Olha aí, pessoal, o conchavo está de volta!
"A cereja do bolo parece ser o caso de anistia ou redução de penas aos golpistas do 8 de Janeiro"

Mariane Veiga, por Walmir de Albuquerque Barbosa
Publicado em: 02/05/2025 às 14:48 | Atualizado em: 02/05/2025 às 14:56
O Supremo Tribunal Federal (STF) julga como inconstitucionais as leis municipais que proibiam a “linguagem neutra”; não houve julgamento de mérito, mas a incompetência dos municípios para legislar sobre essa matéria.
A União extinguiu o Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares, mas os estados continuam mantendo-as e ampliando o número de estabelecimentos, visto que o STF não se manifestou sobre o pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) acerca da inconstitucionalidade desse tipo de escola por ferir a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, porém suspendeu a liminar da Justiça paulista que impedia que o estado as criasse e as sustentasse com recursos próprios.
As ações que contestam a constitucionalidade da lei que criou o “marco temporal” das terras indígenas ainda não foram apreciadas, embora a corte suprema tenha se manifestado contrária a esse artifício que, à sua revelia, e até ao veto do presidente da República, virou lei.
Apesar da legislação e apelos à consciência nacional, o racismo, a aporofobia, a homofobia e a misoginia prosperam escandalosamente, até nas casas legislativas, como acaba de acontecer: uma vereadora paulistana se diz invejada por adversários porque é “branca, bonita e rica”.
Um ex-ministro, economista de renome, em pronunciamento em evento público sobre a economia do país, diz que uma das soluções para equilibrar a economia nacional é “congelar por seis anos o salário-mínimo dos trabalhadores brasileiros”.
Os estudantes de curso de medicina de uma universidade particular paulista estendem uma faixa na plateia de uma disputa esportiva fazendo apologia ao estupro; a instituição os expulsou, entretanto não se tem conhecimento de notícia-crime.
Criminoso rico e importante na vida política nacional, com sentença transitada em julgado, discute benesses para ter cumprimento de pena, abre divergências no STF contra suas próprias decisões anteriores.
Face às tentativas de golpe e pronunciamento da Justiça sobre o artigo 142 da Constituição federal, até o momento, ainda não vimos nenhuma articulação do Ministério da Defesa para rever os currículos das escolas militares, em todos os níveis.
Reivindicação se tem feito, também, para rever os poderes concedidos pelo Estado às corporações de ofício, permitindo-lhes interferências em assuntos que não lhes dizem respeitos e que geram prejuízo aos direitos de cidadania conquistados.
A cereja do bolo parece ser o caso de anistia ou redução de penas aos golpistas do 8 de Janeiro.
Dizem até que somos viciados em anistia e que tal perdão já foi usado pelo Estado brasileiro cerca de 80 vezes, o que justificaria o conchavo e a “pacificação”.
Por que tudo isso acontece, por quê?!
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Liberalismo e autoritarismo
Num daqueles livrinhos escondidos no canto da minha estante, encontrei essa pérola: NEDER, Gizlene. Os compromissos conservadores do liberalismo no Brasil. Rio de Janeiro: Achiamé/Socii, 1979.
Lá, nas páginas 8-9, a autora satisfez a minha curiosidade:
“A transformação burguesa no Brasil, porque tardia e relacionada com a internacionalização do modo de produção capitalista, efetivou-se de forma autoritária.
Desse modo, vemos o autoritarismo presente, hegemonicamente, no processo histórico brasileiro.
Por outro lado, discordamos daqueles que, fundamentando-se neste dado, afirmam que o pensamento liberal não encontra forma de expressão na nossa formação social.
Partindo do pressuposto de que tanto o liberalismo quanto o autoritarismo são formas de pensamento possíveis de serem formulados pela ideologia burguesa, como duas faces da mesma moeda, vemos a questão da predominância de uma ou outra relacionada às especificidades das diferentes sociedades estabelecidas.
A hegemonia de uma dessas vertentes não implica necessariamente na ausência ou impropriedade da outra”.
Assim, meus amigos, o “conchavo das elites” permite tudo:
- que a velha Arena volte à cena política como federação progressista;
- que a direita e até um pedaço da esquerda ofereçam a redução de pena já que a anistia é vergonhosa; e
- que o STF acate a “conciliação” entre oportunistas da mesma classe social e da mesma índole autoritária, mesmo com rótulos diferentes.
Foi assim desde o Império: os conservadores escravistas beneficiaram-se mais que os liberais promotores do fim da escravidão.
Isso explica, também, porque ex-presidente deixa a cadeia para pagar a pena em casa, enquanto os desafortunados da sociedade apodrecem nas prisões, muitos dos quais, sem julgamento!
O autor é jornalista profissional.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil