Acelen denuncia Petrobras ao Cade por discriminar concorrentes
Pedido de liminar preventivo alega que a estatal está violando a isonomia, vendendo produto 10% mais caro às refinarias privadas

Antônio Paulo, do BNC Amazonas em Brasília
Publicado em: 26/05/2023 às 18:56 | Atualizado em: 27/05/2023 às 07:32
O presidente da Acelen, Luiz de Mendonça, resolveu denunciar e abrir a “caixa preta” da venda de petróleo, pela Petrobras, às refinarias concorrentes no Brasil.
A Acelen é a segunda empresa do mundo em refino de petróleo e que está em mais de 70 países. Foi criada após a compra da refinaria de Mataripe, na Bahia, pelo fundo de investimento árabe Mubadala.
Pelo fato de a Petrobras vender o petróleo 10% mais caro às refinarias privadas, conforme Mendonça, a Acelen entrou com pedido de liminar preventiva no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra a estatal, alegando que, segundo a denúncia, está violando a isonomia da concorrência.
Caso a Acelen vença no Cade, outras refinarias privadas do país, que podem estar sofrendo a mesma pressão da Petrobras, poderão se beneficiar da decisão.
Um dos exemplos é a Ream (Refinaria da Amazônia), responsável pela gestão da tradicional Refinaria Isaac Sabbá, mais conhecida como Refinaria de Manaus (Reman), comprada pela empresa amazonense Atem no fim do ano passado.
Em entrevista ao jornal Estadão, Mendonça disse esperar urgência na decisão do Cade sobre a venda de petróleo pela Petrobras às refinarias privadas.
Para ele, a situação atingiu o limite visto que põe em risco o crescimento do setor de refino no Brasil, inclusive os investimentos de R$ 12 bilhões em uma nova fábrica de biocombustíveis, anunciados pela empresa em abril.
Para ele, o diálogo com a estatal se esgotou e, agora, cabe ao órgão da concorrência decidir se o país tem ou não regras claras de competição, uma decisão que pode afetar sua imagem.
“Ela [a Petrobras] é o competidor dominante, somos os agentes da ponta e estamos sendo apertados no petróleo. Portanto, a gente não tem como escapar de comprar da Petrobras”, afirmou Mendonça à repórter Denise Luna, do Estadão, nesta sexta-feira (26).
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Pedido ao Cade
O pleito da Acelen, no Cade, não é pagar mais barato, diz o presidente da companhia. “A discussão é: tem uma empresa dominante no mercado de petróleo e essa empresa é meu concorrente. Por isso, o Cade tem de garantir que haja isonomia de preços”.
Ele disse ainda que, além disso, já existem precedentes na própria indústria. Segundo Mendonça, no passado, quando a BR Distribuidora era da Petrobras, a estatal praticava para os concorrentes da BR Distribuidora o mesmo preço em derivados que ela tinha com sua própria empresa.
“Portanto, é isso que nós queremos: transparência e isonomia de preços. Porque nessas condições eu vou ser – com os investimentos e com a agilidade que a gente tem mostrado – mais competitivo. Estou sendo competitivo, aumentei a capacidade de produção e tenho uma política de preços dinâmica”, afirmou Mendonça.
Motivos da denúncia
O ceo disse que, desde o primeiro dia em que a Acelen assumiu a refinaria de Mataripe, o diálogo sempre existiu e a empresa sempre indicou à Petrobras, pela avaliação e os dados que dispunha, que estava sendo discriminada na compra do petróleo para ser refinado.
“A gente tentou o diálogo, mas não avançamos e estamos agora solicitando ao Cade que intervenha com a maior brevidade possível, para dizer quais são as regras que a empresa dominante deveria obedecer”, afirmou o ceo da Acelen.
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Sem preço definido
Mendonça reconhece que, no acordo de compra da refinaria, não tinha preço definido, mas ficou claro que a companhia privada estava pagando mais caro.
Daí, segundo ele, a direção indicou que o valor pago estava fora, por isso, houve negociação todo mês.
“Não dá para abastecer uma refinaria brasileira só com o petróleo importado. A Petrobras é o competidor dominante, tem 70% da produção brasileira, mas cerca de 90% da comercialização do petróleo no Brasil acaba passando pela Petrobrás. É um fato que não tem como escapar. Não se opera uma refinaria no Brasil sem contar com o petróleo da Petrobras”, disse Mendonça na entrevista ao Estadão.
Discriminação evidente
Segundo Mendonça, a cobrança de preço mais alto do petróleo às refinarias privadas do que dentro das refinarias da própria Petrobras já era evidente. Por isso, a Acelen coletou elementos que demonstraram uma política discriminatória de preços, inclusive com dados publicados pela própria Petrobrás, segundo ele.
“O mais flagrante de todos foi a publicação de dois preços de transferência da Petrobras, com diferença gigantesca. Ela estava vendendo para suas próprias refinarias a um preço muito abaixo do que ela vende para a Acelen.
Ou seja, ela é o competidor dominante, somos os agentes da ponta e estamos sendo apertados no petróleo, que a gente não tem como escapar de comprar da Petrobras”, disse o executivo.
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Negociação sem sucesso
O ceou da refinaria de Mataripe diz que está aberto ao diálogo e em negociação constante com a Petrobras, mas não houve sensibilização por parte da estatal, por isso a Acelen entrou com o pedido de investigação junto ao Cade, iniciada em 2022.
Na avaliação de Mendonça, é urgente a decisão do conselho porque a situação está chegando a um ponto que a companhia privada poderá reduzir a carga da refinaria e começar a rever investimentos.
Papel do Cade
Mendonça também disse o porquê de procurar o Cade: tem um papel muito relevante por ser a agência que regula o direito concorrencial.
“É a agência que, por natureza, tem de dizer como os diversos agentes devem se comportar e é isso que a Acelen está pedindo: que esclareça e, caso não haja definição clara, será ruim para o país que poderá poder atratividade de investimentos”.
E complementou:
“Não cabe a nós especular, mas gostaria [que a decisão] saísse amanhã, é urgente. O tema é muito importante e traz instabilidade de mercado, uma imprevisibilidade. A gente fez os primeiros investimentos na refinaria sobre certas premissas. Principalmente a livre concorrência no refino brasileiro. Se essa premissa não for garantida pelo Cade, temos um problema e aí vamos avaliar todas as alternativas. Mas se eu reduzir carga vai ser ruim, vai ter que ter mais importação de produtos, há uma perda de competitividade no mercado, e pode até ter risco de desabastecimento”, disse Mendonça.
Leia a entrevista na íntegra no Estadão
Foto: Divulgação