Amazônia aprisionou centenas de famílias japonesas durante 2ª Guerra

Um desses campos, o de Tomé-Açu, único localizado na região amazônica, se diferenciou dos demais por aprisionar sobretudo imigrantes japoneses

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Publicado em: 31/08/2020 às 10:44 | Atualizado em: 01/09/2020 às 04:03

Quando o Brasil decidiu de que lado estava na Segunda Guerra Mundial e rompeu relações diplomáticas com os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), em 1942, uma parcela da população brasileira repentinamente passou a ser perseguida: imigrantes alemães, japoneses e italianos, e seus descendentes.

Em pouco tempo, grande parte deles foi enclausurada em 11 campos de concentração espalhados pelo país, cujo objetivo era, entre outros, evitar que os imigrantes agissem como agentes infiltrados para seus países de origem.

Um desses campos, o de Tomé-Açu, único localizado na região amazônica, se diferenciou dos demais por aprisionar sobretudo imigrantes japoneses.

Lá eles viviam sob regras rígidas, com racionamento de energia e toque de recolher, além de censura de correspondências e proibição de se agrupar.

Até o ano de 1942, a colônia japonesa que existia à beira do rio Acará, a 200 km de Belém, hoje município de Tomé-Açu, vivia basicamente do cultivo de hortaliças e arroz.

Os primeiros imigrantes chegaram em 1929, por meio da Companhia Nipônica de Plantação (Nantaku), que dispunha de terras na região.

Outro importante impulso para consolidação da comunidade foi a fundação, em 1935, da Cooperativa Agrícola do Acará.

Porém, o desenvolvimento da comunidade foi interrompido com a entrada do Brasil na guerra.

“O Brasil, muito pressionado pelas relações externas, fez ações de contenção dos ‘inimigos de guerra’, que eram os estrangeiros do Eixo – os alemães, italianos e japoneses”, explica Priscila Perazzo, professora e pesquisadora da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS) e autora de Prisioneiros da guerra: os “súditos do Eixo” nos campos de concentração brasileiros.

“Então, o governo decide montar campos onde pudesse internar pessoas desses países”.

Rodeada pela floresta amazônica e acessível somente por via fluvial, a comunidade japonesa que se formou em torno da Nantaku e da Cooperativa era uma candidata ideal para sediar um desses campos.

Em 17 de abril de 1942, os japoneses perderam o direito aos seus bens, por meio de uma declaração de caducidade, e a vila às margens do rio Acará foi isolada. Nascia o Campo de Concentração de Tomé-Açu.

 

Casarão que fazia parte do campo de concentração de Tomé-Açu

Boa parte das 49 famílias que viviam na região, à época, eram de agricultores, e tinham pouco conhecimento sobre os combates que ocorriam em sua terra natal. Mesmo assim, foram considerados “prisioneiros de guerra”, termo geralmente usado para militares apreendidos em combate, mas que, naquele momento, também foi usado para civis.

Os números são imprecisos, porém estima-se que, durante os seus três anos de existência do campo, cerca de 480 famílias de japoneses, 32 de alemães e alguns italianos foram parar ali.

Uma grande parte veio da capital Belém. É o caso da família de Elson Eguchi, de 79 anos. Seu pai, Yasuji, foi do Japão para o Peru, país com expressiva imigração japonesa. Mas foi no Brasil que ele se estabeleceu.

Com a guerra, Yasuji foi deslocado à força de Belém para Tomé-Açu. “Meu pai trabalhou como cozinheiro em Belém. O governo tirou ele de lá e o jogou aqui, em Tomé-Açu, como campo de concentração”, relata Elson.

Na capital paraense, a vida dos japoneses tampouco era fácil. “Em Belém, brasileiros saqueavam, queimavam as lojas, as casas dos japoneses. Muitos ficaram sem ter onde morar”, conta Hajime Yamada, de 94 anos.

Ela chegou à região do Acará em 1929, na primeira leva de imigrantes, quando tinha 2 anos. Desde então, vive em Tomé-Açu, e presenciou os anos de dificuldades.

Muitos japoneses também foram trazidos do Amazonas, inclusive de Manaus, a 1.317 km de Tomé-Açu. Os dirigentes da Companhia Industrial Amazonense foram levados ao campo, e a imprensa local passou a denominá-los de “quinta coluna”, termo utilizado, em contexto de guerra, para designar espiões, sabotadores e traidores a serviço de outro país.

Em 2011, a Assembleia Legislativa do Amazonas fez um pedido oficial de desculpas a imigrantes japoneses pelos abusos cometidos durante a Segunda Guerra.

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Foto: Divulgação/Ibama