¿Qué pasa con los venezolanos?

Segundo dados da ACNUR e OIM, são cerca de 6,2 milhões de venezuelanos vivendo como migrantes e refugiados no mundo

Mariane Veiga, por Dassuem Nogueira

Publicado em: 25/08/2023 às 19:35 | Atualizado em: 25/08/2023 às 19:35

Passaram-se sete anos do ápice de uma crise econômica e política sem precedentes na história recente da Venezuela. Em 2016, o país encontrava-se em quase total desabastecimento e a hiperinflação.

A crise intensificou a saída de pessoas do país, que já vinha crescendo desde 2014. Hoje, o êxodo venezuelano figura entre os mais expressivos no mundo.

Segundo dados organizados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas (ACNUR) e Organização Internacional das Migrações (OIM), são cerca de 6,2 milhões de venezuelanos vivendo como migrantes e refugiados no mundo. E 2,5 milhões vivendo sob outras formas legais só nas Américas.

A crise econômica na Venezuela dá sinais de estabilização. Sobretudo após o início da guerra entre Rússia e Ucrânia, quando o petróleo venezuelano voltou a ser requisitado no cenário internacional.

Contudo, a dolarização da economia e a degradação dos serviços públicos e privados ainda predominam no cenário local.

Roraima e Amazonas foram os estados com o maior impacto dessa entrada no Brasil. As capitais Manaus e Boa Vista estão ligadas pela BR-174 à fronteira, em Pacaraima, do lado brasileiro, e Santa Elena de Uairén, na Venezuela.

Em dezembro de 2016, formou-se acampamento de imigrantes no entorno da rodoviária de Manaus. Entre estes, muitos indígenas do povo warao, originários do delta do Orinoco, onde esse rio desagua no caribe venezuelano.

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O começo do impacto

Os impactos sociais da chegada em grande número de venezuelanos a Roraima foram muitos. Em resposta o governo brasileiro criou a operação Acolhida em 2018.

A OPA é organizada pelas Forças Armadas brasileiras e acompanhada por agências das Nações Unidas e organismos internacionais, em parceria com organizações e governos locais.

Suas diretrizes são o ordenamento da fronteira, abrigamento e interiorização. Em 2019, a OPA foi requisitada pelo Governo do Amazonas que, em parceria com a Prefeitura de Manaus, mantém abrigos para os venezuelanos.

Mas, a maioria dos imigrantes não vive ou sequer passa pelos abrigos públicos. Nos estudos sobre migração, diz-se que é preciso distinguir quem migra e em que condições.

Mesmo no contexto de grave e generalizada violação dos direitos humanos, condição pela qual os vistos de residência temporária e de refúgio são concedidos aos venezuelanos no Brasil, há os que migram para a Espanha e Estados Unidos de avião. E há os que migram a pé pelas estradas.

Assim como, no Brasil, nem todos desejam participar do programa de interiorização oferecido pela OPA. Ele desloca os imigrantes para outros estados a fim de diminuir a pressão sobre os serviços, principalmente em Roraima.

Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso são os que mais recebem os venezuelanos pelo programa.
Muitos desejam permanecer próximos a fronteiras para conseguir visitar e serem visitados pelos parentes com maior facilidade.

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Migrantes não são todos iguais

Hoje, em Manaus, é comum ouvir português com sotaque espanhol nos comércios e serviços da cidade. Muitas vezes, com uma música caribenha ao fundo.

Ainda é possível provar da culinária dos venezuelanos. Arepas e empanadas, por exemplo, são vendidas por ambulantes ou em restaurantes.

Dois venezuelanos revelaram a experiência de ser imigrante em Manaus.

Angel Rodriguez, de 34 anos, nasceu em Cariaco, um pequeno povoado no estado de Sucre, região caribenha.

Ele disse que já conhecia Manaus, quando de férias visitou um tio. Diante das dificuldades no seu país, resolveu ir de vez para a capital do Amazonas em 2017. Inicialmente, sozinho. Angel disse que o tio ajudou a conseguir seu primeiro emprego no Brasil. Com o que recebia, aos poucos trouxe sua família.

Conseguiu montar um bar, onde vende comida venezuelana. Seu público são, em maioria, brasileiros que gostam de ouvir música latina.

Angel se encaixa em um perfil de imigração mais predominante: o dos homens que migram sozinhos e que trabalham para trazer seus familiares em seguida.

Ele diz que já pensou em sair de Manaus em uma fase difícil da economia do país. Porém, não pensa em voltar para a Venezuela.

“Não é legal morar na Venezuela na condição atual que está. Ainda mais no regime do Maduro. Eles fazem o que querem lá. São donos do país, praticamente”.

Por enquanto, Angel pensa em ir a seu país apenas para passar férias. Como morava próximo ao mar do Caribe, disse sentir falta das praias.

Contudo, diz que já está bem adaptado. Aprendeu a gostar de farofa e é fã de tambaqui e pagode. Gosta muito do grupo Raça Negra.

Angel disse que pretende concluir o curso superior que faz na área de tecnologia. Já que a burocracia para reconhecimento do seu diploma venezuelano é muito cara e burocrática.

Atualmente, além do bar que abre nos fins de semana, ele é atendente em uma loja de variedades na zona leste.

Solitária na luta

Yaribeth Torrealba, 32 anos, é natural de Valencia, a segunda maior cidade da Venezuela. Ela está há cinco anos no Brasil.

Veio com ex-companheiro. Com ele, possuía uma loja de manutenção de informática, que venderam para vir ao Brasil.

