Comércio do Amazonas se considera desigual em relação à ZFM

Mesmo com PIB de R$ 74,8 bilhões (46%) e 360 mil postos de trabalho (70%), setor tem tratamento diferenciado, afirma Fecomércio.

Comércio do Amazonas se considera desigual em relação à ZFM

Antônio Paulo, do BNC Amazonas em Brasília  

Publicado em: 19/07/2024 às 14:59 | Atualizado em: 19/07/2024 às 14:59

Ainda no calor dos debates da reforma tributária, agora sob análise do Senado, o setor de comércio e serviços do estado do Amazonas, que teve uma de suas reivindicações excluída da regulamentação prevista no projeto de lei complementar 68/2024, diz que recebe tratamento diferenciado ante a indústria da Zona Franca de Manaus (ZFM).

Segundo o presidente da Federação do Comércio do Amazonas (Fecomércio), Aderson Frota, o setor ainda tem um tratamento desigual porque paga imposto antecipado e outros setores pagam imposto depois que fabrica e vende os seus produtos.

“Dessa forma, o comércio paga o ICMS com mais valor agregado antes de receber a mercadoria e sequer vender. Essa é, portanto, uma questão que a gente precisa entender e hoje estamos preocupados em levar à população o conhecimento da realidade do comércio”.

Segundo Frota, o comércio amazonense não gera impostos. É apenas a fase de desempenho do recolhimento do imposto, mas a carga tributária não é provocada pelo comércio.

Por outro lado, o presidente da Fercomércio ressalta que quando se vai calcular o preço da mercadoria, leva-se em consideração alguns fatores. Por exemplo: ao comprar mercadoria por R$ 100, agrega-se a esse valor a carga tributária e os custos operacionais como transporte, folha de pagamento, despesas de água, luz energia, telecomunicações, alvará e IPTU. Após incluir esses custos é que o comércio não pode ultrapassar a 7%.

“Por isso, o comércio hoje é comedido por tais circunstâncias e dificuldades. Mas, o comércio tem a missão de atender a população, deslocar-se pelo interior do estado e em todos os quadrantes da capital para fazer esse atendimento”.

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Pivô da discórdia

Dessa forma, o setor de comércio e serviço foi o pivô da discórdia entre o governo federal e a bancada do Amazonas, no Congresso Nacional, que votou contra o projeto 68, de regulamentação da reforma tributária, aprovado pela Câmara dos Deputados no último dia 11 de julho.

Embora tenha conseguido alguns benefícios, especialmente a indústria, por meio de pressão política, acordos com o governo e com o grupo de trabalho da reforma tributária, a bancada amazonense bateu o pé contra o projeto porque não contemplou o setor de comércio e serviço.

Mesmo que a proposta do terceiro setor econômico não estivesse na mesa inicial de negociações, a emenda dos deputados do Amazonas, rejeitada em plenário, queria incluir o crédito presumido nas operações internas do comércio local.

“O esforço da bancada federal foi no sentido de que seja cumprido o regramento estabelecido pela emenda constitucional 132/2023, que mantém, em caráter geral, o atual nível de competitividade da Zona Franca de Manaus. E isso foi plenamente contemplado pelo projeto 68/2024, que visa regulamentar o tratamento tributário da ZFM”, disse o superintendente da ZFM (Suframa), Bosco Saraiva.

E prossegue:

“No entanto, o principal ponto de discussão do projeto, em relação ao comércio, visa desonerar as operações internas da incidência da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que englobará as atuais contribuições do PIS/Pasep e da Cofins, que, atualmente, não incidem sobre estas operações. Em última análise, a não incidência da CBS nas operações internas da ZFM pode representar uma redução dos custos de venda para o consumidor”.

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Imblóglio e dúvidas

Por outro lado, muita gente não compreendeu bem essa reivindicação e a “birra política” da bancada. Ficou-se sem saber, por exemplo, se o comércio ainda faz parte da ZFM.

Isso porque desde o fim da ditatura militar (anos 80), reforçado ainda mais pela abertura de mercado e das importações, promovidas pelo governo Collor (1990-1992), o comércio da ZFM perdeu força nas suas vendas externas, dando lugar ao segundo setor, a indústria.

Logo, após o imbróglio político na Câmara dos Deputados, perguntas ficaram no ar: o comércio do Amazonas ainda tem vantagens da ZFM? Se tem, quais são os impostos da cesta de incentivos?

