Diário de uma quarentena | 48º dia, 7 de maio – Fogos para a cura
Manacapuru, Parintins, Tabatinga e Coari mostram muito bem o alastramento da Covid-19 para essas regiões, onde a principal UTI será a sorte

Neuton Correa, de Neuton Corrêa*
Publicado em: 07/05/2020 às 20:20 | Atualizado em: 07/05/2020 às 20:24
Hoje é quinta-feira. São 19h32.
Venho observando, com atenção, há alguns dias o avanço dos números de casos e mortes no interior do Amazonas pelo novo coronavírus (Covid-19).
É preciso acender o sinal de alerta sobre isso.
Dos 61 municípios, 53 estão infectados. Juntos, eles já respondem por 41,61% dos casos confirmados.
O problema é que o interior, historicamente, nunca teve estrutura médica para socorrer pacientes de alta complexidade.
Para se ter uma ideia, de ontem para hoje, só no interior, foram registrados 433 casos confirmados da doença.
O número foi maior do que o de Manaus, que registrou 423.
Manacapuru, Parintins, Tabatinga e Coari mostram muito bem o alastramento da Covid-19 para essas regiões, onde a principal UTI será a sorte.
Manacapuru, por exemplo, ontem, tinha 630 casos, com 41 óbitos; hoje, são 700 casos e 42 perdas.
Parintins, ontem, tinha 311 casos e 21 óbitos; hoje, 324, com 24 óbitos.
Tabatinga, ontem, tinha 266 casos, com 12 óbitos; hoje 292, com 18 mortes.
Coari tinha 161 casos ontem e 23 mortos; hoje, 182 casos e 26 mortos.
No total, o Estado do Amazonas tem agora 10.099 casos confirmados e 806 mortos.
A boa notícia é que o número de recuperados saltou de 2.286 para 6.159, hoje.
Apego ao mercado, desprezo à vida
No cenário nacional, o presidente da República, que ainda não fez nenhum gesto pessoal de condolência aos quase 10 mil mortos pela pandemia nem de solidariedade aos sofrem com a doença, fez uma forte ação nesta quinta-feira, mas não para ajudar a amenizar a crise sanitária pela qual passa o país.
Bolsonaro foi ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) alertar que a economia está prestes a morrer.
O ministro presidente pediu que ele apresentasse a solução. O presidente não tinha.
Fogos para a cura
Tornou-se fato nesta pandemia comemorar a vida ou nova chance de viver.
A representação dessa festa, até aqui conhecida, aparece em imagens de corredores humanos formados por profissionais de saúde para se despedir de pacientes que deixam os hospitais, curados.
Mas, fora dali, há uma festa que aos poucos está se popularizando em Manaus.
São saudações com fogos e, em alguns casos, verdadeiras pirotecnias. Vi uma dessas na terça-feira passada.
“Antes, foguetes aqui eram sinais do tráfico. Agora é de gente retornando pra casa, curada de coronavírus”, disse-me um comerciante da Compensa.
Eu já havia me perguntado por perto de casa a razão de alguns fogos sem motivos aparentes.
Não eram os do terreiro da Mãe Emília, minha vizinha.
Os fogos da umbanda são fáceis de identificar. Eles geralmente coincidem com festas de santos da Igreja Católica e de datas do calendário nacional ligado à causa negra.
“Deve ser gente curada de coronavírus”, intuiu minha esposa em certa ocasião.
Mas, na terça-feira, a pirotecnia não deixava dúvida.
Era um grupo de pessoas, jovens, adultos, crianças, amparando uma senhora que chegava ali em um carro.
Enquanto se comoviam com aquele retorno, outros dois rapazes, incessantemente, soltavam fogos de artifício para comemorar o final feliz daquela história da doença.
*O autor é jornalista e diretor-presidente do BNC Amazonas
Arte: Alex Fideles