A recolonização da Amazônia – Parte II | A miséria alheia

Aguinaldo Rodrigues
Publicado em: 08/10/2019 às 21:40 | Atualizado em: 15/02/2020 às 12:57
Por Thomaz Antonio Barbosa*
“A Amazônia está em uma encruzilhada geopolítica criminosa, protagonizada por organizações não governamentais, governos europeus, entidades religiosas e em meio a um governo desorganizado”
Desde a década de 1970 que a Amazônia vem experimentando um processo desordenado de perca de grandes faixas de seu território para entidades internacionais. A situação se agrava por meio de saques das riquezas naturais, dos recursos minerais, pela descaracterização cultural e modo de sobrevivência das populações originárias que se veem obrigadas a incorporar um discurso ambientalista que preserva o domínio dos países ricos e acentua a miséria dos mais pobres. Diante da ausência efetiva do Estado, é o terceiro setor quem dita o tamanho e o ritmo do crescimento da tribo.
Cerca de 15.900 ongs atuam na Amazônia tutelando o caboclo, ensinando o índio a ser índio, se apropriando dos recursos dos fundos internacionais por meio de um sistema de troca baseado em recompensas, onde o amazônida abre mão de suas riquezas em favor de um bem ou serviço, tipo uma escola de madeira a pique, com latrina e poço artesiano. Todavia, o volume de dinheiro dispensado é enorme em uma relação custo x benefício desfavorável para o nativo.
Para exemplificar, uma missão evangélica que atua no campo da saúde indígena, com maior participação em Roraima, recebeu a bagatela de mais de 2 bilhões de reais como repasse do governo federal ao longo de cinco anos. Aproveitando o ensejo, segundo levantamento produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2016, do total de entidades com atuação na Amazônia, a maioria esmagadora de 35,94% tem caráter religioso, enquanto somente 3,25% são dedicadas ao meio ambiente, respondendo pela minoria encolhida.
Não se trata de demonizar as entidades não governamentais, tão pouco negar o fundado valor do setor, porém há um excessivo uso dessa prerrogativa e com ela o camuflado interesse de grupos, de governos, de entidades nacionais e internacionais em se apropriar também de uma fatia das riquezas naturais. Fatalmente, há que se separar o joio do trigo. Quem fará isso?
O que se percebe é que não há impedimentos ou regras de regulamentação, e a recolonização da Amazônia avança sob a plataforma de um discurso protecionista baseado na preservação ambiental, no resgate da cultura e da identidade do homem amazônico em detrimento à sua subordinação e redução à condição infame de mero coletor de favas ou produtor de miçangas, situação vivida antes do Diretório do Índio, de Francisco Xavier de Mendonça Furtado.
De concreto é que, sem a presença efetiva do Estado e o acentuado déficit de soberania, sem políticas de governo que envolva o homem, a natureza e a economia de uma forma equilibrada, a Amazônia está em uma encruzilhada geopolítica criminosa, protagonizada por organizações não governamentais, governos europeus, entidades religiosas e em meio a um governo desorganizado.
Nesse cenário, o que está em jogo não é o futuro da região, tão pouco das populações, como tem se propagado por aí, mas a ocupação e exploração sistemática do território, a manutenção do poder e do interesse de pessoas e grupos, em detrimento à miséria latente que se abateu sobre a região desde a era dos descobrimentos, das invasões estrangeiras, das missões religiosas e das tropas de resgates.
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Fotomontagem com imagens da EBC e reproduzida do blogspot Imersão Latina