Diário de uma quarentena | 13º dia, 2 de abril – Canela de velho

A um dia de completar duas semanas, o Diário de uma quarentena registra o estresse do confinamento

Neuton Correa,

De Neuton Corrêa*

Publicado em: 02/04/2020 às 18:52 | Atualizado em: 02/04/2020 às 18:52

Hoje é quinta-feira. São 16h20

O Amazonas diagnosticou nas últimas 24 horas mais 29 casos de coronavírus, elevando a 229 registros.

Hoje a contagem trouxe dados preocupantes.

Primeiro porque o número de pessoas suspeitas de estarem acometidas da doença é muito superior aos dos diagnosticados.

São 350 exames à espera de resultado.

Outro fato é o avanço do vírus nos municípios da fronteira, onde está a maior população indígena do mundo.

Depois de Santo Antônio do Içá, com quatro casos, agora é Tonantins, que já apareceu com três registros confirmados.

Penso na baixa imunidade que essas pessoas têm a doenças dessa civilização do coronavírus.

 

Primeiro milhão de doentes

São 16h31

Neste momento, o mundo ultrapassa a marca de 1 milhão de casos confirmados da doença.

São 1.002.159 em todos os continentes. Mais de 50 mil já morreram: 51.485 (às 16h45).

Os EUA são, disparados, o país com maior número de pessoas infectadas: 236.339.

Mas, lá, o governo está botando para examinar seus cidadãos.

Em 24 horas, por exemplo, as autoridades encontraram 27.268 pessoas com o vírus.

Pelo menos 5.648 morreram do coronavírus até aqui.

O Brasil, ao contrário, tem poucos registros, comparados aos da América do Norte.

São apenas 7.910 diagnósticos. Mas aqui não tem exames em larga escala como ocorre nos EUA.

O número de mortos aumentou muito de ontem para hoje.

Chegou a 229 vítimas, sendo 58 óbitos nas últimas 24 horas.

 

Esperança

O ambiente político nacional se acalma.

O presidente parece ter evitado novas polêmicas, hoje.

Mas foi cobrado pelos governadores, que querem socorro econômico da União.

Com notícias pulverizadas, a mídia nacional mira em duas vacinas: uma dos EUA, testada em roedores, e outra de Israel, em fase final, que deverá ser testada em seres humanos em junho.

 

Hora de proteger também dos fungos

Minha ida diária à sede do BNC AMAZONAS me causou tristeza.

Tenho ido todos os dias lá.

Mas, ali, hoje notei um ambiente de abandono, que não sei quanto tempo vai durar.

Todos os computadores da redação continuam desligados, com monitores inclinados como se também estivessem tristes com o silêncio que tomou conta do ambiente.

A sala de operações é o que ainda está em atividade.

Mas o estúdio só abre para receber a luz da redação, quando venho escrever por aqui.

Ontem, pedi que o Segundinho guardasse as máquinas fotográficas.

Hoje, vou pedir que proteja as filmadoras do estúdio. Paradas, sem funcionar, servem para abrigos de fungos.

Há duas semanas, quando pedi que toda a equipe do site passasse a trabalhar de casa, achei que não ficaríamos mais de um mês.

Estou convencido de que o tempo precisará ser bem maior.

 

Canela de velho

Desde ontem, me sinto cansado, estressado, de ficar em casa.

Escrever, escrever e comer é o que tenho feito com mais frequência.

Tudo começa a me incomodar.

Até o barulho da moto, que agora acelera, mas parece não sair daqui. Isso já me agonia.

Nem o Cacique News (leia o segundo capítulo: “Meu violão, minha angústia”) consegue mais me distrair como no começo desta quarentena.

Porém, o incômodo não é só na cabeça.

Eu sinto no corpo: no meu peito, uma marca vermelha se ressalta, quando a agitação é grande, e descansa, quando tudo se acalma; o ombro dói e nada me faz manter a concentração.

Ainda mais com essa moto aqui por perto, que não para de berrar.

Depois do almoço, falei pra Darci:

“Vou descansar. Estou me sentindo estressado”.

Mas, antes de eu completar meu pensamento, ela falou:

“Eu tenho remédio muito bom pra isso”.

“O quê?”, respondi.

Ela, então, saiu da cama e foi na direção do guarda-roupa, me mostrando e dizendo:

“Canela de velho é muito bom pra estresse”.

Então, repliquei rindo:

“Tens certeza que esse é o remédio”.

 

*O autor é jornalista e diretor-presidente do BNC Amazonas

Foto: do autor