Assim caminha a Humanidade

Ferreira Gabriel, Por Lúcio Carril*
Publicado em: 10/04/2020 às 10:08 | Atualizado em: 10/04/2020 às 10:08
No canto escuro da casa um homem chora, uma mulher chora. Um lamento se projeta para além da porta de saída; só o lamento.
Já não é possível sair. Lá fora um inimigo à espreita, invisível, ávido por uma célula para se hospedar.
O mundo do homem e da mulher já não é azul e o cinza dá o tom fúnebre do seu enclausuramento.
Quisera o homem e a mulher olharem seu mundo como se olha aquela sala cinza. O mundo que agoniza não é visto, apenas sofre com a insurgência destruidora do vírus homem, do vírus mulher.
O planeta azul está ficando cinza, como o canto escuro onde se passa o medo do que há lá fora. O inimigo é visível, está aí, e não chora nem lamenta; só destrói, como o vírus que sufoca a respiração.
A poluição, o monóxido de carbono, os gases letais corroem pulmões todos os dias, numa ação virulenta dos que se hospedam no planeta que vira cinza.
O inimigo está na sala escura, acuado pelo medo da morte que o espreita, como se a morte não o espreitasse todos os dias. Um vírus com medo do vírus. Um singelo sorriso sai no canto da minha boca.
Lanço meu clamor por quem chora e meu lamento por quem sofre: um homem, uma mulher, um planeta.
A agonia vive lá fora.
Na parte externa do meu mundo a destruição toma conta dos meus dias. Um cheiro de enxofre é sentido, mas não é o inferno, é apenas a chaminé da fábrica onde homens e mulheres viram fumaça.
O ar é quente e o fogo consome a floresta para o gado pastar e a soja plantar.
Homens e mulheres viram capital e o planeta continua a morrer sufocado pela ignorância de muitos e pela ganância de poucos.
Um vírus está a nos matar.
No morumbi, uma champanhe Dom Perignon é tomada em taças de fino cristal.
Em São Conrado, um vinho romaneé-conti é consumido com caviar do Irã.
Na ponta negra, cédulas do dinheiro público ornamentam as varandas gourmets.
Nas favelas, morros e bairros operários a vida segue com o vírus da fome e da desigualdade a consumir homens e mulheres.
Do lado de fora, destruindo vidas e o planeta a indiferença dos que se regozijam com a miséria social.
Em poucos meses tudo voltará ao normal e o mundo continuará convivendo com a devastação da floresta amazônica, com a poluição dos rios, com 700 milhões de famintos, com crianças morrendo de desnutrição, com idosos jogados nas ruas, com o roubo dos pastores evangélicos, com a hipocrisia de cristãos sem Cristo.
O mundo não mudará. O mundo que está aí continuará cinza. Não há esperança para o desencanto. Não há vida na exploração do homem pelo homem. O capitalismo destruidor continuará matando, destruindo, e homens e mulheres, mergulhados nas suas próprias maldades persistirão no seu caminho rumo ao abismo.
O *autor é sociólogo e comunista
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