STF livra Judiciário do teto de gastos e acirra debate sobre privilégios
STF exclui receitas próprias do Judiciário do teto de gastos, priorizando autonomia institucional frente ao novo arcabouço fiscal.

Diamantino Junior
Publicado em: 07/04/2025 às 13:54 | Atualizado em: 07/04/2025 às 13:56
A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) optou por excluir do teto de gastos as receitas próprias do Judiciário, como custas processuais e emolumentos. A decisão foi embasada no princípio da autonomia orçamentária do Poder Judiciário, considerado essencial à independência dos poderes.
Essa medida ocorre no contexto do novo arcabouço fiscal — em vigor desde 2023 — que impõe um teto ao crescimento das despesas primárias da União, com a finalidade de controlar o endividamento público. A regra geral estabelece que os gastos só podem crescer 70% do aumento da arrecadação do ano anterior, limitando-se a uma faixa de 0,6% a 2,5% de crescimento.
Fundamentação jurídica
O relator, Alexandre de Moraes, defendeu que as receitas arrecadadas de forma autônoma pelo Judiciário não devem ser submetidas ao teto, pois não afetam a “higidez fiscal” da União — ou seja, não comprometem o controle das contas públicas, já que não provêm do Tesouro Nacional.
Essa interpretação foi acompanhada por outros cinco ministros, reforçando a visão de que a limitação imposta às receitas próprias violaria a separação e independência dos poderes.
Tensões institucionais
A decisão contraria os argumentos do Legislativo e do Executivo, que defenderam a submissão de todas as receitas ao teto como forma de garantir isonomia entre os Poderes no esforço de ajuste fiscal.
Esse ponto revela uma tensão entre os princípios constitucionais da responsabilidade fiscal e da independência dos Poderes.
A crítica implícita é que o Judiciário estaria se blindando de um esforço coletivo, o que pode gerar questionamentos sobre privilégios institucionais em meio a um contexto fiscal delicado.
Precedente e possível efeito dominó
A ação direta de inconstitucionalidade sobre o tema (ADI 7641), aberta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), compara a situação dos tribunais com universidades públicas e empresas estatais, que já foram autorizadas a gastar receitas próprias fora do teto.
A decisão do STF reforça essa jurisprudência, abrindo espaço para que outros órgãos pleiteiem tratamento semelhante. Isso pode enfraquecer o alcance prático do arcabouço fiscal, comprometendo sua eficácia.
Impacto político e fiscal
Politicamente, a decisão do STF pode ser lida como uma reafirmação da sua autonomia, mas também como um movimento de resistência à uniformização dos controles fiscais. No plano fiscal, ao retirar essas receitas da contabilidade do teto, o Judiciário ganha mais liberdade para expandir gastos em áreas estratégicas, o que pode ser positivo para sua operação, mas levanta preocupações sobre controle e transparência.
A decisão do STF revela um conflito estrutural entre autonomia institucional e responsabilidade fiscal compartilhada.
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Embora juridicamente defensável, do ponto de vista da governança pública, ela pode fragilizar os instrumentos de controle orçamentário e criar precedentes que ampliam exceções ao teto de gastos, esvaziando seu propósito. É um exemplo claro de como as tensões entre poderes se manifestam não só politicamente, mas também nas regras que regulam o próprio funcionamento do Estado.
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Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil