A tapioca nossa de cada dia
Uma leitura saborosa sobre a gastronomia local e sua importância cultural.

Diamantino Junior
Publicado em: 05/08/2023 às 18:10 | Atualizado em: 05/08/2023 às 18:29
Por Dassuem Nogueira*’
O café regional é um dos cartões de visitas de nossa cidade. Mas, como foi que as comidas dos roçados dos interiores amazônicos viraram uma marca de Manaus?
Em quase todas as esquinas, se veem pontos de venda das iguarias que convencionamos chamar de café regional. Composto por café, leite e pão, os elementos nacionais; e pelos regionais, como tapiocas, tubérculos como o cará e a macaxeira, as bananas fritas e cozidas; o pé de moleque; frutos da floresta, como tucumã e pupunha.
E o trio mais amado, formado por banana pacovã frita, queijo coalho e tucumã.
Se no pão, é chamado de x-caboquinho; se na tapioca, é caboquinha.
Para todos os bolsos, há casas especializadas, hotéis, mercados públicos, em feiras nos bairros, padarias, mesas em frente as casas e barracas que se erguem e, em seguida, se desmontam nas ruas e meios fios.
Para todos os dias, há os pontos de venda que atendem ao fluxo do cotidiano da cidade, como o de trabalhadores, turistas e estudantes.
E há os pontos que funcionam apenas nos fins de semana.
Para todas as horas, é possível ainda comprar os elementos soltos. Por exemplo, nos sinais de trânsito, comumente encontramos a banana verde frita que se vende ensacadas em bacias de alumínio sobre as cabeças dos vendedores, os cachos de sacolas de broas de goma de tapioca e as sacolas de pupunha cozida, quando estão na época.
Há tapiocas doces cuja massa é misturada com coco ralado. Essas são iguarias típicas de ambulantes nas feiras de bairros e, interessantemente, dos terminais de ônibus.
Para horas específicas, como a da merenda da manhã ou da tarde, há os mingauzeiros.
Essa categoria de ambulante percorre determinados trajetos levando carrinhos de mão com duas grandes panelas contendo mingau de banana e munguzá. Existindo então a “hora do mingauzeiro passar”.
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Do interior para a capital
A saber, até o final de 1990, os cafés regionais eram vivências de fim de semana, para se ter em cidades famosas por seus balneários, como Rio Preto da Eva e Presidente Figueiredo.
Pela virada do século, as barraquinhas de café da manhã se espalharam pela capital.
Não à toa, é também nessa época que completamos um ciclo geracional pós-distrito industrial, ou seja, trinta anos.
Atraídos pelos postos de trabalho nas fábricas, na virada de 1960 para 1970, milhares de amazonenses do interior foram para a capital.
Esses trabalhadores foram atrás do sonho de uma vida operária. E de Manaus, passaram a acompanhar as safras dos roçados pelo comércio.
Em trinta anos, Manaus já concentrava metade da população do estado. As novas gerações, em maioria, nascidas e crescidas já na capital, herdaram o paladar familiar.
Desse modo, a ampliação e crescimento da cultura do café regional na capital são expressão de uma cultura alimentar que remete à produção dos roçados amazônicos e dos frutos da floresta.
Pode comer sem culpa
Contudo, o gosto pela comida da floresta tampouco passa sem modificações.
O comércio dessas iguarias no cotidiano das ruas, em geral, incrementa gordura, sal e açúcar para ser mais atraente para a clientela.
Por exemplo, o mingau de banana verde é, absolutamente, nutritivo. Mas, nas ruas, é incrementado com os mal falados leite condensado e creme de leite.
Nos carrinhos de mingaus, atualmente, é possível encontrar ainda farinha láctea como cobertura.
Contudo, para o nutricionista Leonardo Batista, nenhum alimento deve ser vilanizado.
Ele diz que, mesmo um copo de mingau com leite condensado que, preparado desse modo, tem cerca de 600 calorias, pode ser ingerido sem culpa.
Tudo depende do contexto. Se consumido após uma atividade física intensa, por exemplo, ele será bem vindo.
Para Leonardo, nenhum alimento sozinho é capaz de comprometer uma dieta saudável.
É uma questão de equilíbrio. E de conciliar uma alimentação equilibrada com a prática de exercício físicos.
Assim, obtido o aval do “nutri”, como são carinhosamente chamados os profissionais da nutrição, vamos comer em paz nosso x-caboquinho.
*A autora é antropóloga
Fotos: Dassuem Nogueira/especial para o BNC Amazonas