Amazônia: por uma compreensão

A região é um caleidoscópio de culturas, histórias, memórias, singularidades e especificidades

Mariane Veiga, Por Aldenor Ferreira*

Publicado em: 07/09/2024 às 04:00 | Atualizado em: 07/09/2024 às 08:23

A importância ecológica, cultural e econômica da Amazônia para o Brasil e para o mundo é inquestionável. Sobre isto há muitas explicações, mas pouca compreensão. Todavia, como já alertou Ricoeur (1989), existe uma distinção entre “explicar e compreender”. 

Para o filósofo, a compreensão remonta a correlação de conceitos em processo amplo e deve vir primeiro. Neste sentido, compreender a Amazônia requer um exercício de “imaginação sociológica” (Mills, 2001), na qual a ruptura com os “conhecimentos mal estabelecidos”(Bachelard, 1996) possa ser a impulsionadora de novas análises e interpretações. 

Os conhecimentos mal estabelecidos são obstáculos epistemológicos na perspectiva de Bachelard, por isto, devem ser superados para que possam ser empreendidas análises desprovidas de paixão. Neste âmbito, o romantismo interpretativo, o exotismo, o hiperbolismo, em nada contribuem para a obtenção de uma visão clara da realidade social e ambiental da Amazônia.

A chave hermenêutica 

Penso que a compreensão dos aspectos que apontamos no início deste texto perpassa, antes de tudo, pela compreensão do modo de vida e dos saberes dos povos tradicionais que habitam a Amazônia. E são muitos. A região é um caleidoscópio de culturas, histórias, memórias, singularidades e especificidades.

Há séculos os povos tradicionais indígenas, quilombolas, caboclos-ribeirinhos, pescadores, piaçabeiros, castanheiros, agricultores familiares, peconheiros, quebradeiras de coco, dentre outras autodefinições, manejam muito bem os recursos naturais que demandam a sua sobrevivência, em uma convivência equilibrada com a natureza.

Estes saberes foram construídos ao longo de muitos séculos e possibilitaram uma profunda compreensão da dinâmica das terras, das florestas e das águas, como observou o sociólogoWitkoski (2007). 

Os povos da floresta já dialogavam com a conservação e a sustentabilidade muito antes destes conceitos existirem. Portanto, compreende-los é a chave hermenêutica para a análise, interpretação e compreensão da Amazônia como um todo.

Esta chave está aí, bem diante dos nossos olhos. Com efeito, estes povos precisam de proteção, precisam de políticas públicas que verdadeiramente os alcancem. A proteção de seus direitos é, ao mesmo tempo, a proteção e a preservação de uma epistemologia autóctone que poderá salvar a Amazônia da sua destruição. É desta diversidade étnica e cultural que poderá vir o novo. 

Portanto, precisamos, antes de tudo, compreender a Amazônia. É partir desta compreensão que poderemos construir um espaço biossociocultural democrático, inclusivo, preservado, mas com as pessoas prósperas, algo absolutamente possível de ser construído, basta que haja vontade política para sua realização.

*O autor é sociólogo

Arte: Gilmal