Fim do trabalho infantil depende da sociedade, diz magistrada do TRT

Joicilene Freire cobra políticas públicas eficazes e engajamento social para enfrentar problema grave no Amazonas.

Wilson Nogueira, da Redação do BNC Amazonas

Publicado em: 23/06/2025 às 08:49 | Atualizado em: 23/06/2025 às 08:53

A desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (TRT-11) Joicilene Jerônimo Freire disse ao BNC Amazonas que a erradicação do trabalho infantil no país depende de políticas públicas eficazes, envolvimento da sociedade e da iniciativa privada.

O problema, no Amazonas, ainda é grave e se espalha em múltiplas direções do espectro social: desde coleta de dinheiro nos sinais de trânsito até a prostituição e tráfico de pessoas.

No estado do Amazonas, composto por 62 municípios, ao menos 286 mil crianças e adolescentes, entre cinco e 17 anos, de um total de 1.606.937, estão em situação de trabalho infantil, quando, em condição normal, deveriam estar na escola.

Dessas, ao menos 50 mil estão em Manaus.

A desembargadora participou, neste 18 de junho, da 2.º Marcha de Combate ao Trabalho Infantil, organizada pela Associação Beneficente O Pequeno Nazareno, com apoio de instituições da União, estado e município que atum nesta causa.

Junho é o mês da mobilização mundial das organizações governamentais e ongs contra o trabalho infantil.

Joicilente Freire é representante do TRT no comitê que recebe menores aprendizes pelo cumprimento da cota social ofertada às empresas.

“As empresas podem contribuir para a eliminação do trabalho infantil na medida que contratam aprendizes nos limites da cota estipulada por lei”, disse a desembargadora, referindo-se à lei da aprendizagem.

Ela defende que o poder público, com a colaboração da sociedade e família, precisa combater “essa chaga social”, porque o que leva as crianças e adolescentes ao trabalho infantil, por vezes, é a condição econômica desfavorecida, geradora de vulnerabilidade social.

“Temos que ficar de olho no problema e encontrar opções às famílias vulneráveis social e economicamente, oferecendo-lhes condições para protegerem suas crianças e adolescentes”, afirmou a desembargadora.

Entre essas condições estão, segundo ela, o fortalecimento do ensino escolar, inclusive com mais escolas de tempo integral, as quais oferecem, também, alimentação e atividades socioculturais nos dois turnos.

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Conduta firme

A procuradora do Ministério Público do TRT-11 Erika Masin Emediato também compreende que os números apontam que há muito trabalho a ser realizado para zerar o trabalho infantil no Amazonas.

“A erradicação dessa prática tão prejudicial às nossas crianças e aos nossos adolescentes depende de políticas públicas bem estruturadas, com uma rede de proteção equipada e apta a fornecer os serviços, entre os quais os de saúde e escolar, e criar empregos para os pais que estão fora do mercado de trabalho”.

Infância perdida

O fiscal do trabalho Emerson Costa lembra que toda criança que trabalha e deixa de brincar perde a infância, o futuro e fica prejudicada para o resto da vida.

“A proteção da criança garante, também, o futuro exitoso da sociedade”.

Para exemplificar que o problema é gravíssimo, Costa revela que os casos de crianças vulneráveis socialmente, adotadas por famílias de maior posse financeira, como se fossem da família, ainda hoje são frequentes.

Os pais “entregam” suas crianças a outra família sob a promessa de que elas terão tratamento digno e acesso à educação.

Mas, segundo Costa, a realidade se revela outra: geralmente acabam vítimas de trabalho análogo ao da escravidão.

Essa é uma prática que persiste na sociedade brasileira, mesmo depois de 137 anos da abolição oficial da escravidão no Brasil.

Costa destacou ainda que parte dos adolescentes de 16 e 17 anos com participação no trabalho infantil são exploradas no tráfico de drogas e no mundo da prostituição.

Zona leste

O diretor da ong O Pequeno Nazareno, Tommaso Lombardi, afirmou que o trabalho infantil em Manaus aparece, principalmente, nos sinais de trânsito, com a venda de balas, frutas, comidas etc.

Citando o IBGE, ele disse que ao menos 80% dessa população são da zona leste e mais concentrados no bairro Colônia Antônio Aleixo. O restante se espalha por atividades mais perigosas.

“Trabalhamos com acolhimento institucional desses adolescentes. Temos uma equipa técnica que contata com eles nas ruas e depois e visita suas famílias, para entender melhor cada caso e propor soluções disponíveis nos serviços e programas do poder público”.

Lombardi adverte, entretanto, que as iniciativas das ongs e das instituições do poder público também precisam do apoio da sociedade, que deve entender que o trabalho infantil é um problema que aflige a todos.

Fotos: Wilson Nogueira/ especial para o BNC Amazonas