Corpos de 17 bebês, há três anos em maternidade de Manaus, são sepultados
Ação inédita foi realizada com base na atuação da Defensoria Pública do Amazonas

Mariane Veiga
Publicado em: 26/12/2024 às 16:40 | Atualizado em: 26/12/2024 às 17:14
A Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) divulgou neste dia 26 de dezembro que viabilizou o sepultamento de 17 corpos de recém-nascidos abandonados na Maternidade Ana Braga, em Manaus.
A ação inédita da DPE se deu em casos de extrema vulnerabilidade social, com base na tese “custos vulnerabilis”, que envolvam a fragilidade de pessoas ou grupos em situações de risco ou abandono.
O sepultamento ocorreu no cemitério Nossa Senhora Aparecida, localizado no bairro Tarumã, zona oeste da capital, com o auxílio da Prefeitura de Manaus por meio do programa SOS Funeral.
Os bebês, que nasceram mortos ou faleceram logo após o nascimento, foram abandonados por suas mães, mulheres em situação de vulnerabilidade social, e estavam armazenados há pelo menos três anos na maternidade. Conforme a defensoria, sem qualquer perspectiva de um enterro digno, já que a maternidade tentou contato com os responsáveis, sem sucesso.
A ação, que envolveu a judicialização para a autorização de sepultamento e o registro tardio de óbito, chegou à defensoria por meio do Comitê de Enfrentamento à Violência Obstétrica no Amazonas.
Em seguida, o caso foi assumido pela Defensoria Especializada no Atendimento de Registros Públicos, que tem como titular a defensora pública Rosimeire Barbosa, responsável por conduzir todo o processo.
“Após termos conhecimento da situação, verificamos como a Defensoria do Amazonas poderia atuar para garantir a estas crianças um enterro digno. Durante esse processo, constatamos que as mães estavam em extrema vulnerabilidade, sendo, em sua maioria, pessoas em situação de rua e dependentes químicas. Por isso, decidimos ajuizar essa demanda para obter a autorização de sepultamento combinada com o registro tardio de óbito”.
Leia mais
DPE-AM vence prêmio do CNJ com projeto Libertar-te
Quando um bebê morre recém-nascido ou nasce morto, a maternidade deve seguir alguns passos. Primeiro, é necessário obter a declaração de óbito feita pelo médico e levá-la ao cartório para a emissão tanto da certidão de nascimento quanto da de óbito.
Após isso, o SOS Funeral é acionado para dar continuidade ao processo. Se o feto pesa menos de 500 gramas, ele é descartado; no entanto, quando o peso é superior, uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) estabelece que o corpo não pode ser descartado e que o sepultamento, assim como a emissão do registro de óbito, é obrigatório.
Esse era o caso dos corpos abandonados. Dessa forma, com base na lei, a Defensoria do Amazonas obteve resposta positiva do juízo e foi autorizada a realizar o enterro. Contudo, surgiram dois fatores complicadores: a falta de espaço para o sepultamento e a intervenção de um terceiro interessado, a Amazon Crematório, que se apresentou para cremar os corpos das crianças.
“De acordo com a legislação brasileira, a cremação só pode ser realizada com autorização da família ou em situações de saúde pública. Como não havia autorização das famílias, a atitude da Amazon Crematório era ilegal.
A defensoria, então, procurou a Procuradoria-Geral do Município (PGM), alertando sobre a ilegalidade da ação.
“Como resultado, a Justiça obrigou o estado a garantir um sepultamento digno no cemitério, assegurando que as crianças fossem enterradas de forma adequada”, disse Rosimeire.
Foto: Márcio Silva/DPE