Diário de uma quarentena | 55º dia, 14 de maio – Olha o remédio para coronavírus!

"Desejei-lhe sorte na venda e a mulher seguiu seu trabalho, oferecendo aquilo que o mundo mais procura"

Neuton Correa, de Neuton Corrêa*

Publicado em: 14/05/2020 às 19:52 | Atualizado em: 14/05/2020 às 21:02

Hoje é quinta-feira. São 18h01.

A cidade do Amazonas mais distante da capital entrou na contagem do novo coronavírus (Covid-19).

A quase 1,5 mil quilômetros de Manaus, Guajará, na divisa com o Acre, já entrou na soma dos dados com oito casos.

Agora, apenas três municípios, dos 62 que formam o Amazonas, ainda não entraram nas estatísticas da pandemia.

Na segunda semana que pode ser o pico de contaminação do vírus no Estado, hoje foram registrados 1.365 novos casos confirmados e o Amazonas já conta 17.181 infecções.

Foram contadas mais 75 mortes, 45 só nas últimas 24 horas, informaram as autoridades de saúde.

Com isso, o Estado chega a 1.235 mortos em menos de dois meses por causa da doença.

Para se ter ideia de como o coronavírus está sendo devastador, no Amazonas, o Chile, até aqui, registrou apenas 368 perdas. A Argentina tem 6.879 casos confirmados e 344 mortos.

 

O vírus no país

O Brasil ultrapassou a marca de 200 mil infectados. Ao todo, o número de casos confirmados está em 202.918.

Houve acréscimo de 844 óbitos nas últimas 24 horas, número recorde. Com isso, o País já tem hoje quase 14 mil mortos na pandemia pela doença, 13.944 perdas, ao todo.

O presidente da República segue preocupado com a morte das empresas e indiferente aos cidadãos que morreram ou sofrem com a doença.

Hoje ele atacou o governador de São Paulo e o prefeito de Manaus, que defendem o isolamento social como contenção à propagação do vírus.

 

Olha o remédio para coronavírus!

Já a distância, não parecia mais um daqueles vendedores que sempre passam por aqui.

Mas era um anúncio de venda porta a porta.

Esperei aqui de minha mesa para ouvir a novidade.

Isso foi por volta das 11h, mas não eram os dois peixeiros que costumam rondar por aqui nesse horário.

Eles se diferenciam pelo transporte que usam, pelos peixes que oferecem e pelo jargão que usam.

O vendedor do carrinho de mão solta o vozeirão, quase que soletrando, na quadra 95, e no fim da rua Pintassilgo, na quadra 99, já se ouve:

“Peixeiro! Peixeiro! Peixeiro!” E, assim, vai, oferecendo pirarucu e tambaqui.

O da Kombi velha chega com seus peixes trazidos pelo barulho do motor do carro e do alto falante, dizendo:

“Jaraqui, pacu, curimatá! É só fazer parada! Jaraqui, pacu, curimatá! É só fazer parada” E assim vai.

Não era nenhum nem outro.

Era uma voz feminina, que parecia vir muito acelerada.

Quando se aproximou de casa, entendi que estava vendendo remédio. A última palavra do anúncio, porém, ainda não estava clara para mim.

Por causa disso, resolvi sair de minha mesa e fui perto da rua para ter certeza da suspeita que tinha.

Nesse momento, quando me viu na frente de casa, ela repetiu:

“Olha o remédio caseiro para coronavírus! Remédio para coronavírus tem aqui!” E me perguntou:

“Remédio pra coronavírus, patrão, vai?”

Sorri pra ela, dizendo que minha esposa está produzindo em casa também. Desejei-lhe sorte na venda e a mulher seguiu seu trabalho, oferecendo aquilo que o mundo mais procura.

Diário de uma quarentena | 53º dia, 12 de maio – Garrafada

 

 

*autor é jornalista e diretor-presidente do BNC Amazonas

Arte: Alex Fideles