Nádia Vettori faz livro-memória de ações sociopolíticas com Guidotti na Amazônia
“Além…percursos de esperanças” relembra experiências da Missão Pistóia e ações sociais em comunidades esquecidas.

Wilson Nogueira, da Redação do BNC Amazonas
Publicado em: 30/04/2025 às 13:46 | Atualizado em: 30/04/2025 às 13:46
A missionária católica Nádia Vettori lançou neste dia 29 de abril, no auditório da Maromba, em Manaus, o livro “Além…percursos de esperanças” com registros de memórias das pessoas que participaram das atividades religiosas e sociopolíticas da Missão Pistóia e igrejas do Amazonas e do Maranhão.
A Missão Pistóia foi fundada na diocese de Pistóia (Itália), inspirada nos documentos do Concílio Vaticano II (1962-1965), realizado no papado de João XXIII.
A instituição une igrejas-irmãs em lugares onde as pessoas, além da palavra de Deus, precisam de apoio moral, intelectual, material e solidariedade para sair da condição de miséria, injustiça e opressão do poder político-econômico.
Padre Humberto Guidotti (1930-2015) e Nádia Vettori, enviados de Pistóia, trabalharam nos municípios de Manaus e Iranduba, no Amazonas, e de Balsas, no Maranhão, com ações de formação religiosa, conscientização cidadã e formação político-econômica, para que as próprias comunidades se libertassem dos seus opressores.
Essas e outras cidades da Amazônia até hoje possuem sérios problemas gerados pela ausência do poder público nas áreas periféricas, como inacessibilidade à alimentação adequada, à escola, à segurança e aos sistemas de justiça e político.
Guidotti, o pioneiro, missionou no município amazonense de Iranduba, no antigo distrito de Cacau Pirera e em Paricatuba, esta comunidade de pacientes de hanseníase; depois foi para Manaus, onde ajudou a fundar o Centro de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH/CNBB), se tornando seu coordenador.
No Amazonas, padre Guidotti também ficou conhecido nas décadas de 90 e 10 (deste século) como renhido defensor dos direitos humanos, principalmente porque denunciou grupos de extermínios que agiam a partir do aparato policial do estado.
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Mistura da vida
Seguindo a proposta da missão de criar soluções, coletivamente, para problemas que afligem as populações em estado de vulnerabilidade social, destacam-se a mistura alimentícia feita a partir da casca de banana para combater a desnutrição infantil e o cultivo de plantas medicinais de fundo de quintal.
Somavam-se a essas atividades as oficinas de conscientização política, cursos de artesanato e combate à violência doméstica.
O objetivo da Missão Pistóia, segundo Nádia, é, acima de tudo, esclarecer e incentivar as pessoas e as famílias a lutarem por seus direitos sociais e políticos. Por isso, almeja ensinar pessoas e famílias a “caminharem com as suas próprias pernas”.
O livro trata das memórias de pessoas e instituições, como a Pastoral da Criança e Comissão Pastoral da Terra (CPT), vinculadas à igreja, para que suas experiências sigam vivas e caminhantes, assim como ocorre com as missionárias e missionários.
Livro-documento
Em sua saudação à obra e sua autora, a jornalista e professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) Ivânia Vieira enfatizou que, mesmo antes de ser feito, “Além […] já estava escrito, porque veio impresso nos corpos da Nádia Vettori e do padre Guidotti”.
O lançamento faz parte da agenda de três dias (27, 28 e 29 de abril) de celebração dos 50 anos da missão na Amazônia.
“Trata-se de uma publicação onde a palavra missionário/a é essencialmente encarnada. Nádia e Humberto fizeram do Amazonas e do Maranhão missão de vida[…]. Não como um livro a mais. E sim um documento que abriga fios de muitas histórias, de muitas verdades, dos silêncios e dos gritos, da omissão e da alegria de ver a vida brotando contra os planos de morte […]”, acentuou a professora.
Dona Maria do Carmo Silva Ferreira, moradora do Catalão, no Iranduba, disse que Nádia Vettori é “querida entre nós” porque ensinou como deveriam reivindicar seus direitos do poder público e a criar soluções para os seus problemas do cotidiano por meio de ações coletivas.
“A Vettori chegou para nós como missionária e, agora, passou a ser a nossa irmã de coração e alma. O trabalho dela no Catalão fez com que todos nós nos tornássemos irmãos. E ela continua nos ajudando”.
Entre as atividades desenvolvidas por Nádia, padre Lourenço e padre Guidotti, Maria do Carmo destaca as de saúde e educação, e a libertação das mulheres.
“Na época, vivíamos uma ditadura e quando existe ditadura os homens são incentivados a ser ditadores das suas próprias esposas. E era muito difícil se libertarem”.
Ana Lúcia Gomes, hoje presidenta do Sindicato dos Professores da Ufam, destacou que Nádia fez a sua família de migrantes vencer obstáculos comuns de vulnerabilidade social.
“Eles, Nádia, padre Umberto e irmã Bruna, fizeram a diferença nas nossas vidas, por meio da influência da igreja católica. Hoje sou professora da Ufam e atribuo parte do meu êxito pessoal à ajuda desses valorosos missionários católicos”.
A autora, por sua vez, explicou que o livro veio a público para ser memória mesmo, “porque o amor não suporta perda”.
E acrescentou:
“E a maneira de não perder essa experiência vivida, que não existe mais, é transformá-la em poesia ou literatura. Amei a todos, vocês fazem parte da minha vida. É claro que cinquenta anos de vida não cabem em um livro, até porque foram tantas vidas”.
Reconhecimento
Ao menos 300 pessoas participaram do lançamento do livro de Nádia, entre elas, moradores das comunidades do Catalão e Paricatuba, em Iranduba, e dos bairros da Chapada e Jorge Teixeira, em Manaus, lugares de forte atuação dos missionários de Pistóia.
O evento foi prestigiado pelo bispo emérito do Amazonas, dom Luís Soares Vieira, do bispo de Pistóia, Fausto Tardelli, e do bispo auxiliar de Manaus, dom Hudson Ribeiro.
Também esteve presente o vereador José Ricardo (PT), que anunciou a aprovação, neste dia 28, pela Câmara Municipal de Manaus, do título de cidadã a Nádia Vettori, italiana de nascimento, pelos relevantes serviços prestados à sociedade manauara e amazonense.

Fotos: Wilson Nogueira/especial para o BNC Amazonas