Mentira no lugar de fake news
O uso da palavra fake news constrange pouco o seu autor ou seu divulgador

Neuton Correa, Aldenor Ferreira*
Publicado em: 24/06/2023 às 02:33 | Atualizado em: 24/06/2023 às 02:33
Hoje, falarei da importância de se utilizar a palavra “mentira” no lugar de fake news. Ao menos para mim, a utilização do termo em inglês não descreve com fidelidade e amplitude este fenômeno social em termos de Brasil.
Antes de prosseguir, é importante dizer que a Língua Portuguesa é, sem dúvida, muito versátil, inclusiva e democrática. Está entre as dez línguas mais faladas no mundo e, para mim, é a que melhor incorpora os neologismos, novas palavras e sentidos que a enriquecem e a tornam ainda mais dinâmica.
Todavia, há exagero por aqui, visto que a nossa língua possui um universo de palavras que muitas vezes traduzem e explicam muito melhor o fenômeno do que as palavras estrangeiras, mas que acabam sendo negligenciadas devido ao emprego excessivo do anglicismo.
É o caso da expressão fake news que, numa tradução literal, significa notícias falsas, podendo significar também desinformação ou boato.
Contudo, para o caso brasileiro, penso que a melhor palavra a ser empregada, para trazer melhor sentido ao que realmente ocorre com inúmeras notícias que são transmitidas por razões políticas ou para fins fraudulentos, seria a palavra “mentira”.
No Brasil, fundamentalmente nos campos da economia e da política, muitas vezes não se tem notícia alguma, no sentido estrito da palavra, o que se tem são mentiras diretas, grosseiras e descabidas.
E o mais preocupante, segundo o Coordenador Geral da Aliança Global em Mídia e Educação da Unesco, Alexandre Le Voci Sayad, é que as fake news espalham-se de forma rápida e contagiam como um vírus, fazendo com que o leitor assimile seu conteúdo sem confirmar sua veracidade.
O emprego do termo em inglês, de certa forma, cria um tom jornalístico e sério para algo que não tem absolutamente nada a ver com jornalismo, com notícias, naquilo que a semântica da palavra notícia exprime e, também, não é algo sério.
Por ter um tom jornalístico, o uso da palavra fake news constrange pouco o seu autor ou seu divulgador. A palavra “mentira”, por sua vez, tem poder de constrangimento muito maior, afinal, é uma condenação moral. Ou seja, ninguém gosta de ser chamado de mentiroso ou caluniador, aliás, calúnia é crime previsto no Art. 138 do Código Penal Brasileiro.
Neste sentido, se utilizássemos um vocábulo da nossa própria língua para chamar as coisas pelo que elas realmente são, teríamos maior êxito no constrangimento e até mesmo na criminalização daqueles que praticam tal ato, afinal, fake news ainda não é crime no país, mas calúnia, injúria e difamação já são.
Fake news não é notícia, nisto insisto, mas, sim, uma mentira. Ou seja, é a prática de levar desinformação ao público por meio de mentiras. Esta é a sua essência, a semântica correta a ser empregada. Neste sentido, se quisermos manter o tom jornalístico da expressão, então, que passemos a utilizar, no lugar do termo em inglês, o nosso belo português traduzindo e denominando como “notícias mentirosas”.
Estas notícias mentirosas fizeram o mal triunfar no Brasil. E, mesmo com a mudança política que ocorreu recentemente no governo federal, ainda vivemos e sentimos os efeitos colaterais deste triunfo.
Em nosso país, tal qual a parábola judaica da Verdade e da Mentira, o bem que está manifesto é, na verdade, o mal. De igual forma, a verdade que está posta é a mentira disfarçada. Portanto, é melhor usarmos “notícias mentirosas” no lugar de fake news.