CCJ do Senado ignora STF e julga constitucional marco temporal

A votação ocorre no mesmo dia em que o Supremo conclui o julgamento que derrubou o marco temporal por 9 a 2

Iram Alfaia, do BNC Amazonas em Brasília

Publicado em: 27/09/2023 às 16:51 | Atualizado em: 27/09/2023 às 16:53

Por 16 votos a favor e 10 contra, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (27) a constitucionalidade do marco temporal para demarcação de terras indígenas.

Com isso, o colegiado ignorou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que decidiu recentemente ao contrário.

A votação ocorre no mesmo dia em que o STF conclui o julgamento que derrubou o marco temporal por 9 a 2.

O relator do projeto, senador Marcos Rogério (PL-RO), rejeitou todas as 39 emendas apresentadas e manteve o texto na forma que veio da Câmara dos Deputados.

“Não é um tema do governo ou da oposição, é um tema de interesse nacional. Nós temos posições que podem até divergir, mas há uma compreensão de que esse é um tema do Brasil”, disse.

Pela tese ruralista, os povos indígenas só possuem direito aos seus territórios caso estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. O STF julgou que eles possuem o direito originário constitucional sobre suas terras ancestrais.

“Imediatamente após parecer favorável na CCJ, senadores aprovaram urgência do PL 2903, que pode ser votado ainda hoje, em uma tratorada histórica contra a vida e o planeta. É o genocídio pela caneta. Derrubamos o Marco Temporal no STF mas insistem. Vamos resistir!”, reagiu a deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG), que é presidente na Câmara da Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais.

De acordo com o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP), os senadores não se deram conta de que o Brasil tem uma dívida impagável com os povos originários.

“A civilização evoluiu para compreender o que são dívidas impagáveis. É isso que constitui o pacto civilizatório nosso. O reconhecimento dos direitos dos povos originários e do povo preto que foi escravizado é o que nos faz nação e é o que nos faz civilização”, advertiu.

Para ele, a decisão fere o artigo 231 da Constituição. “A Constituição reconhece o direito à terra, que é o direito à organização social e aos costumes de todos os povos que aqui vivem, às línguas e aos costumes dos indígenas contactados e dos não contactados também. É esse o avanço civilizacional da Constituição”, afirmou.

O líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (PT-ES), chegou a apresentar voto separado no plenário da CCJ.

“Esse projeto não trata apenas do marco temporal. Ele fala em aculturamento da comunidade indígena. Ele assegura o contato com os povos isolados. Isso é um risco para a saúde e a vida dos indígenas que ali estão. Isso é um verdadeiro ataque aos povos indígenas. Respeitar os povos indígenas é dizer ‘não’ a esse marco temporal, à aculturação, ao contato aos povos isolados”, defendeu.

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Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado