Amazonas: 33 entidades pedem ao TJ-AM soltura de agricultor preso em Lábrea
Ele foi preso no município de Lábrea em 5 de março deste ano e transferido para penitenciária em Manaus

Mariane Veiga, por Wilson Nogueira
Publicado em: 02/04/2024 às 23:50 | Atualizado em: 03/04/2024 às 02:54
Trinta e três organizações sociais de defesa dos direitos humanos e proteção do meio ambiente pediram, em carta enviada à Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM), a soltura do agricultor Paulo César de Araújo.
Ele foi preso no município de Lábrea em 5 de março deste ano e transferido para penitenciária em Manaus.
Araújo é acusado de pertencer a uma organização criminosa que, segundo “inquérito policial” aceito pelo juiz local e pelo Ministério Público, invade terras sob posse questionável da fazenda Polatina, cujo “proprietário” é Sidney Sanchez Zamora.
No entanto, relatos de agricultores do acampamento Marielle Franco ao corregedor-geral Jomar Fernandes, que esteve em Lábrea no último fim de semana, sustentam que Araújo é vítima de prisão ilegal, arquitetada pelo posseiro com a aprovação de servidores do Judiciário e policiais locais.
“[…] até o presente momento o sr. Paulo não foi ouvido pelas autoridades e segue preso preventivamente, sem atendimento médico, longe da sua família e sem a garantia dos seus direitos. A liderança está correndo risco de vida e as condições da sua prisão são consideradas ilegais perante o ordenamento jurídico”, enfatiza a carta.
Na versão dos agricultores, Araújo faz parte do acampamento que reivindica terras no Instituto Nacional da Reforma Agrária (Incra) para assentamento de interesse da agricultura familiar.
Ele e outros agricultores, disseram os acampados, estão em conflito com Zamora. Conforme eles, o posseiro quer alongar sua pastagem para gado com a derrubada da floresta e encontra resistência dos movimentos sociais de defesa da reforma agrária.
“Requeremos o imediato relaxamento da prisão do Paulo Sérgio. Ele tem o direito constitucional de responder em liberdade pelas acusações que lhe foram feitas. Solicitamos que a lei seja cumprida e os ritos processuais sejam seguidos”, demandam as entidades que assinam a carta (veja lista abaixo).
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Corregedoria
O corregedor-geral Fernandes, respondendo à consulta do BNC Amazonas, disse, por meio eletrônico, que recebeu a carta das entidades sociais.
“A liberdade do referido senhor [Paulo de Araújo) está sendo analisada através de pedido de soltura que tramita em uma das câmaras criminais do TJ-AM. Portanto, fora do alcance das atribuições legais afeitas à corregedoria do nosso tribunal!”.
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Signatários do documento
CPT/AC – Comissão Pastoral da Terra Regional Acre
CPT/AM – Comissão Pastoral da Terra Regional Amazonas
CPT/RO – Comissão Pastoral da Terra Regional Rondonia
CPT/RR – Comissão Pastoral da Terra Regional Roraima
CPT/AT – Comissão Pastoral da Terra Araguaia Regional Tocantins
CPT/PA – Comissão Pastoral da Terra Regional Pará
Assessoria Jurídica da Diocese de Cruzeiro do Sul
Comitê Chico Mendes
CEDDHEP – Centro de Defesa dos Direitos Humanos e Educação Popular
CIMI – Conselho Indigenista Missionário
FETACRE – Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Acre
Associação Varadouro de Jornalismo e Comunicação Pela Amazônia
MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto – Acre
Cozinha Solidária Marielle Franco
Observatório do Trabalho no Acre
CPI/ACRE – Comissão Pro-Indígena no Acre
IEA – Instituto de Estudos Amazônicos
Casa Ninja Amazônia
Memorial Chico Mendes
Secretaria Nacional dos Direitos Humanos das Populações Extrativistas – CNS
SOS Amazônia
Instituto Fronteiras
Rede um Grito Pela vida
Sindicato dos empregados em estabelecimentos bancários do estado do Acre
Artigo 19 Brasil e América do Sul
Justiça Global
CUT-AC – Central Única dos Trabalhadores
INTERJUS – Instituto Territórios e Justiça
ADUFAC – Associação de Docentes da UFAC
Pastoral Rural da Diocese de Cruzeiro do Sul
União da Juventude Comunidade do Acre
Movimento por uma Universidade Popular
Xapuri Sócio Ambiental Comunicação e Resistência
PJ – Pastoral da Juventude da Diocese de Rio Branco
STR Xapuri
Conflito
A prisão de Paulo de Araújo é um caso típico da onda de violência no campo no Sul do Amazonas, principalmente em Lábrea e Boca do Acre, na fronteira com o estado do Acre. A ação dos grileiros quase sempre conta com a conivência de servidores públicos em vários escalões. É recorrente os casos em que surgem donos de terras que, na realidade, pertencem ao poder público ou populações tradicionais, como indígenas, pequenos agricultores, ribeirinhos, quilombolas etc.
Os invasores sem impõem pela violência generalizada, na forma de assassinatos, tortura, despejo ilegal e ameaça de morte.
Servidores do Judiciário e do Executivo (Amazonas, Acre e União) estão sob a suspeita de colaborar com os desmandos cometidos por Sidney Zamora e seus capangas contra os pequenos agricultores do assentamento Marielle Franco.
Para investigar práticas dessa natureza, a Corregedoria-Geral do TJA interveio no Cartório de Lábrea, para investigar, administrativamente, atos suspeitos da tabeliã Luciana da Cruz Barroncas, e encaminhou aos órgãos competentes as denúncias contra policiais militares (Amazonas e Acre) e contra o ex-delegado da PF Mário Spósito ao Ministério Público Federal com atuação no Amazonas.
Os atos da tabeliã Luciana Barroncas com indícios irregularidades os seguintes:
a) indícios de abertura de matrícula de forma irregular, além de extravio de documentos públicos em poder da atual delegatária de serviços extrajudiciais do município de Lábrea-AM;
b) indícios de omissão do cartório de Lábrea-AM para atendimento às solicitações de instituições públicas, notadamente o INCRA;
c) ausência de atendimento às notificações do Núcleo de Governança Fundiária e Sustentabilidade para a elaboração de diagnóstico fundiário do município de Lábrea-AM e impactos para o acompanhamento dos registros levados a efeito no citado cartório, a partir de projetos de regularização pela atual gestão pública municipal;
d) notícia de violações a direitos humanos e violência por disputas de terras, além de suspeita de atuação ilegal de agentes policiais;
e) desídia da delegatária, na qualidade de Escrivã Judicial de Lábrea-AM, nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Ato Administrativo c/c
Pedido de Tutela Cautelar de Urgência, processo n.º 0601168-42.2022.8.04.5300.
Foto: divulgação