Prêmios valorizam mestres da cultura popular

Premiação reconhece "dívida" com pessoas que se dedicam à realização e divulgação das culturas brasileiras

Wilson Nogueira, da Redação do BNC Amazonas

Publicado em: 21/10/2024 às 19:40 | Atualizado em: 21/10/2024 às 22:25

Lugarejo, vilas, cidades, terras indígenas, quilombos e quilombolas são lugares que, pelo fazer cultural de cada um, tornam o Brasil um país dinâmico e plural na sua formação sociocultural.

Por isso, a premiação de mestres e mestras dos saberes dos saberes e fazedores culturais nas artes, instituída pelo governo federal, por meio da Lei Paulo Gustavo (Lei 195/2022), reconhece a dívida que o país tem com pessoas que se dedicam, em sua maioria, a vida toda à realização e divulgação das culturas brasileiras.

No certame editado pelo Governo do Amazonas foram premiadas 96 pessoas de 16 dos 62 municípios.
https://cultura.am.gov.br/wp-content/uploads/2024/10/01.01.020701.000203_2024_44_Resultado_Final_do_Edital-ASSINADO.pdf

Recursos com a mesma finalidade estão disponíveis aos com acesso aos recursos da Política Nacional de Fomento à Cultura Aldir Blanc (Lei 14.399/2022), gerenciados pelo Ministério da Cultura.

Esse é o caso de Parintins, que lançou, na última segunda-feira (14), o edital do prêmio para mestres, mestras e fazedores de culturas populares e tradicionais, com premiação de R$ 15 mil para cada um dos dez selecionados.

Confira: https://files.parintins.am.gov.br/documents/104902.pdf

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Exemplos que vêm de Parintins

No Amazonas se destaca a festa do boi-bumbá de Parintins, apresentada por Caprichoso e Garantido, no final do mês de junho desde 1965.

Mas, embora sem visibilidade midiática, existem e persistem centenas de “brincadeiras” e festejos populares vinculados à religião, à ancestralidade, à economia etc.

No município também têm pastorinhas, pássaros, bois-bumbás das comunidades rurais, grupos teatrais e musicais, danças clássicas e de rua, contadores e histórias, cantores e cantoras, escritores e escritoras e daí por diante.

Sucede, não por acaso, que esses fazeres de cultura e arte, no seu conjunto, contribuem com os espetáculos do festival, sem que os seus mestres sejam reconhecidos publicamente.

Vale ressaltar, que esse é o cenário cultural do chamado “interior brasileiro”.

O mais cruel acontece com os idosos que já dedicaram a arte e a alegria ao “brinquedo” ou festejo do coração.

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Mestras e mestres ‘invisibilizados’

Esse é o caso da cantora de pastorinha Zenilda Carneiro de Souza, 77 anos, que também atuou, na juventude, em várias frentes artísticas para “botar” o boi Garantido no terreiro e nas ruas.

Ela fez indumentárias, adereços e fantasias no barracão no bumbá, na baixa da Xanda.

Zenilda também brinca pastorinha desde criança, atuando como várias personagens de cordão, como florista, anjo, pastora, borboleta e cigana.

Sua experiência a levou a participar da fundação do grupo Pastoral, juntamente com o músico e compositor Fred Góes, hoje presidente do bumbá Garantido, e do artista Fernando Sérgio (1965-2022), legendário criador dos capacetes de luxo.

Outra legenda da cultura parintinense é o poeta e escritor Raimundo Nonato de Jesus Dutra, 94 anos, um dos mais antigos brincantes do boi-bumbá Caprichoso.

Raimundinho Dutra, como é conhecido, é autor do livro A revelação histórica do festival parintinense, que apresenta, por meio da memória, o nascimento da brincadeira de boi-bumbá e dos pássaros juninos de Parintins.

Raimundinho começou a compor para o boi-bumbá Caprichoso aos 13 anos e nunca mais parou, embora suas toadas não sejam mais selecionadas para tocar na arena do bumbódromo.

No universo da memória viva do boi-bumbá, Raimundo Nonato da Silva Azevedo, 57 anos, o Rei Azevedo, anos, é mestre atuante na divulgação do festival, dos seus compositores e toadeiros por meio do grupo musical Azul e Branco, com mais de duas décadas de atuação.

Assumidamente regional, Azul e Branco é composto por percussionistas e cantores de toadas. É, por isso, celebrado expressão cultural imprescindível para a preservação e salvaguarda da história dos bois-bumbás parintinenses.

Fazedor de cavalinhos

Na festa do boi-bumbá, outro artista tradicional de relevo é Roberto Santos Silva, o Coronel, fazedor de cavalinhos do item vaqueirada, a trupe que dança em torno do bumbá.

A confecção de cavalinhos exige conhecimento artístico e experiência na escolha de materiais: madeira, talas, telas, panos e papéis.

Coronel está entre os primeiros fazedores de cavalinhos mais bem elaborados que os de antes do festival.

O artista confecciona o brinquedo e, também, faz as lanças dos cavaleiros, cujas pontas de cima também são admiráveis pela variedade de cores.

Atualmente, Coronel trabalha como agricultor, mais ainda faz cavalinhos e lanças por encomendas.

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Cunhã-poranga

As icônicas cunhãs-porangas também têm precursoras na história dos bois-bumbás de Parintins.

Uma delas é Geralda Maria Santos da Silva, que representou a beleza feminina no bumbá Garantido como Miss do Boi, item correspondente ao da cunhã-poranga de hoje.

Como vizinha do terreiro do Garantido, ela e sua mãe, a dona Raimunda Sampaio (falecida), acompanhou e participou desde o início da fase competitiva do boi-bumbá.

Dona Raimunda era daquelas mães que vigiavam os filhos nas andanças do boi-bumbá portando uma poronga enrodilhada na cabeça.

Quem são os mestres segundo o edital

São considerados mestres dos saberes e fazeres culturais nas artes as pessoas físicas reconhecidas por suas habilidades, conhecimentos e práticas relacionadas a expressões culturais tradicionais e que desempenham um papel fundamental na transmissão e salvaguarda desses saberes, cuja vida e obra foram dedicadas à proteção, promoção e desenvolvimento da cultura tradicional no estado do Amazonas.

Pode ser contemplado com o prêmio “Mestres e Mestras dos Saberes e Fazeres Culturais nas Artes” qualquer agente cultural pessoa física que preencha os requisitos do edital.

Fotos: Wilson Nogueira e Prefeitura de Parintins