O Brasil no Big Brother 

O BBB 24 conta com participantes que ressignificam as matrizes étnicas de formação do povo brasileiro: indígena, negra e branca 

Big Brother Brasil

Neuton Correa, por Aldenor Ferreira*

Publicado em: 26/02/2024 às 06:32 | Atualizado em: 26/02/2024 às 06:38

De todas as edições do programa Big Brother Brasil, transmitido pela TV Globo, esta é a primeira vez que vejo, entre seus participantes, uma representação legítima da sociedade e da cultura brasileira. A 24ª edição do BBB conta com participantes que ressignificam as matrizes étnicas de formação do povo brasileiro: indígena, negra e branca. 

Não é exagero, o povo brasileiro com seus dilemas está no BBB 2024. E tem de tudo. Tem a representação do trabalhador precarizado, da elite abastada, da subcelebridade, do professor, do LGBTQIA+, do artista frustrado, enfim, de todos. 

O cotidiano da vida nacional se materializa diante dos olhos dos que acompanham o programa. Certamente, quando me refiro a dilemas, estou fazendo alusão aos problemas sociais, econômicos, políticos, culturais e étnico-raciais, vividos cotidianamente em nossa sociedade, que são revividos dentro do programa por meio de atitudes e falas dos participantes. 

Neste plural microcosmo televisivo é possível ver a representação fiel de como é o Brasil real. Um país preconceituoso, elitista, desinformado e misógino. O preconceito geográfico e étnico-racial vivido pela amazonense Isabelle Nogueira mostrou, por exemplo, que alguns participantes desconhecem totalmente o Festival Folclórico de Parintins. Um Festival que já está na sua 57ª edição. 

Esta edição do BBB mostra, ainda, que qualquer manifestação artística que seja feita fora dos grandes centros econômico-financeiros do país é sempre vista como algo menor, de pouca importância. Uma espécie de segunda divisão da cultura. Uma atitude típica do pensamento elitista. 

Capitão do mato

O programa também nos “presenteou” com episódios, nos quais é possível observar comportamentos típicos de “capitão do mato” por parte de certo participante negro. Apenas para lembrar, o capitão do mato era um negro, serviçal que, a mando do senhor da fazenda ou mesmo de homens livres, perseguia outros negros. Este sujeito social foi peça importantíssima na engrenagem do sistema colonial brasileiro de regime escravocrata. 

Neste sentido, ao atacar Isabelle, desdenhar e desmerecer sua cultura, a exemplo da toada de boi-bumbá, uma original música amazonense, o tal participante negro assume a função de capitão do mato moderno, pois a música que ele faz e que o fez enriquecer, assim como a toada, tem origem no seio das classes populares. 

Por fim, aparece também no programa a representação da patroa branca e rica que tem medo do trabalhador negro. Isto é algo corriqueiro, que é enfrentado, principalmente, pelos trabalhadores braçais nas cidades brasileiras. Os casos de violência contra os entregadores de alimentos em condomínios luxuosos comprovam isto que estou aludindo. 

Espero, sinceramente, que Isabelle Nogueira seja a campeã do BBB 2024. Se isto não for possível, que seja outra pessoa do “andar de baixo” da nossa sociedade. Afinal, pelo menos em programa de TV, os pobres precisam se dar bem e obter alguma vitória.

*O autor é sociólogo

Foto: ilustração/Gilmal