Diário de uma quarentena | 44º dia, 3 de maio – Presidente desumano e perverso

"Ele poderia usar esse poder hipnotizador que tem para aliviar o sofrimento da população brasileira"

Neuton Correa, de Neuton Corrêa*

Publicado em: 03/05/2020 às 20:10 | Atualizado em: 03/05/2020 às 20:10

Hoje é domingo. São 17h10.

Com o novo coronavírus (Covid-19) já alastrado por 53 dos 62 municípios do Amazonas, o Estado dispara na contagem de novos casos da doença e bate recorde.

Aqueles 469 registros do dia 1º de maio, que pareciam absurdos, ficaram pequenos diante das novas 621 infecções anunciadas há pouco.

Até aqui, o Amazonas tem 6.683 casos confirmados, no total.

A fase mais aguda da pandemia, anunciada pelas autoridades para os 15 primeiros dias de maio, confirma-se e hoje pode ser o começo.

O boletim anunciou que o Amazonas conta agora 548 perdas para o vírus. Nas últimas 24 horas, foram anunciadas mais 47 mortes.

 

Ministro da saúde na cidade

O ministro da Saúde, Nelson Teich, está em Manaus.

É a primeira viagem dele desde que assumiu o cargo no último dia 17 de abril.

Para mim, sinaliza que a pasta trata o Amazonas e a capital amazonense como prioridades no enfrentamento da pandemia.

A agenda dele também mostra isso. Ele chegou hoje e só deve deixar o estado na terça-feira.

 

Presidente desumano 

Em mais um gesto de desprezo à vida, à dor dos que sofrem, sofreram e aos que morreram e morrem acometidos pela doença, o presidente da República apoiou novamente tudo aquilo que o seu governo, a OMS e a ciência recomendam para combater o vírus e preservar vidas.

O líder do país, que já disse “e daí?” quando abordado sobre os 5 mil mortos pela doença, hoje, dia que o Brasil registrou mais de 101 mil casos da doença e 7.025 mortes, ele apoiou aglomerações.

Às vezes, fico imaginando que ele poderia usar esse poder hipnotizador que tem para aliviar o sofrimento da população brasileira.

Se não fosse sua índole perversa diante dessa tragédia humana, a dor e a angústia que o país sofre pelo ataque do vírus não seriam assim como vivemos hoje.

 

Gripário

Eu desconhecia essa palavra até hoje.

Pelo menos, nessa pandemia, eu só ouvia falar de clínicas, leitos, UTIs, de enfermarias, hospitais.

Gripário? Até fui na internet. Não encontrei nos dicionários. Mas não é um termo novo, porém, restrito à área de saúde.

A princípio, soa como algo improvisado, desumano.

Mas já existe gripário no Amazonas.

Quem me contou foi o amigo José Inácio Miranda da Silva, o Juveco.

O Juveco foi um dos primeiros casos da Covid-19 registrados em Maraã, um dos lugares mais remotos do Estado.

Para lá, não há voos. Só se chega de lancha ou de barcos, em cinco dias de viagem, subindo o rio.

Meu amigo não estava bem ontem. Acompanhei ele até onde pude e ele respondeu até quando conseguiu, com febre e dores, em tratamento caseiro.

Hoje, assim que acordei, perguntei como foi sua noite. Ele respondeu que havia sido muito sofrida.

Recomendei que ele fosse para o hospital e ele respondeu:

“Aqui não estão internando ninguém no hospital. Fizeram um gripário, onde são feitos os exames para a Covid. Tem uma equipe médica que atende em domicilio”.

Despedi-me dele, dizendo que ele já havia superado a pior fase da doença e que logo, logo estaria bem.

 

*autor é jornalista e diretor-presidente do BNC Amazonas

Arte: Alex Fideles