Governador de SP cria pasta da mulher, mas 99% da verba é de outro setor
A falta de orçamento suficiente também tem suscitado debates sobre a viabilidade das ações da Secretaria de Políticas para a Mulher.

Diamantino Junior
Publicado em: 27/07/2023 às 16:27 | Atualizado em: 27/07/2023 às 16:27
Na esteira das iniciativas voltadas para o fortalecimento dos direitos das mulheres, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), criou, em janeiro deste ano, a Secretaria de Políticas para a Mulher. Entretanto, apesar da boa intenção por trás da criação da pasta, a realidade financeira da Secretaria tem sido um obstáculo significativo para o desenvolvimento de ações efetivas em defesa das mulheres paulistas.
A principal questão reside no fato de que quase a totalidade do orçamento destinado à Secretaria de Políticas para a Mulher pertence à antiga Secretaria de Logística e Transporte. Segundo dados do Sigeo (Sistema de Informações Gerenciais da Execução Orçamentária) do governo estadual, impressionantes 99% dos recursos previstos foram direcionados para a área de transporte, deixando apenas 1% para a nova Secretaria.
A criação da Secretaria de Políticas para a Mulher ocorreu por meio de um decreto, sem passar pelo crivo dos deputados na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), o que tem gerado críticas de especialistas em direito público.
Roberto Piccelli, advogado especialista na área, ressalta que a conversão da antiga secretaria por decreto representa uma forma de burlar a competência do Legislativo para aprovar mudanças na estrutura do secretariado.
O montante destinado à nova pasta não é suficiente para efetivar projetos e programas voltados para a defesa e proteção das mulheres, o que torna a Secretaria praticamente dependente da boa vontade do governo e de outras secretarias para viabilizar suas ações.
Dos R$ 782,8 milhões da “dotação atual”, apenas R$ 9,4 milhões foram efetivamente destinados à Secretaria da Mulher, dos quais R$ 4,1 milhões foram reservados para “Gestão Administrativa”, como pagamento de salários e fornecedores.
Enquanto a Secretaria de Políticas para a Mulher luta para desempenhar suas funções com recursos limitados, os desafios enfrentados pelas mulheres paulistas continuam alarmantes.
No primeiro semestre de 2023, os números de estupros e feminicídios em São Paulo atingiram patamares preocupantes.
Com 7.089 casos de estupro registrados no período, o estado atingiu a maior marca desde 1996. Além disso, os 111 casos de feminicídio reportados também representam o maior número para o primeiro semestre desde 2018.
Diante desse cenário, a secretária da Mulher, Sonaira Fernandes, buscou recursos para ações voltadas às mulheres, pedindo à Alesp, por meio de um ofício em junho, a inclusão obrigatória de despesas para programas e projetos femininos no orçamento anual de São Paulo.
Entretanto, mesmo com a Constituição Estadual exigindo que secretários prestem contas às comissões temáticas da Alesp, Sonaira não compareceu à Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres, o que gerou questionamentos sobre a destinação dos recursos.
A falta de orçamento suficiente também tem suscitado debates sobre a viabilidade das ações da Secretaria de Políticas para a Mulher.
Leia mais
Tarcísio de Freitas endurece e quer que Bolsonaro pague multa da covid
Para alguns especialistas, remanejar o orçamento herdado de outras áreas, como fez o ex-presidente Lula para criar novos ministérios, poderia garantir a verba necessária para o efetivo funcionamento da Secretaria.
Por enquanto, a Secretaria da Mulher afirma ser uma pasta articuladora de políticas públicas, identificando necessidades e alinhando respostas em parceria com outras secretarias, embora seu orçamento garantido pelo governo ainda não seja suficiente para suprir as demandas urgentes das mulheres paulistas em meio a um contexto de crescente violência de gênero.
Como essa questão se desdobrará e como o governo de São Paulo enfrentará os desafios à proteção das mulheres são perguntas que ainda aguardam respostas.
Enquanto isso, as vozes das mulheres continuam clamando por uma atuação mais efetiva e uma destinação justa dos recursos para que a Secretaria de Políticas para a Mulher possa cumprir sua missão de promover a igualdade de gênero e garantir uma sociedade mais justa e segura para todas as mulheres paulistas.
Leia mais no UOL
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil