Diário de uma quarentena | 52º dia, 11 de maio – Contagem regressiva
A oito dias de minha quarentena completar dois meses, percebo rotinas voltando ao normal

Neuton Correa, de Neuton Corrêa*
Publicado em: 11/05/2020 às 20:58 | Atualizado em: 11/05/2020 às 21:53
Hoje é segunda-feira. São 18h21.
Pela primeira vez em 52 dias, faço anotações nesse diário com esperança. Digo-lhes que agora abro até um sorriso de satisfação, mas ainda contido.
O que me faz ficar assim são os números anunciados há pouco.
Sim, porque, depois dos assustadores dados de sábado: 1.198 novos casos e 88 mortes em 24 horas, hoje foi diferente, bem diferente.
De ontem para hoje, baixando ainda mais os 674 casos e as 42 mortes do domingo, nesta segunda-feira, o Amazonas contou “apenas” 320 novos casos e 31 óbitos.
Esse movimento de subida e descida sempre ocorreu nessa pandemia. O último foi na semana passada, entre quarta e sexta-feira, dia 8.
Mas hoje, sinceramente, acho que a onda perdeu força.
Ainda assim os números gerais de casos e mortes são altos no Estado: 12.919 casos e 1.035 perdas para o novo coronavírus (Covid-19).
Brasil, ameaça regional
O Brasil registrou 396 óbitos e 5.632 casos confirmados nas últimas 24 horas. O País agora chega a 11.519 mortes confirmadas e 168.331 diagnósticos positivos da doença.
Países da América do Sul, como Paraguai, Uruguai e Argentina, que adotaram severas medidas de isolamento social para conter o avanço da Covid-19, consideram o Brasil uma ameaça à região.
Contagem regressiva
A sinfonia da passarada que se ouvia no começo deste diário perde espaço no ar para o ronco desesperado dos veículos que voltaram a circular freneticamente hoje.
O silêncio que de longe trazia para os meus ouvidos o barulho distante de motos barulhentas já está dispersado por ruídos diversos.
Os passos na rua que eu conseguia ouvir de minha mesa, chegando perto de casa, passando e sumindo numa frequência crescente e decrescente do som já não são possíveis acompanhar.
Também já não ouço mais a seresta de fim de tarde do vizinho Pantoja.
Ele até cantou ontem canções do Dia das Mães, mas os carros, os ônibus, os passos e as motos sufocaram sua voz. Ela já não atravessa mais livremente a rua Pintassilgo.
A oito dias de minha quarentena completar dois meses, percebo rotinas voltando ao normal.
Não creio que a doença tenha perdido sua fúria assassina. Da mesma forma, ainda vejo a humanidade incapaz de domá-la.
O susto do contágio e a dor das perdas parecem naturalizados.
Parece, mais uma vez, que as pessoas começam a se adaptar ao novo meio. Ou, quem sabe, o meio começou a adaptá-las a si.
Mas, não é possível dizer que tudo volta como antes. Não!
Vejo pessoas desconfiadas uma das outras, ainda mais.
A nova sociedade que ressurgirá do vírus ainda precisará ser compreendida melhor.
Enfim, espero que os números de hoje do novo coronavírus no Amazonas e o comportamento das pessoas sejam um sinal de que estamos em contagem regressiva para sair da crise.
*O autor é jornalista e diretor-presidente do BNC Amazonas
Arte: Alex Fideles