Mentiras versus Realidade: que narrativa vencerá?

Supremo diz em resposta a Bolsonaro que “uma mentira contada mil vezes não vira verdade”

Mentiras versus Realidade: que narrativa vencerá?

Ednilson Maciel, por Marcelo Aith*

Publicado em: 30/07/2021 às 16:12 | Atualizado em: 30/07/2021 às 16:12

O embate entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o Supremo Tribunal Federal (STF) ganhou novos capítulos nos últimos dias.

A crise entre a corte suprema e o Planalto ganhou fôlego depois que ministros da corte se reuniram com dirigentes de partidos para reverter a tendência de aprovação do voto impresso pelo Congresso.

Uma das bandeiras defendidas por Bolsonaro é que as urnas eletrônicas utilizadas não são confiáveis e passíveis de fraude. Fato que ainda não conseguiu comprovar.

O certo é que esse tema foi o último estopim da batalha entre o Judiciário e o Executivo.

Nesse cenário, outro tema ganhou destaque em mais um round entre o presidente e o Supremo. A tensão ocorreu devido a um vídeo publicado pela Secretaria de Comunicação do STF.  

Na peça publicitária da campanha “#VerdadesdoSTF”, a corte desmente a versão reproduzida reiteradamente pelo presidente e por aliados do Planalto de que o Supremo teria proibido o Governo Federal de agir no enfrentamento à pandemia do covid-19.

Parafraseando a frase de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda do regime nazista de Adolf Hitler, o Supremo diz no texto de divulgação do vídeo em resposta a Bolsonaro que “uma mentira contada mil vezes não vira verdade”.

Importante destacar que a decisão do STF sobre a competência constitucional para o combate da pandemia, proferida no anos passado, consignou que governadores e prefeitos têm autonomia para planejar estratégias para o combate ao vírus em suas regiões, incluindo a quarentena e o fechamento do comércio, por exemplo.

Na ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 6.341, o Supremo decidiu que os governos municipais e estaduais podiam determinar o isolamento social, quarentena e fechamento do comércio.

Já na ADI 6.343, os ministros entenderam que os governadores e prefeitos poderiam restringir a locomoção interestadual e intermunicipal, caso achem necessário.

Por último, na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) 672, o ministro Alexandre de Moraes decidiu que as autoridades estaduais e municipais tinham a competência para manter medidas adotadas para combater a pandemia.

Nenhuma das decisões afastava a possibilidade de o governo federal tomar medidas para a contenção da pandemia.

Porém, o entendimento dos ministros era que a União também poderia traçar estratégias de abrangência nacional.

Ou seja, o Supremo não firmou entendimento no sentido de que todas as ações fossem tomadas pelos governadores e prefeitos, e sim que o governo federal não poderia interferir em ações locais, como o estabelecimento de quarentenas e o fechamento do comércio.

Do outro lado, Bolsonaro disse à imprensa e seguidores nas redes sociais, por diversas vezes, que não possui nenhum poder para combater a pandemia, pois esse o foi tirado pelo Supremo.

Na manhã da última quinta-feira, 29 de julho, ele subiu o tom em conversa com apoiadores no Alvorada:

“O Supremo cometeu crime ao dizer que prefeitos e governadores podem suprimir direitos”.

A afirmação foi seguida pela declaração:

“Prefeitos e governadores tinham mais poder do que eu”, disse.

E no Twitter, Bolsonaro escreveu que o Supremo “delegou poderes para que estados e municípios”.

Ou seja, uma narrativa que já vem desde de 2020.

Em uma medida cautelar que referendou a decisão do Supremo, o ministro Alexandre de Moraes declarou que não cabe ao Executivo tomar qualquer iniciativa “que vise a desautorizar medidas sanitárias adotadas pelos estados e municípios com o propósito de intensificar ou ajustar o nível de proteção sanitária”.

Apesar de não poder invadir a competência de prefeitos e governadores, a decisão não retira os poderes do governo federal “de atuar como ente central no planejamento e coordenação de ações integradas de saúde pública, em especial de segurança sanitária e epidemiológica no enfrentamento à pandemia da covid-19”, como cabe em suas atribuições.

Importante destacar que, independentemente das decisões da corte superior, o Planalto não atuou de forma ostensiva no combate à pandemia.

Atuou como um palanque eleitoral, um teatro de narrativas que pouco contribuíram para o controle da doença em nosso território.

O presidente, infelizmente, preferiu nadar contra a corrente em diversos momentos cruciais desta crise sanitária.

E o pior: ainda acumula uma série de fake news, principalmente contra a nossa corte superior, ateando ainda mais álcool nesta fogueira de inverdades e vaidades.

Foto: Reprodução/BNC

*O autor é advogado, latin legum magister (LL.M) em direito penal econômico pelo Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisa – IDP, especialista em blanqueo de capitales pela Universidade de Salamanca e professor convidado da Escola Paulista de Direito