Tragédia no RS, Congresso vota 25 projetos que causam danos ambientais

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Publicado em: 09/05/2024 às 18:57 | Atualizado em: 09/05/2024 às 20:45

O país assiste a maior tragédia da história do Rio Grande do Sul que, entre outras causas, tem ligação direta com as mudanças climáticas no planeta. Enquanto isso, tramitam no Congresso 25 projetos e três emendas à Constituição que afetam ainda mais o meio ambiente.

De acordo com levantamento do Observatório do Clima, são matérias que pertencem ao chamado “pacote da destruição” e envolvem temas como licença ambiental, grilagem, direitos indígenas, financiamento da política ambiental.

“Há ainda outros que flexibilizam o Código Florestal, legislações sobre recursos hídricos, mineração, oceano e zonas costeiras, sendo que alguns têm alta probabilidade de avanço imediato”, alerta o observatório.

Um deles é o projeto 3.334/2023, de autoria do senador bolsonarista Jaime Bagattoli (PL-RO), que reduz área de floresta legal na Amazônia de 80% para 50%.

A matéria abre brecha para o desmatamento na região de uma área equivalente a 8,5 milhões de campos de futebol, similar a duas vezes o tamanho do estado do Rio de Janeiro.

O projeto seria votado nesta quarta-feira (8) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, porém o presidente do colegiado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), adiou a votação por causa da licença médica do relator, senador Márcio Bittar (União Brasil-AC).

O diretor do observatório, Márcio Astrini, disse que os senadores iriam votar para liberar o desmatamento na Amazônia.

“Adiaram. Cálculo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima mostra que o projeto coloca em risco área 31 vezes maior do que o desmatamento de 2023. Sugiro que os nobres senadores, se forem votar essa barbaridade, façam isso lá no Rio Grande do Sul, no meio do povo desabrigado”.

Outra matéria considerada danosa é o projeto 364/2019, que elimina a proteção de todos os campos nativos e outras formações não florestais.

Já aprovado na CCJ da Câmara, a matéria deixa desprotegidos 48 milhões de hectares de campos nativos em todo o país, além de quase 15 milhões de hectares na Amazônia.

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Mais projetos da ‘destruição’

