Eles precisam patrocinar!
Grandes marcas estão instaladas no Amazonas, com ajuda fiscal, mas não patrocinam o futebol amazonense

Neuton Correa
Publicado em: 04/09/2021 às 08:17 | Atualizado em: 24/09/2021 às 17:48
Aldenor Ferreira*
No início de agosto, a Prefeitura de Manaus lançou um edital destinando 1,3 milhão de reais ao patrocínio dos clubes manauaras que disputam o campeonato brasileiro de futebol masculino.
Certamente, essa é uma ação importante e digna de louvor, uma vez que, sem patrocínio, não há qualquer possibilidade de êxito em esportes de alto rendimento.
Talvez o prefeito Davi Almeida tenha feito a mesma pergunta que eu faço já há alguns anos e que replico a seguir.
Por que a cidade de Manaus, que abriga o maior polo eletroeletrônico da América Latina, que tem uma moderna arena esportiva e clubes seculares, não tem, atualmente, um clube na série A do campeonato brasileiro?
A história do futebol na cidade de Manaus é secular. Aliás, essa história foi muito bem registrada por Gaspar Vieira Neto no livro Memórias do esporte bretão caboclo: os primórdios do futebol no Amazonas.
Resumidamente, o autor explica que essa história tem início nas primeiras décadas do século XX, entre os anos de 1903 e 1914, com o surgimento de alguns clubes de futebol na cidade.
Em sua ampla pesquisa – realizada em periódicos da cidade de Manaus devidamente arquivados no Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA) –, Neto menciona vários clubes manauaras do início do século XX.
Os nomes principais são: Manáos Athletic Club, Racing Club Amazonense, Sport Club Foot-Ball Manáos, Brasil Foot-ball Club, Reserve Club, Guarany Foot-ball Club e o International Team.
Diante disso, podemos nos perguntar: todos os clubes tinham nomes em inglês? Sim, essa era uma tendência na época. Naquele período, o “porto de lenha (Manaus) achava que era Liverpool”, parafraseando o poeta Torrinho.
No desenvolvimento ulterior desse esporte na região, muitos clubes desapareceram e outros surgiram, principalmente a partir de desentendimentos e rachas de clubes que já existiam.
Esse é o caso, por exemplo, do Nacional Fast Clube, popularmente conhecido como Fast, fundado em 1930, a partir de desentendimentos dentro do Nacional Futebol Clube.
Por sua vez, o Nacional Futebol Clube foi fundado em 13 de janeiro de 1913. Neste mesmo ano, no mês de novembro, foi fundado o Atlético Rio Negro Clube e, em novembro de 1918, surge o São Raimundo Esporte Clube.
Feito esse breve histórico dos principais clubes manauaras, surge uma segunda questão: o que ocorreu nas últimas décadas para que eles deixassem a série A do futebol nacional ou mesmo a série B?
Para início de conversa, o futebol mudou, se profissionalizou e tudo ficou absurdamente mais caro nesse meio, com os clubes que já possuíam estrutura e renome nacional alcançando melhores ranqueamentos, participando de maiores cotas de televisão e melhorando suas chances de aquisição de patrocínio.
Além disso, com a redução do número de clubes participantes na antiga primeira divisão, hoje série A, que em 2006 chegou a 20 clubes apenas, atingindo também a série B, foi preciso enfrentar uma acirrada concorrência, que exigia ainda mais um bom aporte financeiro para deixar seus times competitivos. Entretanto, eles não dispunham desse aporte.
Os investimentos não foram suficientes para dotar os clubes manauaras de uma infraestrutura que pudesse fazer frente à de outros clubes nacionais, deixando-os cada vez mais distantes da elite do futebol nacional.
Neste ponto surge, por fim, uma terceira questão: no caso dos clubes manauaras, esses investimentos poderiam vir de quem há décadas enriquece e aumenta seus capitais no solo Baré?
Refiro-me, fundamentalmente, às grandes empresas nacionais e/ou estrangeiras sediadas no Polo Industrial de Manaus (PIM), que recebem incentivos fiscais federais e estaduais para se instalarem na cidade, ganhando competividade nacional e internacional a partir disso.
Ocorre que incentivo fiscal nada mais é do que dinheiro público investido diretamente ou renunciado (renúncia fiscal). Logo, faz sentido que haja contrapartida, que haja patrocínio e investimento no futebol manauara por parte das grandes empresas do PIM.
Somente com patrocínios fortes e com políticas públicas sólidas que possibilitem a reestruturação dos clubes manauaras poderemos verdadeiramente ressuscitar o nosso futebol, tornando-o competitivo novamente.
Atualmente, o futebol amazonense encontra-se na série D, representado pelo Fast Clube, e na série C, representado pelo Manaus Futebol Clube, fundado em 2013.
A meta principal do projeto da Prefeitura de Manaus – levar pelo menos uma equipe manauara de volta à série A do campeonato brasileiro – é salutar, mas é preciso mais.
É preciso que o poder público cobre contrapartidas das grandes empresas instaladas no PIM, pois, se há dinheiro público investido sob a forma de incentivos fiscais, tem que haver contrapartida social.
Eles precisam patrocinar!
*Sociólogo