Quem diria, anticomunismo não deixa sonho comunista morrer

O anticomunismo voltou com o mesmo vigor dos velhos tempos, mas num trem-bala ou montado num satélite ou em ondas eletromagnéticas

Mariane Veiga, por Lúcio Carril

Publicado em: 29/04/2025 às 21:08 | Atualizado em: 29/04/2025 às 21:10

Vivi como militante os últimos dez anos da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, do Muro de Berlim e da Guerra Fria.

Falei aos meus botões, caminhando pelo Igarapé de Manaus no início dos anos 90: a propaganda anticomunista agora perde o sentido. Não há mais ameaça.

E assim os anos se passaram.

Continuei comunista, fui para universidade e virei um sociólogo comunista nascido e criado no meio da floresta amazônica. Um boto vermelho.

Vi e ajudei a renascer a democracia no Brasil. Ainda andei sentindo o cacetete da ditadura, suas celas fétidas e o cheiro de enxofre dos seus agentes. Sobrevivi, ao contrário de muitos dos meus e minhas camaradas.

Pois bem. Já me sentia solitário e esquecido na minha utopia marxista, quando vejo ressurgir um macarthismo em pleno século 21, mais de trinta anos após a queda do Muro, e aqui no Brasil, país que já tinha enterrado Plínio Salgado e seu integralismo tupiniquim.

Desta vez a máquina anticomunista não é a velha imprensa marrom das cinco velhas famílias tradicionais, mas os meios criados pelas novas tecnologias da informação e da comunicação. Agora, a notícia ganhou mais rapidez e eficiência.

Nas minhas aulas de sociologia da comunicação com o mestre Ricardo Parente aprendi a perceber o sentido ideológico da comunicação. A partir dali fui dialogar com a semiótica para entender signos e significados nos textos jornalísticos.

Hoje, pouco importa a beleza do texto para quem coordena uma fábrica de fake news a devorar mentes e o vazio que nela existe.

Se o meio é outro, não podemos dizer o mesmo dos produtos. Mentiras, ódio e poder dão vida ao velho anticomunismo macarthista e integralista da Guerra Fria.

Mesmo as produções jornalísticas perderam seu estilo sutil de ideologizar através de um título ou das entrelinhas da matéria. Agora tudo é propaganda direta, cínica e, muitas vezes, mentirosa.

O anticomunismo voltou com o mesmo vigor dos velhos tempos, mas num trem-bala ou montado num satélite ou em ondas eletromagnéticas.

Ao comunismo não foi dado sequer um breve descanso na história. Ele está vivo nos nossos sonhos, nas nossas lutas e nas mentes insanas dos estúpidos.

O autor é sociólogo

Foto: Agência Brasil/Fernando Frazão