Grandioso espetáculo para poucos assistirem

Os bois de Manaus têm se aprimorado a cada ano, sensivelmente, adotando fórmulas que vemos nos espetáculos de Parintins

Ferreira Gabriel, por Dassuem Nogueira*

Publicado em: 30/07/2023 às 16:12 | Atualizado em: 30/07/2023 às 16:12

Ontem (29), no sambódromo, apresentaram-se os bois Galante, Corre Campo e Garanhão na disputa que encerrou o 65º Festival Folclórico do Amazonas.

As apresentações se iniciaram com um atraso de meia hora, às 20:30, que não foi explicado ao público presente.

Os bois têm se aprimorado a cada ano, sensivelmente, adotando fórmulas que vemos nos espetáculos de Parintins, como a divisão em dois momentos: celebração folclórica, onde se apresentam os elementos da fazenda do boi, seguido de um momento tribal, onde se apresentam os elementos indígenas.

Contudo, se diferenciam na manutenção de elementos que lhes caracteriza, como o poético cordão de rapazes que seguem os vaqueiros. Entre estes, quase não se vê mais o passinho malandro dos antigos, semelhante ao do bumba-meu-boi maranhense.

Adotou-se o dois-pra-lá-dois-pra-cá do boi parintinense. Contudo a sua presença, sempre de chapéu, linda vestimenta e botas brancas, é expressão única da poesia do boi de Manaus.

Outra marca dos bois manauaras é a encenação do auto do boi. Nesse sentido, eles superaram os de Parintins, que nunca conseguiram solucionar a sua manutenção no espetáculo.

Os bois da capital fazem desse momento, tão fundamental, uma graça.

Nesse sentido, vale ressaltar que a participação dos atores de teatro da capital na execução e/ou direção desses momentos, certamente, leva o momento para um nível acima de sofisticação.

Lamentavelmente, ainda se apresentam recursos cênicos que conduzem a ridicularização dos traços negros de Pai Francisco e Mãe Catirina, o black face.

O boi Galante apresentou seus rostos pintados de tinta preta e o boi Corre Campo apresentou Mãe Catirina com peruca black power.

Rosa Malagueta, celebrada e conhecida atriz amazonense, tem cabelos ondulados/cacheados e não haveria qualquer incoerência em apresentá-los ao natural.

Então qual a necessidade de ressaltar esse traço? Por que o boi Galante não colocou componentes negros para representar personagens negros?

Contudo, outros discursos como a adoção da distinção de gênero no tratamento de juradas e jurados, também se viu com boa condução.

E parece haver um movimento de adesão do termo povos originários no lugar do ultrapassado “tribos”.

O boi-bumbá Galante abriu a noite com uma homenagem a Amazonino Mendes.

O tema “Amazonas menino” apresentou-se sensivelmente menor que os que vieram em seguida, em tamanho de alegorias e número de componentes. Contudo, apresentou-se alegre.

Houve um notável problema na aparelhagem de som que deixava incompreensível as toadas e as falas do apresentador, comprometendo sua apresentação. A não ser, claro, que a comissão julgadora receba outro tipo de som.

O boi-bumbá Corre Campo, que ostenta o pentacampeonato, ao contrário, encheu a arena e apresentou-se sem falhas na condução do tema defendido, “O boi do Brasil”.

Na arquibancada, era o maior número de camisas. Contudo, teve problemas no item alegoria. Ou as alegorias de fundo do momento tribal foram programadas para fazer mais movimentos, que não aconteceram. Ou apresentou alegorias que, embora grandes e bem acabadas, não surpreenderam.

Além disso, lamentavelmente, uma alegoria incendiou diante dos jurados, sendo habilmente retirada pelos montadores e as chamas foram apagadas pelos bombeiros na mesma velocidade em que se espalhou.

Porém, destacou-se a perspicácia do apresentador que imediatamente lançou no microfone que aquelas eram “as chamas do folclore popular”.

Aliás, cabe colocar que por ocorridos como esse, o chamado “fogo frio”, que principiou o incêndio, não é mais permitido no festival de Parintins.

O boi Garanhão também veio grandioso. Assim como o Galante, teve problemas de som, mas apenas no início da apresentação. Quem estava no chão, via o levantador de toadas João Carlos, tal qual Tim Maia, clamando pelo retorno.

No entanto, o boi de Educandos se destaca, justamente, pelas melodiosas composições que lhe dão uma identidade musical própria.

Chama atenção ainda que os bois tenham encontrado soluções inteligentes quanto ao limitado orçamento.

Nas apresentações, nota-se a presença das danças que competem em outras categorias, como quadrilhas, cangaço e danças internacionais.

Assim, otimizam dinheiro, pois os figurinos são utilizados em diferentes apresentações, e tempo, pois otimizam o entrosamento que só é alcançado com tempo de ensaio.

Fortalecem-se uns aos outros. E nossos olhos de expectadores, agradecem.

Contudo, o público foi aquém do esperado. Talvez pela mudança do endereço, distante de suas comunidades dos bois na zona sul.

Ou pelo não investimento em proporcionar a sua participação, como disponibilizar condução. Em anos anteriores, na arena do centro cultural Povos da Amazônia, o público se fez presente. Neste ano, na arquibancada aberta aos expectadores, viu-se predominantemente os componentes dos próprios bois assistindo a si mesmos.

O que é realmente lamentável. Pois, o que foi apresentado, merecia ser visto por mais pessoas.

Confira as fotos:

Fotos: Dassuem Nogueira/especial para o BNC Amazonas