Juarez Lima parece ter roteirizado própria morte
O artista do Esconde morreu na Áustria. O que, se pode dizer, uma morte internacional.

Neuton Corrêa, da Redação do BNC Amazonas
Publicado em: 23/11/2024 às 11:51 | Atualizado em: 23/11/2024 às 13:39
Era assim que ele pensava: tudo fora do previsível.
Assim ele se tornou a primeira expressão artística a romper o paradigma artístico do festival de Parintins, com o boi Caprichoso.
É o Juarez Lima que rompe com a idade da madeira e inaugura a idade dos metais, que vigora ainda hoje.
Até o início dos anos 80, as alegorias dos bois tinham suas estruturas confecções em madeira.
O artista, então, ousa nos ferros, nas soldas e espetaculariza ainda mais a arte parintinense.
A Romaria das Águas, que ele criou em Manaus para promover a festa religiosa de Parintins em honra à sua Nossa Senhora do Carmo, é outro marca da imprevisibilidade dele.
Nada de andor de padiola. Não! A santa que ele criou era do tamanho de sua fé: enorme. Era uma verdadeira alegoria montada em barcos e balsas.
Em 2020, ele me chamou para ajudá-lo no evento de julho.
Ali, senti que a romaria, rio abaixo, já era visto pelo Juarez como uma coisa acanhada.
O Juarez queria uma imagem ainda maior. E, ao invés de uma embarcação, ele queria fazer os mais de 300 quilômetros de viagem com uma esquadra.
Seu projeto previa um navio principal e outros auxiliares com a imprensa, turistas, romeiros, devotos e pagadores de promessas.
E mais: o Juarez pensava em usar a praia da Ponta Negra como ponto de partida, mas movimentada dias antes com exposições e palestras. Seria um arraial em um dos lugares mais frequentados de Manaus.
Ah, ia esquecendo: ele imaginava ver Roberto Carlos cantando em sua romaria.
Então, seu ato final não seria dentro da caixa, assim como não foi.
O artista do Esconde morreu na Áustria. O que, se pode dizer, uma morte internacional.
Antes, porém, ele fez arte para o show da cantora Joelma em Portugal, produziu um evento na Suíça e estava construindo uma cachoeira artificial, em formato de leopardo, para uma empresária austríaca.
Na terça-feira ele sofreu um fulminante AVC, foi socorrido na cidade onde estava e depois levado de helicóptero para um hospital universitário referência europeia em traumas neurológicos.
É evidente que a morte, na idade dele, 58 anos, é uma coisa imprevisível, mas, no sentido grego clássico, essa foi sua tragédia. No caso dele, não os deuses olímpicos, mas a deusa do Carmelo quis que fosse assim.
Ilustração Gilmal