A casa destruída

Me compadeço das milhares de famílias que perderam suas casas e de outras tantas que ainda tiveram o sofrimento agravado pela perda de entes familiares

Ferreira Gabriel, por Lúcio Carril*

Publicado em: 12/09/2023 às 12:47 | Atualizado em: 12/09/2023 às 12:47

Tenho acompanhado os desastres naturais e suas terríveis consequências em Marrocos, país do norte da África, e no sul do Brasil, no estado do Rio Grande do Sul, onde um ciclone extratropical destruiu cidades inteiras.

Me compadeço das milhares de famílias que perderam suas casas e de outras tantas que ainda tiveram o sofrimento agravado pela perda de entes familiares. Duas tragédias que afetam profundamente a vida de muita gente.

Vi e continuo vendo nas matérias jornalísticas o lamento de quem perdeu sua casa e tudo que nela havia de bens materiais, desde o mais ínfimo objeto aos eletrodomésticos que foram comprados com muita economia e aperreio financeiro.

A casa construída tijolo por tijolo, cerâmica por cerâmica, telha por telha, o jardim cultivado com muito amor e esmero, os móveis comprados ou encomendados na oficina do marceneiro do bairro, tudo agora destruído. Tudo virou pedra, entulho, lama, sonho que se foi na terra que tremeu e no rio que transbordou.

A casa é o museu da família. Por anos e décadas, cada objeto tem sua história. Aquele armarinho da sala, o quadro com o retrato da família, o sapato comprado na promoção, o faqueiro adquirido numa feira de objetos usados, todos carregam um certo carinho, porque adquiriram vida ao ter uma história.

Quando tudo é destruído, da casa aos objetos, aquele museu que contava a história da sua família, como ela foi se erguendo e se confortando, também vai embora, ficando somente a memória daquilo que se foi. A memória ninguém destrói, mas não será mais motivada por aquele objeto que fazia lembrar um momento da vida.

A casa foi destruída. Não foi perdida somente a guarida. A história construída por décadas pela família já não tem sua prova material, sua lembrança não será mais projetada naquelas pequenas coisas. O sofrimento é grande. A perda foi total. Foi uma tragédia social e cultural.

*O autor é sociólogo