A fim de responder tais questionamentos e dar sentido a toda a movimentação dos parlamentares amazonenses, que se rebelaram contra o projeto de regulamentação da reforma tributária, o BNC Amazonas foi ouvir especialistas, representantes do comércio e do próprio governo federal para obter as respostas desejadas.

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Decreto 288

De acordo com Saraiva, o decreto-lei 288/1967 teve como objetivo desenvolver, no centro da Amazônia, um polo industrial, comercial e agropecuário.

Desse modo, a atividade comercial também é beneficiada pelos incentivos fiscais da ZFM e é uma atividade economicamente relevante para o modelo.

Assim, as operações de compra nacional e de importação do exterior são desoneradas de tributos para os estabelecimentos comerciais que estão localizados no perímetro desta zona de exceção fiscal.

Isenção de impostos

Hoje o comércio da ZFM tem os seguintes benefícios:

  • Isenção do ICMS interestadual;
  • Redução a zero das alíquotas do PIS/Pasep e da Cofins nas compras nacionais;
  • Isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) nas compras nacionais;
  • Isenção do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos industrializados (IPI vinculados à importação
  • Crédito presumido do ICMS igual ao imposto devido se a operação não tiver sido beneficiada pela isenção, concedido pelo Amazonas;

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Aval da Fazenda Nacional

E tem mais:

Nas operações internas na ZFM, todas as empresas possuem decisão judicial para não pagar PIS/Cofins, com pareceres da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) para não mais recorrer das decisões dos tribunais nessas circunstâncias: vendas entre pessoas jurídicas, assim como nas vendas entre pessoa jurídica e pessoa física.

Nas compras feitas pelo comércio das indústrias incentivadas da ZFM, existe uma redução de base de cálculo do ICMS de forma que a carga tributária fica em 7%;

Já nas vendas dessas mercadorias, adquiridas das indústrias da ZFM, pelo comércio e revendidas para PJ ou PF, dentro da ZFM, fica mantida a mesma carga de 7% do ICMS;

Do mesmo modo, na importação do exterior, o comércio tem alíquota reduzida de 7%. E na revenda interna na ZFM é mantida a mesma alíquota.

Reforma tributária

O auditor fiscal aposentado da Secretaria Estadual de Fazenda (Sefaz) e consultor tributário, Afonso Lobo, explica que na proposta de reforma tributária, aprovada pela Câmara dos Deputados, o comércio terá alíquota zero de IBS e CBS (impostos e contribuição sobre bens de consumo) nas compras interestaduais.

Assim como, crédito presumido do IBS de 7,5% se a mercadoria vier do Sul e Sudeste, exceto Espírito Santo. E ainda 13,5% se vier do Norte, Nordeste, Centro-Oeste e do Espírito Santo.

“Desse modo, esses créditos de 7,5% e 13,5% correspondem aos atuais 7% e 12% que no ICMS são calculados por dentro e na nova sistemática são calculados por fora, por isso essa pequena diferença”, afirma Lobo.

Com isso, a desoneração do PIS/Cofins, que hoje o comércio possui, por força de decisão judicial, deixaria de ter no mundo da CBS no âmbito da reforma tributária.

Defesa da bancada

No entanto, o que a bancada do Amazonas está defendendo, segundo Afonso Lobo, é a manutenção do benefício que o comércio tem hoje no PIS/Cofins no âmbito da CBS.

Os demais benefícios, que hoje o comércio tem, no ambiente ICMS, foram fruto da contribuição do Amazonas para guerra fiscal, isso porque foram concedidos sem anuência do Confaz e nós só poderíamos dar benefícios sem anuência do Confaz para a indústria, segundo a Lei Complementar 24/75, ressalta o consultor tributário.

Por fim, Lobo revela que todos os benefícios, fruto da guerra fiscal, foram convalidados pela Lei Complementar 160/2017, mas terão sua vigência somente até 2032. Ou seja, se encerram com o fim da transição

Dados do comércio

Em 2023, o setor de comércio e serviços contribuiu com 46,71% do PIB (produto interno bruto) do Amazonas), que chegou a R$ 160,21 bilhões no total. Desse montante, o terceiro setor ajudou com R$ 74,83 bilhões, valor 6,26% a mais que 2022 (R$ 70,42 bilhões).

Ainda no ano passado, o comércio arrecadou R$ 8,5 bilhões de ICMS para o governo do Estado e foi responsável pela manutenção de mais de 360 mil postos de trabalho. Ou seja, 70% dos empregos formais do estado, de acordo com os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

Foto: divulgação