O mito da ineficiência do Estado

"A burguesia nacional procura, na verdade, esconder a sua própria ineficiência e seus roubos"

O mito da ineficiência do Estado

Neuton Correa, Aldenor Ferreira*

Publicado em: 25/03/2023 às 03:59 | Atualizado em: 07/06/2023 às 20:25

É comum hoje, no Brasil, vermos pessoas se posicionando contra o Estado. Os discursos são sempre os mesmos: “o Estado é ineficiente, burocrático e oneroso demais para o conjunto da sociedade”. A antítese disso seria a iniciativa privada, o mercado, concebido por aqui como o suprassumo da eficiência. 

Todavia, abundam no Brasil, em vários segmentos da economia, exemplos de má gestão, de corrupção, de trabalho escravo, de fraudes e outras maldades capitaneadas pela iniciativa privada. O último escândalo de grande vulto foi o das lojas Americanas, uma maracutaia contábil digna de um seriado norte-americano. 

Os liberais brasileiros, salvo as exceções, não têm nada de liberais, são picaretas, hipócritas e sugadores das tetas do Estado. Criticam qualquer ação promovida pelo governo que vá na direção da criação de um Estado do Bem-Estar Social com políticas sociais de inclusão para garantir os direitos fundamentais do(a) cidadão(ã). Como bons papagaios de pirata, eles(as) repetem frases feitas indiscriminadamente, sem o menor pudor e sem o mínimo de embasamento político, econômico e histórico.

Os mentecaptos liberaloides nacionais desconhecem o papel civilizador do Estado não apenas no Brasil, mas no mundo. No caso do Brasil, não sabem, por exemplo, que foram as ações do Estado que proporcionaram à nossa nação – que passou quatro séculos e meio assentada no modelo agroexportador monocultor – a oportunidade de se industrializar e crescer de forma contínua por cerca de cinquenta anos seguidos. 

O Brasil só se tornou uma potência agrícola e industrial, chegando a figurar entre as seis maiores economias do mundo, por conta dos investimentos feitos pelo Estado Nacional. A mão bem visível do Estado criou grandes companhias como: a Petrobras, a Eletrobras, a Vale do Rio Doce, a Companhia Siderúrgica Nacional. Também criou instituições de pesquisa de ponta como a Embrapa, o INPA, o INPE e outras. 

Todas as grandes obras de infraestrutura do país foram financiadas e realizadas pelo Estado. Recordemos brevemente algumas: Ponte Rio-Niterói, Hidrelétrica de Itaipu, Transposição do Rio São Francisco, Ferrovia Norte-Sul, Usina Nuclear de Angra, dentre outras.

Poderíamos ainda elencar dezenas de portos, aeroportos, outras ferrovias, hidrovias etc. É importante ressaltar, ainda, que foram os investimentos estatais que deram à Petrobras a hegemonia da tecnologia de prospecção de petróleo em águas profundas.  

Nesse sentido, não é verdade que o Estado seja sinônimo de ineficiência. Não mesmo. No campo da educação e da produção de ciência e tecnologia, por exemplo, os melhores índices são das universidades e institutos de pesquisa públicos, ou seja, entidades que são mantidas diretamente pelo Estado. 

Certamente, há problemas, não se pode negar isto, porém, é leviano atribuir ao Estado Nacional brasileiro todos os males do mundo, assim como é mau-caratismo atribuir à iniciativa privada o sentido de eficiência irrestrita. 

Quanto a este ponto, cabe o seguinte questionamento: se a iniciativa privada é, de fato, o reino da eficiência administrativa, o que houve com a Mesbla, com o Bamerindus, com a Varig, com a Sharp e tantas outras empresas nacionais que simplesmente faliram ou foram vendidas para outros grupos empresariais?

Desta forma, guardadas as devidas proporções, é um mito a tal da eficiência da iniciativa privada no Brasil. Pelo contrário, no geral, este setor é pouco eficiente. Na verdade, o capitalismo brasileiro como um todo é ineficiente e parasitário.

Neste âmbito, a burguesia nacional agrária e urbana, ao criticar duramente qualquer ação do Estado brasileiro que aponte para a construção de uma nação justa, inclusiva, livre e plural, assim o faz porque o seu interesse é continuar saqueando o erário, drenando os recursos públicos por meio de isenções fiscais, juros reduzidos, perdões de dívidas, renegociações, dilações de prazos, amortizações etc.

Ainda, ao atacar o Estado e a sua suposta ineficiência, a burguesia nacional procura, na verdade, esconder a sua própria ineficiência e seus roubos. Não é difícil demonstrar isto. É só observarmos o caso das lojas Americanas. 

Os três maiores executivos desta companhia eram tidos como ícones do empreendedorismo e da carreira de sucesso no país. Eles também eram e ainda são defensores do livre mercado e do Estado mínimo, porém, na realidade, são fraudadores do próprio Estado e já deveriam estar presos. 

Em resumo, como bem apontou Jessé Souza no texto A classe média no espelho, o que busca a burguesia nacional é a reprodução de seus privilégios de classe, sejam eles positivos ou negativos. Neste sentido, o caminho mais curto para se atingir este objetivo é a satanização constante do Estado brasileiro e a repetição ad nauseam da eficiência da iniciativa privada e do mercado. Uma mentira, portanto! 

Sociólogo*Arte: Gilmal