Após virar alvo do CNJ, juiz revoga decisões no esquema limpa-nome
Um juiz de Pernambuco está sob investigação do CNJ devido a suas decisões liminares que beneficiaram um esquema de remoção de nomes de devedores. Ele revogou algumas dessas decisões após a investigação.

Diamantino Junior
Publicado em: 25/09/2023 às 16:27 | Atualizado em: 25/09/2023 às 16:27
Após ser alvo de investigação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o juiz Robinson José de Albuquerque Lima, de Pernambuco, tomou a iniciativa de revogar suas próprias decisões liminares que beneficiavam o esquema conhecido como “limpa-nome”. Esse esquema já ocultou mais de R$ 20 bilhões em dívidas nas bases de consulta de protestos em todo o país, incluindo o Serasa.
O juiz está sob investigação do CNJ devido a uma reportagem do Metrópoles que revelou, há dez dias, dezenas de suas decisões liminares sigilosas a favor de associações que oferecem serviços de remoção de nomes de empresas e pessoas endividadas das pesquisas públicas.
Desde o início da investigação, Albuquerque revogou quatro das decisões que havia emitido desde o ano passado. Em todas essas decisões, o juiz destacou que a ação “poderia validar possíveis atos fraudulentos realizados por terceiros supostamente interessados nos efeitos práticos e econômicos resultantes da retirada de registros negativos”.
O magistrado apontou que pessoas têm mudado constantemente de endereço para evitar notificações de cartórios de protesto de dívidas e de empresas que abriram múltiplos CNPJs para ocultar registros de inadimplência no Serasa e obter crédito. Ele afirmou que essa situação exige uma ação decisiva para eliminar qualquer indício de ilegalidade.
Todas as quatro decisões foram concedidas à Associação Brasileira de Defesa do Empresário e Consumidor, uma entidade que reúne empresários que oferecem o serviço “limpa-nome”.
A associação obteve decisões sigilosas do juiz, ordenando ao Serasa e ao Instituto de Protestos de São Paulo (IEPTB) que retirem os nomes dos devedores de suas bases de dados. Essas decisões surgiram após uma estratégia jurídica específica que permitiu à associação escolher o juiz responsável pelo caso.
Além de conceder as decisões à associação, o juiz ampliou as liminares para incluir mais associados em novos pedidos, todos contendo listas de inadimplentes.
Essas associações também moveram processos semelhantes em comarcas menores, onde só há um juiz, totalizando 60 processos em Pernambuco, Piauí e Paraíba. Os beneficiários e as empresas vinculadas a essas entidades estão distribuídos por todo o país.
É importante ressaltar que as decisões não anulam as dívidas nem removem os protestos dos cartórios, mas fazem com que os nomes dos devedores desapareçam das pesquisas que são utilizadas diariamente pelo mercado de crédito. Esses devedores aparecem nos registros judiciais como associados das entidades que moveram os processos, embora na prática sejam clientes de empresas que cobram até R$ 1,5 mil para ocultar suas dívidas.
A investigação em andamento levou o corregedor do CNJ, ministro Luis Felipe Salomão, a solicitar explicações tanto ao juiz Albuquerque Lima quanto a outro magistrado no interior de Pernambuco, que emitiu liminares semelhantes. Além disso, ele solicitou esclarecimentos a três Tribunais de Justiça sobre essas decisões, considerando a aparente gravidade dos fatos relatados nas reportagens.
O ministro Salomão apontou que as matérias divulgadas indicam a possibilidade de orquestração de litigação em massa com demandas fictícias, bem como a manipulação da distribuição de processos para ocultar dívidas em benefício de determinados indivíduos e empresas supostamente irregulares.
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Desde a publicação da reportagem em 5 de setembro, o juiz Albuquerque Lima optou por não comentar processos em andamento, reiterando sua dedicação à condução de processos com base em princípios legais ao longo de seus 29 anos de carreira na magistratura.
Ele destacou que está impedido de emitir opiniões ou interpretações sobre casos judiciais fora dos autos, que normalmente estão sujeitos à revisão por tribunais superiores.
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Foto: reprodução