O berço esplêndido rui

Neuton Correa
Publicado em: 29/12/2018 às 02:42 | Atualizado em: 29/12/2018 às 08:21
Hudson Braga*
Passado meio século de sua criação, o modelo de desenvolvimento Zona Franca de Manaus (ZFM), especificamente sua indústria, nunca esteve tão ameaçado.
Com um novo comando no Planalto Central a partir de 1° de janeiro, uma política econômica ultraliberal se anuncia como o golpe de morte no Polo Industrial de Manaus.
Logo após a recente redução da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), de 20% para 4% para o polo de concentrados, veio a decisão da PepsiCo sair de Manaus.
Outras do segmento podem seguir o mesmo caminho, isso porque não terão mais a compensação fiscal/financeira para manterem fábricas longe dos grandes centros consumidores, principalmente o Sudeste do Brasil.
Essa é a lógica dos incentivos fiscais da ZFM para as grandes corporações devido ao oneroso custo logístico imposto pela região amazônica.
À época da assinatura do decreto redutor do IPI pelo presidente Michel Temer, estudo da Federação da Indústria do Estado do Amazonas (Fieam) já apontava prejuízo da ordem de R$ 6 bilhões por ano para o polo de concentrados de bebidas não-alcoólicas.
O novo golpe na indústria da ZFM, que antecipa o plano de revisão das políticas de incentivos fiscais do governo Bolsonaro, declarado publicamente pelo futuro superministro da Economia, Paulo Guedes, veio nesta sexta-feira, dia 28, no apagar das luzes de 2018.
A pedido, o presidente Michel Temer não sancionou o Projeto de Lei n° 82.924, que amplia em cinco anos a isenção de 75% do Imposto de Renda para as empresas instaladas em Manaus.
Esse será um novo desestímulo às fábricas já em operação ou mesmo para a atração de novos fabricantes.
É verdade que o Amazonas dormiu em berço esplêndido por mais de meio século, no confortável colchão dos incentivos fiscais, não fez o dever de casa, mas também é consenso que não se cria matrizes econômicas à altura da ZFM do dia para a noite.
E do que o Estado viverá nesse meio tempo, quem sabe nesse longo inverno que assombra no horizonte? – o Estado já vivenciou essa dura realidade com o fim do período de ouro da exploração da borracha.
Desde a criação da ZFM, em 1967, faltou um projeto de Estado, que estivesse acima dos governantes, porque potencialidades não faltam ao Amazonas: da indústria da pesca, turismo ou mesmo a mineração sustentável.
E estudos e tecnologias para a exploração de tantas oportunidades estão em prateleiras, aguardando que alguém sopre a poeira que se acumula sobre eles.
Também já se debateu muito, num passado recente, a criação de uma transoceânica Atlântico-Pacífico, por uma rota que inclui o Rio Amazonas e rodovias no Peru, mas a proposta para otimizar a logística no continente também não foi adiante.
E o que falar do Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA), que se mantém inerte diante da biodiversidade amazônica?
Independente do que faltou para que o Amazonas se fortalecesse como um ponto estratégico global, pela biodiversidade e demais riquezas que a natureza lhe deu, o momento exige união de forças, das lideranças políticas, empresariais, sociedade civil organizada para que a decadência econômica não leve o Estado ao que tantos outros da Amazônia brasileira já fazem, danosamente ao meio ambiente: desmatamento e mineração criminosos.
É por causa da economia baseada na indústria em Manaus, com suas fábricas sem chaminé, que 98% da floresta no Amazonas ainda está de pé.
*Jornalista – [email protected]
Foto: BNC AMAZONAS