Diante do genocídio Yanomami, o mercado se calou

"O tal mercado é assim mesmo. Não se comove, não chora, não se importa com a vida de ninguém, apenas com os seus próprios interesses."

Diamantino Junior

Publicado em: 28/01/2023 às 08:48 | Atualizado em: 28/01/2023 às 09:14

Diante do genocídio Yanomami, provocado pela omissão do Estado brasileiro na gestão de Bolsonaro, o mercado financeiro se calou. Não houve protestos duros e ameaçadores como aqueles que ocorreram quando o presidente Lula disse que responsabilidade fiscal não poderia estar acima da responsabilidade social.

O tal mercado é assim mesmo. Não se comove, não chora, não se importa com a vida de ninguém, apenas com os seus próprios interesses. Na verdade, mercado é apenas uma palavra guarda-chuva que serve para abrigar e esconder pessoas de carne e osso que operam diariamente milhões de dólares em transações financeiras pelas bolsas de valores do mundo todo.

O mercado, inclusive, é visto hoje como uma instituição que extrapola os limites das trocas comerciais. Essa suposta instituição social tem o poder de ditar normas e valores sociais, econômicos, políticos e culturais do país. Tem também o poder de derrubar governos e fazer ascender ao poder pessoas desumanas como Fernando Collor de Melo e Jair Messias Bolsonaro.

Por isso, afirmo: o mercado é uma farsa!

No caso do Brasil, o tal mercado esconde uma burguesia reacionária, mesquinha, atrasada e antipatriota. É a famosa “elite do atraso”, para citar, aqui, o texto do professor Jessé Sousa, que sempre foi antipovo. É ela – representada na bolsa de valores – que “reage mal” às declarações do presidente Lula acerca do combate à fome e à miséria no país, mas que se cala diante do genocídio de um povo dentro de seu próprio país.

Na verdade, o legítimo sentimento por detrás desse silêncio, que move de fato esse comportamento, está alicerçado numa ideia colonial mofada acerca dos povos indígenas. Essa ideia, já cristalizada na mente da elite econômica nacional, é a de que os índios não são seres humanos como eles. No limite, para a “elite do atraso”, índios são seres humanos de segunda categoria, um povo selvagem, atrasado e sem alma.

Esse pensamento colonial, classista, racista e anacrônico se materializa reiteradamente naquilo que se convencionou chamar de “humor do mercado”. Nesse âmbito, o “mercado reage mal” a qualquer medida que possa afetar a drenagem de recursos públicos por essa parcela pequena da sociedade brasileira. Por outro lado, pessoas que morrem de fome, de doenças tratáveis e curáveis, que são escravizadas e vulnerabilizadas, não os afeta de maneira alguma.

A visão de mundo e de Brasil da “elite do atraso”, dona do tal mercado, é predominantemente fascista-neoliberal-neopentecostal e vê os povos indígenas como os verdadeiros entraves ao desenvolvimento econômico do país. É comum ouvirmos da boca de gente abastada as frases: “índio atrapalha o progresso”, ou “índio é um brasileiro como qualquer outro” e, por isso, não pode ter “nenhum tipo de privilégio”.

Nesse âmbito, diante do holocausto Yanomami, salta da garganta da alta burguesia nacional e de seus apaniguados políticos a frase: “e daí?”. De fato, a morte alheia não os comove. O mercado não derramou nenhuma lágrima e, muito provavelmente, nenhum recurso financeiro foi disponibilizado para a ajuda humanitária.

Há setores perversos dentro dessa burguesia de herança escravocrata. Diante de genocídio Yanomami, as operações financeiras milionárias, as fraudes contábeis, os subornos, continuam ocorrendo normalmente sem nenhum tipo de afetação.

Eles são indiferentes às perdas e ao sofrimento de outrem, já que suas respectivas personalidades foram forjadas em um ambiente de egoísmo, fanatismo, cinismo e mau-caratismo. Como dito, o mercado, tomado como um conceito genérico, esconde um povo que é mau, com elevado grau de sadismo.

Isso explica, em parte, o ladrar como cães ferozes diante de uma fala enérgica do presidente Lula visando o combate à fome no país, mas um silêncio sepulcral diante do sofrimento Yanomami.

O lado esperançoso dessa história é que o novo governo já está agindo para pôr fim a essa tragédia humanitária. Contudo, é importante ser registrado que, diante do genocídio Yanomami, mais uma vez, o mercado se calou.

Aldenor Ferreira,

Sociólogo.

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