Lula e a derrota dos profetas de Baal
Não é de hoje que esses falsos profetas que, na verdade, não são nada além de mercadores da fé, são desmascarados

Neuton Correa, Aldenor Ferreira*
Publicado em: 05/11/2022 às 00:05 | Atualizado em: 09/11/2022 às 11:01
Na disputa eleitoral de 2022, Luiz Inácio Lula da Silva não venceu apenas Jair Bolsonaro. Ele venceu e desmascarou também dezenas de falsos profetas evangélicos e católicos que haviam antevisto a sua derrota. Sua vitória é, portanto, um duro golpe nos “profetas de Baal” da contemporaneidade.
Não é de hoje que esses falsos profetas que, na verdade, não são nada além de mercadores da fé, são desmascarados. O(A) leitor(a) deve se lembrar de que no início da pandemia de Covid-19 muitos deles também profetizaram que essa doença não traria impacto algum sobre a população e a economia brasileira. Eles contribuíram, dessa forma, para a negação da vacina e das demais medidas sanitárias recomendadas pelas autoridades brasileiras.
Foi tudo trapaça!
Na verdade, esses falsos profetas cristãos evangélicos e mesmo católicos são perversos, são homens e mulheres maus, cruéis, falaciosos, sem temor a Deus e sem amor no coração. Como dito, são verdadeiros profetas de Baal. São divindade dos diversos povos que habitavam a terra de Canaã, descrito tão bem pelo profeta Oseias e, também, pelo livro dos Reis do Antigo Testamento.
Vamos contextualizar. Pode-se dizer que, no âmbito dos estudos sobre a cultura e a religião dos povos que habitavam a antiga terra de Canaã (cananeus, jebuseus, amorreus, heveus e girgaseus, entre outros), região do Oriente Médio hoje, não há consenso acerca do significado da palavra Baal. Alguns o interpretam como sendo um substantivo que remete à ideia de senhor, outros afirmam que se trata de um deus propriamente dito, nesse caso, Baal, filho de Dagon, deus das sementeiras, aludindo à fertilidade.
Logo após a morte do rei Salomão, o riquíssimo reino de Israel foi dividido em reino do Norte, cuja capital passou a ser a cidade de Samaria, e o reino do Sul, que passou a ter Jerusalém como capital. É de amplo conhecimento entre os historiadores e teólogos bíblicos que os reis do Norte profanaram o culto do Deus de Israel, introduzindo na liturgia práticas pagãs e deuses de religiões dos povos que habitavam Canaã.
Nesse ambiente, o rei mais profano foi Acabe. Ele não apenas construiu um santuário para Baal na cidade de Samaria, como ainda se casou com uma mulher cananeia perversa chamada Jezabel, que perseguiu e matou centenas de profetas israelitas, o que era intolerável, uma abominação ao Deus daquele povo.
Não há espaço nem a intenção de aprofundar essa discussão neste momento, o que interessa aqui é dizer que o culto a Baal representava a antítese do culto ao Deus de Israel, e contava com uma legião de adoradores e de sacerdotes. Interessa, ainda, dizer que os profetas de Baal, no reinado de Acabe, eram patrocinados pelo próprio reino, ou seja, recebiam todos os recursos necessários para a sua livre pregação e adoração do Estado, vivendo às custas do rei.
Nesse contexto, é conhecido o episódio em que o profeta Elias desafia 450 profetas de Baal e vence-os de forma triunfal, humilhando-os. O livro 1º de Reis, 18:23-24 registra que, depois de enorme perseguição e assassinato dos profetas israelitas feita por Jezabel, Elias se dirige ao rei e ao povo e diz:
“Dêem-se-nos, pois, dois bezerros, e eles escolham para si um dos bezerros, e o dividam em pedaços, e o ponham sobre a lenha, porém não lhe coloquem fogo, e eu prepararei o outro bezerro, e o porei sobre a lenha, e não lhe colocarei fogo. Então, invocai o nome do vosso deus e eu invocarei o nome do Senhor; e há de ser que o deus que responder por meio de fogo esse será Deus”.
Os próximos versículos revelam que os profetas invocaram Baal desde a manhã até o meio-dia, porém não obtiveram nenhuma resposta. Enquanto isso, Elias zombava deles e pedia que eles se esforçassem mais, pois não estava funcionando o seu clamor. Eles clamaram mais alto, cortaram o seu próprio corpo, derramaram o próprio sangue, mas nada acontecia. Passaram quase o dia inteiro sem resposta, mesmo com muita oração e clamor.
Ao final do dia, Elias invoca o seu Deus, o Deus de Israel, conforme o combinado, e é prontamente atendido. O fogo consome tudo, a lenha, o bezerro e o próprio altar, não sobrando nada.
Moral da história.
De acordo com a narrativa bíblica, os profetas de Baal não foram atendidos porque eram falsos profetas. Eles adoravam um falso deus e ainda perseguiam e assassinavam os profetas do Deus verdadeiro de Israel. Foram humilhados em praça pública, quatrocentos e cinquenta deles contra apenas um homem e ainda assim não obtiveram êxito.
O(A) leitor(a) pode, então, questionar o que isso tem a ver com a eleição de Lula? A isso respondo da seguinte forma: apenas pelas minhas contas, pelo menos cinco lideranças evangélicas de grande influência nacional profetizaram a vitória de Bolsonaro no pleito de 2022.
Eles oraram, clamaram, jejuaram, se ajoelharam e foram além, à semelhança de Acabe, transformaram o culto ao Deus de Israel (que é o mesmo Deus dos cristãos evangélicos e católicos de hoje) em culto a Bolsonaro; transformaram a igreja, a casa de Deus, em comitê de campanha de Bolsonaro; e perseguiram opositores e dissidentes, expulsando do templo pessoas que não concordavam com aquelas práticas e manifestações.
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Apesar de (ou até por causa de) tudo isso, eles não foram atendidos.
Deus não ouviu as suas orações, não recebeu os seus sacrifícios nem se agradou de seus cultos. Como os profetas de Baal, esses cinco pastores evangélicos, pseudoprofetas, foram humilhados em praça pública. Edir Macedo, que compõe esse grupo e é abertamente um defensor de Bolsonaro, chegou a dizer em vídeo que no dia 30 de outubro saberíamos quem era o Deus verdadeiro.
Em resumo: a eleição de 2022 provou que há, hoje, no meio evangélico e católico brasileiro, falsos profetas, falsos pastores que seguiram e prestaram culto a um falso deus, a um falso messias. Todavia, todos eles foram derrotados por Luiz Inácio Lula da Silva e pelo povo verdadeiramente de bem desse país.
*Sociólogo
Arte: Gilmal