Selma Baçal, nossa luta e os sonhos que ainda vivem

Leia neste artigo a história de Selma e de outros que se foram. Lúcio Carril escreve: "A Selma se foi, ontem, mas nossos sonhos continuam vivos e sua luta servirá de exemplo, sempre."

Ednilson Maciel, por Lúcio Carril*

Publicado em: 28/08/2023 às 17:40 | Atualizado em: 28/08/2023 às 17:40

28 de agosto de 1981.

Vivíamos sob a ditadura militar. No Governo do Amazonas, José Lindoso.

Eu tinha 15 anos e desde 1980 já vinha participando da luta política de resistência democrática.

No início da campanha da meia-passagem, reconstruímos a União dos Estudantes Secundaristas do Amazonas – Uesa. Eu e Selma fizemos parte da comissão de pesquisa histórica da entidade. Nos enfurnamos por meses na biblioteca pública do estado, metidos no meio de jornais antigos.

Em 1981, a meia-passagem era por empresa de ônibus. O estudante comprava os passes estudantis para ser usado em determinada empresa e não podia passar em outra.

Resolvemos iniciar a campanha do passe-único.

No dia 28 de agosto de 1981, marcamos um ato público na praça São Sebastião. Éramos, secundaristas e universitários, cerca de 100 estudantes.

As polícias militar e civil cercaram a praça, prenderam o carro-som.

Fomos para frente da igreja de São Sebastião.

Sandro Baçal (professor da Ufam, falecido), irmão da Selma, sobe nas escadas da igreja e começa a discursar, com o público repetindo.

Não chegou a cinco minutos de discurso. A polícia partiu pra cima, batendo, invadiu a igreja, com cassetetes e armas, tiros foram disparados dentro do templo.

Ao sair correndo da igreja, levantei os braços. Era um garoto magro e alto. A polícia não quis saber: começaram a me espancar com cassetetes. Corri. Já quase livre, correndo na rua 10 de julho, ao lado do Teatro Amazonas, ouvi o comando: atira nele. Parei e policiais me jogaram num camburão.

Comigo, Antonio Pelizzetti (hoje, bioquímico. Mora em Boa Vista – RR), Marivon Barbosa e Mara, Ociney (já falecido), o jornalista Montezuma, uma criança de aproximadamente 11 anos e o Sávio, um guerreiro e meu amigo inseparável. Estava muito machucado do espancamento dentro da igreja (Sávio já se foi, também).

Num momento que abriram o camburão, o Senador Evandro Carreira (já falecido) gritava para não baterem “nas crianças”. Puxou o Pelizzetti do camburão. Jogaram o senador em outra viatura.

Chegamos na Dops. Nos mandaram encostar numa parede. O senador Evandro Carreira chega, nervoso, e partiu para a sala do delegado, comigo, o Vicente Filizzola, hoje presidente da Força Sindical no Amazonas, e outros companheiros presos.

Evandro colocou o dedo na cara do delegado e disse: seu poltrão, você bate em crianças, mas venha bater num homem e foi tirando o paletó, quando Filizzola Interveio pedindo calma. O delegado Adelson Melo (já falecido) ficou sem um pingo de sangue na cara.

Fomos liberados, depois de fichados na Dops.

A Selma se foi, ontem, mas nossos sonhos continuam vivos e sua luta servirá de exemplo, sempre.

  • O autor é Sociólogo