Novo vocabulário no festival de Parintins
Bumbás atualizam termos e discursos em sintonia com lutas sociais contemporâneas.

Dassuem Nogueira e Juliana Oliveira, da Redação do BNC Amazonas em Parintins
Publicado em: 24/06/2025 às 16:57 | Atualizado em: 24/06/2025 às 16:57
No Festival Folclórico de Parintins, nota-se que há um processo de repensar e atualizar termos, que se alinham a perspectivas sociais contemporâneas.
O movimento conta a história do boi-bumbá na sociedade parintinense em relação ao Brasil e ao mundo, e tem conformado um novo vocabulário para o festival.
Uma significativa mudança é a substituição de termos pejorativos relacionados aos povos indígenas, provocada pela crescente aproximação entre os bois de Parintins e o movimento indígena brasileiro.
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Item 13: povos indígenas
A ideia de “tribo” carrega uma conotação negativa de atraso e selvageria atribuída aos povos indígenas por colonizadores durante o período da invasão nas Américas.
No festival, o item 13, antes chamado de “tribos indígenas” foi alterado para “povos indígenas” no regulamento da competição desde 2023.
Nos discursos de arena, “tribo” tem sido substituído por “povos indígenas” e “povos originários” – marcando a incorporação de um vocabulário do movimento indígena atual por parte do boi-bumbá.
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O índio chorou
Quando Cristóvão Colombo chegou ao Brasil em 1492, ele pensava ter chegado às Índias orientais e, assim, chamou as pessoas que estavam aqui de “índios”.
Além de ser um erro, o termo foi utilizado ao longo da história de modo pejorativo. Por isso, hoje é combatido pelo movimento indígena brasileiro.
Os bois-bumbás de Parintins têm substituído o termo. Por exemplo, na toada “Índios do Brasil” (Geandro Pantoja e Demétrios Haidos, 2004), o verso que antes era “canta índio do Brasil” tem sido substituído por “canta povos do Brasil”.
Novos discursos
Notam-se ainda atualizações de narrativas coloniais ultrapassadas em belíssimas toadas.
O que pode ser observado em uma que está eternizada na voz de Arlindo Júnior, falecido levantador de toadas do Caprichoso, e que é a cara do pavilhão.
Ao invés de “Aos que foram donos das terras, antigos donos das penas”, a agremiação adotou “Aos que são os donos das terras, aos que são os donos das penas”.
A toada “Réquiem, prece aos espíritos” (Ronaldo Barbosa, 1996) foi regravada neste ano na voz de Patrick Araújo, onde constam tais atualizações.
A toada “Lamento de raça” (Emerson Maia, 1996) ainda não encontrou substituição para o verso de abertura “o índio chorou”.
E talvez assim permaneça como retrato de um tempo do boi-bumbá que está em vias de ficar para trás.
Fotomontagem: BNC amazonas