  • 2.374/2020 – Anistia para desmatadores. O texto altera o marco temporal da regularização de áreas de reserva legal desmatadas irregularmente ao estender a data de anistia de julho de 2008 para maio de 2012. Estender o prazo significa beneficiar os desmatadores ilegais.
  • 1.282/2019 e 2.168/2021 – Obras de irrigação em áreas de preservação permanente. Os projetos qualificam obras de irrigação como de utilidade pública em áreas de preservação permanente.
    A proposta, além de permitir a derrubada de vegetação nativa, potencializa a crise hídrica e o conflito pela água no país.
  • 686/2022 – Suprime o controle sobre a vegetação secundária em área de uso alternativo do solo.
    Se for aprovada, cerca de 17 milhões de hectares de florestas regeneradas poderão ser desmatadas sem controle.
  • 2.159/2021 – Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Torna o licenciamento ambiental uma exceção ao invés de regra.
    O licenciamento e as análises nele incluídas são as principais ferramentas para evitar danos socioambientais existentes no direito ambiental brasileiro.
  • 4.994/2023 – projeto da BR-319. Já aprovado na Câmara, permite o asfaltamento da rodovia com recursos do Fundo Amazônia.
  • 10.273/2018 – Esvazia a taxa de controle e fiscalização ambiental e o poder do Ibama. A matéria determina que o Ibama poderá realizar a cobrança da taxa apenas das atividades licenciadas pela União.
    Ocorre que a fiscalização do Ibama vai muito além dos empreendimentos licenciados pela autarquia.
  • 6.049/2023 – Altera as regras do Fundo Amazônia, transformando-o em associação civil sem fins lucrativos, o que não faz o menor sentido técnico ou jurídico.
    Trará burocracia e engessamento para a administração e repasse dos recursos do fundo, dificultando a aplicação em projetos importantes para o controle do desmatamento bem como para a proteção do bioma.
  • 2.633/2020 e 510/2021 – Flexibilizam as normas sobre regularização fundiária. Estende o benefício de dispensa de vistoria de pequenas ocupações (até quatro módulos fiscais, já previsto na legislação em vigor) para áreas médias de até seis módulos.
  • 510/2020 – Prevê anistia a quem invadiu e desmatou ilegalmente terra pública até dezembro de 2014.
    Aumenta o risco de titular áreas em conflito ou com demandas prioritárias, pois elimina a vistoria prévia à regularização de latifúndios de até 2.500 hectares.
    Também enfraquece os casos excepcionais em que a vistoria é obrigatória.
  • 3.915/2021 – Altera o marco temporal para regularização fundiária de terras da União. Incentiva a ocupação ilegal ao estender o marco temporal de julho de 2008 para maio de 2014.
    Pode ser visto como um incentivo a ocupações ilegais, pois sugere que invasões realizadas após o prazo inicial estabelecido pela lei podem eventualmente ser legalizadas, o que encoraja futuras ocupações ilegais com a expectativa de regularizações posteriores.
  • 2.550/2021 – Amplia o uso da certidão de reconhecimento de ocupação. O manejo florestal envolve a exploração de recursos naturais, que deve ser feita de maneira controlada e sustentável.
    Entretanto, ao permitir que uma certidão precária, que não confirma definitivamente a propriedade da terra, mas indica uma possível futura regularização, seja usada para aprovar projetos de manejo, gera risco de aumento da exploração descontrolada de recursos naturais.
  • 5.822/2019 e 2.623/2022 – Admitem exploração mineral em unidades de conservação. A permissão da exploração mineral em parques e reservas extrativistas é extremamente danosa à proteção dessas áreas e incompatível com os objetivos de criação dessas categorias de unidades.
  • 2.001/2019, 717/2021 e 5.028/2023 – Buscam inviabilizar a criação de unidades de conservação. Estabelecem que a criação de uma unidade de domínio público, quando incluir propriedades privadas, está condicionada à disponibilidade de dotação orçamentária para a completa indenização. Isso não ocorrerá na prática e impedirá a instituição das áreas protegidas.
  • 3.087/2022 – Reduz o parque nacional Montanhas do Tumucumaque. O projeto visa a desmembrar parte da unidade de conservação para criar o distrito-parque de Vila Brasil, no município de Oiapoque (AP).
    Trata-se de um parque importante, com alta biodiversidade e localização estratégica.
    Qualquer demanda de ajuste em sua delimitação deve partir do ICMBio.
  • 6.050/2023 – Flexibiliza o desenvolvimento de atividades econômicas nas terras indígenas.
    Pretende regular exploração mineral e outras atividades em terras indígenas.
  • 4.546/2021 – Institui política de infraestrutura hídrica desconectada da política nacional de recursos hídricos, que é afetada drasticamente nos princípios da descentralização e da gestão participativa da água.
  • 254/2023 – Atribui à Marinha o licenciamento ambiental de empreendimentos náuticos. Inclui áreas nas faixas terrestre e marítima da zona costeira, a serem ocupadas por empreendimentos referentes a turismo, esporte e economia náutica.
  • 355/2020 – Altera o Código de Mineração. O projeto visa facilitar a atividade garimpeira, que tem respondido por graves problemas socioambientais.
  • 3.587/2023 – Cria o Banco Nacional Forense de Perfis Auríferos. A governança para o rastreamento do ouro prioritariamente deve ser originada no poder Executivo.
    O conteúdo é frágil e não assegura o controle da cadeia do ouro.

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Emendas à Constituição

  • PEC 48/2023 – Acrescenta o marco temporal no art. 231 da Constituição.
    O direito dos povos indígenas ao seu território tradicional foi estabelecido pelo poder constituinte originário no art. 231 da carta de 1988 sem menção a marco temporal. Mesmo se aprovado por meio de emenda à Constituição, o marco temporal tende a ser judicializado, pois interfere em direito fundamental.
  • PEC 59/2023 – Delega ao Congresso competência para demarcação de terras indígenas.
    A proposta fere cláusula pétrea (separação dos poderes) e não pode prosperar.
    Mesmo se aprovada a emenda à Constituição, tende a ser judicializada.
  • PEC 3/2022 – Retira a propriedade exclusiva da União sobre os terrenos de marinha, consolidando ocupações sem as cautelas necessárias com relação à importância dessas áreas, que inclusive poderão ser diretamente afetadas pelo aumento do nível do mar.

Foto: divulgação