Quando chegaram, foram recebidos pela então cunhada de Yaribeth, que já estava em Manaus.

Ela conta que o começo foi difícil. Primeiro, porque eles não falavam o idioma. Yaribeth aprendeu a falar português ouvindo pagode e sertanejo. É fã do cantor Leonardo.

Segundo, porque trabalhava muito e ganhava pouco como vendedora de farinha e ovo. Há quatro anos, trabalha como atendente em uma rede de esfirras na zona leste.

Ano passado Yaribeth foi à Venezuela visitar a mãe, que possui complicações de saúde. Atualmente, está sozinha em Manaus e trabalha para ajudar a manter a família na Venezuela.

Seus familiares não querem vir ao Brasil, pois acham o idioma difícil. Mas, ela sonha em trazê-los para mostrar que é diferente do que eles imaginam.

Yaribeth é um perfil de migrante comum entre as mulheres. As mulheres não costumam fazer a migração sozinhas. Comumente vem com familiares ou companheiro de sexo masculino.

Outro dado importante da migração internacional é que, os que se estabelecem, costumam enviar parte do que ganham para manter as famílias no país de origem.

Em alguns casos, geram impacto inclusive sobre o PIB do país de origem, como ocorre com os haitianos.

Em uma loja de estivas, procurei falar com os carregadores que eram venezuelanos. Porém, não fui autorizada a falar com eles, pois estavam em seu horário de trabalho. Tampouco o gerente concedeu uma declaração.

Como exposto, os imigrantes não estão em igualdade de condições. Muitos são inseridos em trabalhos pesados ou que exijam menor qualificação. Não raro, lhes é paga menor remuneração do que aos nacionais. O que pode gerar implicações legais.

Isso porque imigrantes e refugiados têm direitos iguais aos dos nacionais, não sendo admitida distinção. Assim como têm direito ao acesso a programas sociais e políticas públicas de saúde, educação e seguridade social.

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O primo pobre dos direitos humanos

O direito de migrar é o primo pobre dos direitos humanos, assim se diz. Ele é pouco compreendido, de modo geral. Ainda mais quando levas de migrantes empobrecidos chega a países onde a grande concentração de renda, também produz grande desigualdade social.

Nesses cenários, temos a impressão de que já não temos recursos para socorrer os nossos, como podemos socorrer os outros? Assim foi quando os venezuelanos começaram a chegar em grandes números no Brasil.

Grosso modo, há um consenso de que migrar é um direito. Posto que é de nossa condição humana procurar melhores condições de vida em outros lugares.

Manaus, por exemplo, é cada vez mais formada por pessoas que vem do interior procurar melhores oportunidades de vida. Esses são os migrantes internos.

O Brasil na migração internacional

O Brasil, aliás, não é o destino preferido das migrações internacionais. Não somos percebidos como um país de oportunidades. Não para aqueles com origem semelhante à nossa em desigualdade.
Ao contrário, os brasileiros formam grandes comunidades de migrantes em países como os Estados Unidos, Suíça e Portugal.

Porém, a crise econômica de 2008 nos Estados Unidos endureceu a política de entrada de imigrantes. O que, por sua vez, foi seguido por outros países com grandes economias.

Assim, os migrantes internacionais de países considerados pobres passaram a buscar novas rotas. Os haitianos, por exemplo, teriam preferido ir aos Estados Unidos, na ocasião em que o terremoto de 2010 ocorreu. O país norte americano, tradicionalmente, é o seu destino preferencial. Mas a entrada naquele país já estava mais difícil.

Além disso, a missão de paz iniciada no Haiti, ainda antes do terremoto, fez uma propaganda positiva do Brasil. Naquela ocasião, nosso país passou a ser uma possibilidade.

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Amazônia Babel

Historicamente, a Amazônia é um lugar por onde andam diferentes gentes. O grande rio Amazonas, que inicia no Peru, é uma grande estrada por andaram colonizadores portugueses, espanhóis, franceses, ingleses, holandeses.

Por aqui também andaram e andam povos indígenas, quilombolas e todos os grupos nacionais que se formaram a partir da criação dos estados e das fronteiras.

Assim, em Manaus, não é de hoje a presença de pessoas vindas de países fronteiriços, como Peru, Colômbia e Venezuela. Sobretudo, quando em situações de alguma emergência social.

Pelos anos 2000, muitos camponeses colombianos chegaram a Manaus fugindo das incursões das Forças Armadas Revolucionárias Colombianas (FARCS) e outras organizações paramilitares semelhantes em suas comunidades.

O contrário também é visto. Nos anos 2000, com o fortalecimento do real, o caribe venezuelano e colombiano foram destinos visados por aqueles que partiam de Manaus. Muitas vezes, ir ao caribe é mais barato do que ir aos destinos nacionais, como o Nordeste.

Porém, na história recente das migrações, a crise econômica e política na Venezuela colocou em evidência a entrada dos venezuelanos pela fronteira norte do país. Sobretudo, pelos números nunca antes registrados.

Segundo o Acnur, são 477,493 o total de refugiados e migrantes reconhecidos pelo Brasil. Fora aqueles que ainda aguardam pela concessão de vistos definitivos.

Em realidade, na ordem dos países que mais recebem venezuelanos, o Brasil é o 5º, na América Latina. Antes de nós estão: Colômbia, Peru, Equador e Chile. Fora da América Latina, os venezuelanos tem se dirigido, preferencialmente, a Espanha e aos Estados Unidos.

Em agosto, segundo o Acnur, estavam abrigados em Roraima, 7.974 venezuelanos, entre nacionais e indígenas.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil