Também é preciso questionar o aumento de 1.253% no uso desse tipo de prisão de 1990 a 2010, violando o princípio da presunção de inocência. É essencial olhar com generosidade para o indivíduo que está sendo processado, reconhecendo sua dignidade e direitos constitucionais.

Em suma, o sistema carcerário brasileiro enfrenta desafios que afetam diretamente a saúde dos detentos. A superlotação, as condições insalubres, a má alimentação e a falta de higiene são apenas alguns dos problemas enfrentados.

É fundamental promover mudanças efetivas para garantir o respeito aos direitos básicos e à dignidade humana no sistema prisional.

Foto: reprodução