Diário de uma quarentena | 39º dia, 28 de abril – Doutora Darci

Os três não são os únicos que podem ter contraído o vírus e tratado em casa mesmo, com chá de limão, alho e folha de jambu com a florzinha

Neuton Correa, de Neuton Corrêa*

Publicado em: 28/04/2020 às 18:59 | Atualizado em: 28/04/2020 às 18:59

Hoje é terça-feira. São 17h40.

Não aconteceu o que ontem imaginei que ocorreria desde então.

Os números de registros de casos de coronavírus (Covid-19) voltaram a crescer exponencialmente.

Ontem, foram contadas 95 novas infecções; hoje, 409; ontem, foram registrados 16 óbitos, hoje 31.

O Amazonas conta agora 4.337 casos da doença e 351 mortes.

Manaus, que tem o quarto maior número de mortos pelo vírus no País, já não dá mais conta de enterrar seus corpos.

Sepultamentos individuais não existem mais. Agora tudo é coletivo e a novidade são os enterros noturnos.

 

Pandemia no Brasil

O Brasil já tem 71.886 casos confirmados da doença. Isso faz com que o País seja o 11º mais contaminado do mundo.

Mas o que chamou a atenção hoje foi que o Brasil superou, em número de mortes, as perdas provocadas pelo novo coronavírus na China, origem da doença.

Com 474 mortos em 24 horas, o Brasil conta agora com 5.017 óbitos. A China registrou desde dezembro 4.637 perdas.

Em número de mortos, o país é agora o 9º com mais perdas no mundo, próximo do Irã, onde já morreram 5.877.

 

EUA não querem brasileiros

Os Estados Unidos, país com maior número de casos registrados de coronavírus, mais de 1 milhão (1.010.717), e de mortos, 58.365, quer restringir o acesso de brasileiros ao País.

Quem disse isso foi o presidente dos EUA, Donald Trump. Em declaração à mídia ele comentou que o Brasil registra “um grande surto” de coronavírus.

Os primeiros casos da doença aqui foram importados daquele país.

 

Doutora Darci

Antes do almoço o celular da Darci tocou:

“Oi, mano, como tu estais?”

Era um cumprimento amplo, genérico. Até ali não dava para saber com quem ela falava.

Ainda preservamos os cumprimentos do interior, onde as pessoas se chamam de “parente” ou “mano”.

Me apressei para saber com quem era a conversa, mas só ouvia:

“Hã! Hã! Tá! Tá! Hã! Hã! Tá! Tá!”.

Depois começou a falar.

“Mas tu tá bem?”, perguntou para logo em seguida soltar outra sequência de interjeições, dessa vez de surpresa:

“Ô! Ô! Ah! Ah! Ahhhhh!”.

Depois, quis saber:

“Já foi na drogaria?”.

Ouviu alguma coisa e perguntou outra vez:

“Já procurou aqui por perto de casa?”

E disse, na sequência:

“É, mano, esses remédios não estão fáceis de encontrar nessa pandemia”.

E começou a receitar:

“Olha! Toma mastruz com leite e mistura com limão, que é vitamina C”.

Prosseguiu:

“Fica uns dez minutos no Sol, de manhã, que vai ajudar teu organismo a produzir vitamina D”.

Ela fez mais uma pausa e comentou:

“Tá caro mesmo, mano. O Neuton comprou aqui por perto de R$ 5,90”.

Era o quilo do limão que eu havia comprado mais cedo.

Depois a Darci soltou uma frase, dessa vez tranquilizadora:

“Ah, que bom!”, falou apontando para o final da conversa, quando descobri com quem ela estava falando:

“E a Marilza e o Darlan?”, indagou, prosseguindo:

“Que bom! Graças a Deus!”, disse, despedindo-se:

“Tá bom, mano! Te cuida. Faz isso que te falei”.

Ouvi a conversa atentamente, imaginando a realidade de como muitos brasileiros estão se tratando do coronavírus na periferia.

A Darci, minha esposa, para os que não leram os capítulos anteriores nos quais falei sobre irmão, conversava com o Panta, irmão dela.

O Panta está acometido de coronavírus, foi orientado a ficar e se tratar em casa. E só.

Há alguns dias ele conta que tem passado mal à noite, com falta de ar, mas está superando a doença.

A Marilza é mãe dos irmãos dela. O Darlan também é irmão e estagiava num pronto-socorro da cidade, onde pode ter contraído a doença.

Os três não são os únicos que podem ter contraído o vírus e tratado em casa mesmo, com chá de limão, alho e folha de jambu com a florzinha.

Uma criancinha da casa, no mesmo período, teve febre, mas já está bem.

 

*autor é jornalista e diretor-presidente do BNC Amazonas

Arte: Alex Fideles