Aos 71 anos, líder fez ação que garante direito a voto de 496 saterés-mawés

Nadir teve apoio da DPE para duas novas seções eleitorais na terra indígena Andirá-Marau

Nadir Ferreira, líder indígena

Mariane Veiga, da Redação do BNC Amazonas

Publicado em: 06/10/2024 às 11:28 | Atualizado em: 06/10/2024 às 11:59

Nesta eleição de 6 de outubro de 2024, pelo menos 496 indígenas saterés-mawés da terra indígena Andirá-Marau vão votar em duas novas seções do município de Maués, no Amazonas, graças ao empenho da líder Nadir Ferreira, de 71 anos.

Desde o dia 5 de abril deste ano ela começou a “missão” de buscar assinaturas para um abaixo-assinado. Seu objetivo era que a Justiça eleitoral instalasse duas novas seções na comunidade Nossa Senhora de Nazaré, na terra indígena Andirá-Marau, na região do alto rio Marau, em Maués.

Graças à persistência da líder indígena, a uma luta de dois anos do povo sateré-mawé e a uma articulação conduzida pela Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM), neste domingo mais de 400 eleitores das comunidades das “cabeceiras” do igarapé do Miriti vão exercer sua cidadania e votar para prefeito e vereador do município.

Conforme a defensoria, anteriormente, a maior parte deles levava até um dia de viagem para votar na localidade mais próxima.

“Fomos até as comunidades Campo do Miriti, São Bonifácio, Novo Remanso, Dívino Espírito Santo, Novo União, Novo Unido, Marau Novo, Santo Anjo, Santo Antônio e outras. Percorremos as comunidades em busca de assinaturas na ata para que fosse implantada uma urna eletrônica aqui em Nossa Senhora do Nazaré”, disse Nadir, que é vice-tu’isa da comunidade (tu’isa significa cacique ou tuxaua na língua sateré).

Pelo menos 496 indígenas da terra indígena Andirá-Marau vão votar

A líder indígena, que não fala português, disse que a missão foi cumprida em uma voadeira com motor de 15 HP.

“Pegamos chuva, sol e passamos fome, se alimentando somente de saúva taiá [formiga] com chibé, mas em busca de um grande sonho, coletando as assinaturas dos parentes”.

Nadir disse que a instalação de urnas eletrônicas na comunidade era necessária, levando em consideração as dificuldades para votação no lugar mais próximo até então, a comunidade Vila Nova, que fica a quilômetros de distância.

“Agora me sinto muito feliz por ter conquistado uma luta em prol do meu povo. Agradeço à doutora Daniele [Fernandes, defensora pública de Maués] por ter dado esse apoio. Waku sese [saudação sateré)”.

As urnas eletrônicas foram instaladas em Nossa Senhora de Nazaré, que, no percurso fluvial, fica distante mais de 100 quilômetros da sede de Maués, ou de cinco a 12 horas de barco rio acima.

Para se ter ideia melhor da importância dessas urnas, os votos de 496 eleitores são suficientes para eleger um vereador em Maués. Em 2020, por exemplo, teve eleito com 432 votos.

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O defensor público-geral, Rafael Barbosa, disse ter ficado surpreso ao saber da coordenadora do polo de Maués da DPE, Daniele Fernandes, que a principal demanda das comunidades indígenas do alto Marau era eleitoral.

“Imagina ter que pegar um dia inteiro de barco para chegar a um local de votação. Então, possibilitar novas seções na comunidade é garantir a esse cidadão o direito de poder participar do processo eleitoral, de exercer os direitos políticos e de escolher quem é que vai lhe representar, que vai defender os seus direitos”.

Barbosa acrescentou:

“Não basta emitir o título, é preciso proporcionar que esse ato de votar não seja um martírio e, sim, um direito”.

Conforme a defensora Daniele Fernandes disse que levou mais de um ano de planejamento para a realização da ação desde quando foi procurada pelos indígenas.

“São quase dez horas de viagem de barco da sede de Maués até aqui em Nossa Senhora de Nazaré. Ainda há muitas outras comunidades, ainda mais longe”, disse.

Antes da ação, eleitor levava até um dia de viagem para votar na localidade mais próxima

Fotos: DPE/divulgação