Meu menino, as plantas e as formigas

Crônica de Tuca Dantas retrata o amor materno com poesia e delicadeza.

Publicado em: 30/07/2025 às 14:37 | Atualizado em: 30/07/2025 às 14:37

Por Tuca Dantas*

Meu menino me chama para ver suas plantas, um broto que apareceu, umas folhinhas que estão secas, as borboletas que trazem mais beleza, as formigas que buscam se alimentar. Nós vamos conversando e suas mãos vão retirando as formigas, uma a uma, e vão levando-as para outro lugar. Ele nunca as mata. Para ele, a formiga é tão importante quanto a borboleta.

Em noites frias agora, ele me chama e me mostra as bandeiras dos países todos que desenhou. Canta em inglês os rocks todos que tem aprendido. Comenta as notícias de política. E me traz uma coberta quando fico a trabalhar até mais tarde.

Foi num dia assim de inverno de agosto que ele me chegou. Trazia na sua bagagem um mundo novo. E fez a vida, pela primeira vez, fazer valer a pena para mim. Ele me veio como um encantamento. Quase não chorou. Quase não mamou. Quase não abriu os olhos.

Eram tempos frios de inverno. E minha barriga-vaso foi rompida para que a planta então brotasse. Mas suas raízes ainda estão em mim. Sinto quando não está bem. Sei quando tem algo a dizer. Como ele faz com suas plantas, vou vendo a beleza da borboleta em sua vida, vou tentando tirar as formigas…

Minha planta no vasinho… A voz que dá cor ao silêncio. Um menino que não quer matar a formiga. E que me faz ser melhor a cada dia. Foi num dia frio de inverno em que eu estava deitada, sozinha, em um cenário frio, vozes entrecortadas, roupas brancas, agulhas e bisturis. 

Minha barriga-vaso que precisava se abrir para que a planta pudesse brotar, e sair da terra. Eu estava sozinha, mas creio que nunca estive tão feliz! Ele veio para meus braços, e até hoje o carrego assim!

*A autora é mestra em literatura brasileira.

Foto: arte criada por IA