Movimento contra corrupção tenta conter retrocesso na Lei da Ficha Limpa

Projetos de leis no Congresso flexibilizam prazos de inelegibilidade e comprometem o processo eleitoral

Movimento contra corrupção tenta conter retrocesso na Lei da Ficha Limpa

Antônio Paulo, do BNC Amazonas em Brasília

Publicado em: 14/05/2025 às 20:07 | Atualizado em: 14/05/2025 às 20:07

O Movimento Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral se reuniu nesta quarta-feira, 14 de maio, na sede da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Brasília.

O foco do encontro foi a defesa da Lei da Ficha Limpa, a preocupação com projetos de lei que ameaçam retrocessos no processo democrático e o fortalecimento da mobilização da sociedade civil.

Dessa forma, entre os principais temas tratados, destacou-se a crescente ameaça à Lei da Ficha Limpa, fruto de uma ampla participação popular e que representa um importante instrumento de moralização política.

“Estamos preocupados com a tentativa de reformar o sistema político sem debate com a sociedade. Há uma avalanche de projetos que alteram significativamente a legislação eleitoral e a população não está acompanhando isso”, alertou o diretor do movimento, Melillo Dinis.

Segundo ele, cinco projetos atualmente em tramitação no Congresso Nacional, como os projetos de leis complementares 112/2021, que trata do novo Código Eleitoral, e o 192/2023, ambos em análise no Senado, propõem mudanças que fragilizam os critérios da ficha limpa, flexibilizando prazos de inelegibilidade que comprometem a integridade do processo eleitoral.

De outro modo, o projeto 112/2021, além de representar retrocessos à Lei da Ficha Limpa, ameaça conquistas fundamentais, como a lei 9.840/1999, que combate a compra de votos, cria obstáculos à participação das mulheres na política, traz mudanças preocupantes em temas como prestação de contas, regras de desincompatibilização, entre outros pontos sensíveis.

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Também estão tramitando no Congresso Nacional os seguintes projetos de leis complementares:

• 14/2025 – propõe condicionar a inelegibilidade à existência de uma condenação penal em última instância (Hélio Lopes – PL-RJ);

• 141/2023 – altera prazo de inelegibilidade da lei da Ficha Limpa de 8 para apenas 2 anos (Bilbo Nunes – PL-RS);

• 316/2016 – altera casos de inelegibilidade e prazos de cessação de pena (Félix Mendonça Júnior – PDT-BA).

Essas alterações, segundo o movimento, podem abrir caminho para o retorno de candidatos condenados por corrupção e outros crimes graves, comprometendo a ética, a transparência e a confiança nas eleições.

Ameaças

Luciano Caparroz Santos, também diretor do movimento e presidente do Centro Santo Dias de Direitos Humanos, ressaltou que a Lei da Ficha Limpa é uma conquista histórica da sociedade brasileira, aprovada por unanimidade no Congresso e referendada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

No entanto, ele alerta para iniciativas legislativas que buscam esvaziar seu conteúdo:

“Projetos como o 192/2023, que reduz o prazo de inelegibilidade, representam uma tentativa clara de beneficiar políticos com histórico de irregularidades. A motivação não é aprimorar a lei, e sim enfraquecê-la”.

Santos reforçou que qualquer modificação em uma lei de iniciativa popular, como é o caso da ficha limpa, deve ser precedida de amplo debate com a sociedade.

Combate ao retrocesso

Já a presidente do Instituto de Fiscalização e Controle (IFC), Jovita José Rosa, apontou que, hoje, o combate à corrupção está desacreditado.

Para ela, é preciso reencantar as pessoas à luta e à mobilização para preservação da Lei da Ficha Limpa.

“Se não houver uma mobilização da sociedade nós corremos o risco de pessoas que não têm o compromisso, que estão no Congresso Nacional, trabalharem para o próprio interesse”.

Providências

Como encaminhamento, o movimento aprovou a elaboração de um manifesto em defesa da Lei da Ficha Limpa, com o apoio das 74 organizações que o compõem e atrair novas entidades para o movimento.

Ainda, a realização de um seminário e intensificação da articulação com entidades da sociedade civil, com o objetivo de enfrentar os retrocessos em curso e reafirmar o compromisso com a democracia e o combate à corrupção eleitoral.

15 anos de vigência

Em 2025, a Lei da Ficha Limpa completa 15 anos de vigência. Para marcar a data e fortalecer sua defesa, o movimento trabalha no lançamento de um manifesto que agregue entidades da sociedade civil e reforce o compromisso com a ética na política.

A Lei da Ficha Limpa (lei complementar 135/2010) estabelece regras para a inelegibilidade de candidatos a cargos políticos, com o objetivo de combater a corrupção e garantir a probidade administrativa.
Ela foi resultado de uma mobilização popular, com mais de 1,6 milhão de assinaturas em um projeto de lei de iniciativa popular.

Inelegibilidades

Entre os principais pontos da Lei da Ficha Limpa estão as inelegibilidades de oito anos por condenação criminal, cassação de mandato, renúncia para evitar cassação e por improbidade administrativa.

A lei complementar 135/2010 também prevê outras hipóteses de inelegibilidade, como a condenação por crimes eleitorais, a participação em fraudes eleitorais, entre outros.

Foto: Gyani Costa/CNBB