Drauzio Varella lança livro sobre os desafios na Amazônia
Obra explora histórias, mitos e problemas sociais da região, com base em décadas de viagens do médico ao rio Negro.

Adrissia Pinheiro
Publicado em: 27/03/2025 às 15:58 | Atualizado em: 31/03/2025 às 15:33
Drauzio Varella visitou Belém anos atrás para gravar uma reportagem. Na ocasião, uma jovem o confrontou: “Vocês só vêm aqui para mostrar as coisas feias que temos”.
Essa fala marcou o médico, pois reforçou sua percepção sobre o descaso com a Amazônia. Consequentemente, esse olhar crítico permeia seu novo livro, “O Sentido das Águas”.
A obra foca no rio Negro, que nasce na Colômbia e percorre 2.200 km até se juntar ao Solimões, sendo, inclusive, um dos maiores rios do mundo.
Drauzio busca reduzir a distância entre os brasileiros e a floresta. Para isso, ele critica a visão simplista de preservação sem considerar as populações locais.
O médico evidencia as poucas alternativas disponíveis, como, por exemplo, o fato de que moradores desmatam para sobreviver. “Se você ou eu estivéssemos naquelas condições, com filhos para alimentar, nós também agiríamos dessa forma”.
O livro combate mitos, dentre eles, o da Amazônia vazia. “Veja o rio Negro. Há populações indígenas que vivem em pequenas comunidades espalhadas ao longo do rio, algumas mais no interior [da floresta], outras na beirada, nos igarapés.”
Outro equívoco é enxergar a floresta como um “tapete verde”.
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Desde 1992, ele viaja ao rio Negro com pesquisadores da Unip. Nessas expedições, reuniu histórias de moradores, como a parteira Elisabel, de Barcelos, no Amazonas.
Inicialmente, hesitou em transformar essas vivências em livro. Só em 2023 percebeu que tinha material suficiente para narrar a vida na região.
Diferente de suas obras sobre presídios, este livro exigiu mais estudo. Ele se aprofundou na história e ecologia da Amazônia para construir o relato.
Drauzio se inspirou em Alfred Wallace, naturalista britânico que pesquisou a fauna e flora do rio Negro no século 19.
As descrições no livro são vívidas. Ele detalha a floresta, os idiomas indígenas e as dificuldades enfrentadas por moradores do Alto Rio Negro.
Em São Gabriel da Cachoeira (AM), Dráuzio presenciou indígenas que viajam dias para sacar o Bolsa Família. Muitos perdem o dinheiro para comerciantes inescrupulosos.
“Pegam o cartão deles, com a senha, e lançam as despesas com o preço que querem. Aquela gente é ingênua, poucos indígenas conhecem a vida selvagem das cidades. E, assim, criam uma dívida permanente. Não é uma escravidão descarada, como no passado, mas é uma forma de escravidão.”
Assim como “Arrabalde”, de João Moreira Salles, “O sentido das águas” questiona visões estereotipadas da Amazônia e expõe sua beleza e fragilidade.
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Foto: reprodução/YouTube Uol